IJCS | Volume 31, Nº3, Maio / Junho 2018

210 Introdução Desde o século 19, são conhecidas adaptações cardíacas induzidas pelo exercício físico. Henschen, em 1899, reconheceu cardiomegalia em esquiadores de longas distâncias por meio de percussão da silhueta cardíaca, concluindo que este aumento estava relacionado com dilatação das cavidades e hipertrofia das paredes do ventrículo esquerdo (VE) e que estas alterações se traduziam em benefícios físicos para os atletas. 1,2 Com a evolução dos meios complementares de diagnóstico, principalmente a ecocardiografia, Morganroth et al., 3 elaboraram, em 1975, a hipótese das alterações morfológicas cardíacas estarem dependentes da sobrecarga hemodinâmica associada ao exercício físico: exercício dinâmico associado à hipertrofia excêntrica pela sobrecarga de volume, resultando no aumento das cavidades cardíacas pela adição de sarcômeros em série; e exercício estático associado à hipertrofia concêntrica pela sobrecarga de pressão, com hipertrofia das paredes do VE e adição de sarcômeros em paralelo. 3-5 Diferentes esportes emétodos de treinamento originam padrões de remodelagem cardíaca variados. É expectável encontrar uma hipertrofia predominantemente excêntrica em um maratonista, e concêntrica em um halterofilista. 6 No entanto, grande parte dos esportes mais praticados na atualidade apresenta influência dos dois componentes do exercício (o dinâmico e o estático), sendo menos previsível a adaptação que estes atletas podem sofrer. A intensidade, duração e frequência do exercício físico são características que podem condicionar diferentes padrões de remodelagem cardíaca. Os treinamentos de alta intensidade estão associados a alterações estruturais e funcionais mais marcadas. 7,8 O objetivo deste trabalho foi verificar se existe remodelagem cardíaca adicional em atletas de nível competitivo, quando expostos a um protocolo de treinamento de alta intensidade realizado em um curso militar de tropas especiais. Métodos Estudo observacional e prospectivo, que avaliou militares no início e no final de um curso de tropas especiais. Os militares selecionados eram candidatos a completar o curso de tropas especiais, o Comando do Exército Português. Ingressaram 76 candidatos, dos quais 45 eram previamente atletas, que competiam em diferentes modalidades. Apenas 17 militares concluíram o curso com sucesso, sendo todos atletas. As avaliações decorreram entre janeiro e junho de 2016. Nestas avaliações, com 6 meses de intervalo, efetuou-se história clínica completa compreenchimento de umquestionário médico, exame físico, avaliação antropométrica e ecocardiograma transtorácico (ETT). As avaliações foram precedidas por um período de repouso de pelo menos 12 horas. Um eletrocardiograma (ECG) também foi realizado em todos os participantes, como método de rastreio cardiovascular. Todos os indivíduos assinaram o Termo de Consentimento Informado antes de participarem no estudo.Oprotocolodoestudo foi autorizadopelaComissão de Ética da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (protocolo de referência 087/2015). Características da população estudada Todos os militares que concluíram o curso eram considerados previamente atletas de nível competitivo. Faziam exercício físico de competição (> 10 horas semanais), participando emprovas regionais e nacionais. Embora esta atividade não fosse o principal meio econômico de sustentação, todos eles tinham regalias e benefícios decorrentes do seu desempenho esportivo. Os atletas mantiveram o nível de empenho físico em suas diferentesmodalidades, até a primeira avaliação realizada pelos investigadores. As modalidades praticadas podem ser observadas na Tabela 1. Durante o curso de tropas especiais, eles suspenderam o treinamento prévio, sendo que o exercício físico realizado foi unicamente o decorrente do treinamento ministrado no curso militar. Características do treinamento físico militar em um curso de tropas especiais O curso de tropas especiais era constituído por um componente de treinamento físico geral e outro de treinamento físico militar. No treinamento físico geral, os militares eram sujeitos a exercícios físicos dinâmico e estático, praticando várias modalidades, como atletismo, esportes coletivos (futebol ou basquetebol), natação e esportes de combate (boxe, por exemplo). O treinamento físico militar combinava a vertente de educação física ajustada às especificidades militares. Para isto, os militares realizavamexercícios dinâmicos (corrida de longas distâncias, corridas longas intercaladas com corrida de velocidade e marcha), estáticos (transporte de cargas e levantamento de pesos) e mistos (pistas de obstáculos, entre outras atividades). Dinis et al. Remodelagem cardíaca induzida pelo treino militar International Journal of Cardiovascular Sciences. 2018;31(3)209-217 Artigo Original

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