IJCS | Volume 31, Nº2, Março / Abril 2018

173 DOI: 10.5935/2359-4802.20180011 Resumo A cardiomiopatia crônica da doença de Chagas (CCDC) é resultante de miocardite fibrosante focal de baixa intensidade, mas incessante, causada pela infecção persistente do T cruzi , associada à inflamação mediada por mecanismos imunes adversos. Cerca de 30% dos infectados desenvolvem, ao longo da vida, a forma crônica cardíaca da doença de Chagas commanifestação clínica proteiforme, que pode incluir morte súbita, sintomas e sinais de insuficiência cardíaca, eventos cardioembólicos, arritmia e sintomas anginoides. Amorte súbita e a progressão da insuficiência cardíaca (IC) são os mecanismos mais comuns de óbito nesta condição. Os aspectos prognósticos mais relevantes são sintomas de IC avançada (CF III/IV da NYHA), cardiomegalia, disfunção sistólica do VE e taquicardia ventricular não sustentada. A prevenção dos eventos cardioembólicos é aspecto importante no manejo dos pacientes comCCDC. Agentes anticoagulantes orais devem ser indicados para pacientes com risco elevado, conforme a presença de um conjunto de fatores de risco: disfunção sistólica do VE, aneurisma apical, alteração da repolarização ventricular ao ECG e idade avançada. O tratamento da IC na CCDC segue os mesmos princípios aplicados à IC secundária à cardiomiopatia dilatada de outras etiologias. Introdução A doença de Chagas (DC) é causada pelo parasita protozoário Trypanosoma cruzi, que causa uma miocardite aguda e, posteriormente, uma miocardite crônica fibrosante, de baixa intensidade e incessante, que produz dano miocárdico progressivo e resulta tardiamente na cardiomiopatia crônica da doença de Chagas (CCDC). O acometimento cardíaco da doença, na fase crônica, envolve relevante morbidade e mortalidade, sendo a principal causa de cardiomiopatia não-isquêmica na América Latina. Epidemiologia O ciclo de transmissão da Doença de Chagas apoia‑se no vetor triatomíneo como principal transmissor. Porém, após diversas campanhas nacionais e iniciativas de âmbito multinacional, a transmissão por este meio encontra-se parcialmente controlada. Em 2006, o Brasil recebeu da Organização Mundial de Saúde (OMS) certificado de erradicação da transmissão da doença pelo mais relevante vetor domiciliado, o Triatoma infestans. 1,2 Isto, de forma alguma, representa a erradicação da doença – alvo inerentemente inalcançável – a qual continua acontecendo por meio de surtos mediados por outros mecanismos de transmissão como, por exemplo, a via oral. No período de 1975 a 1995, o programa de controle da doença do Cone Sul detectou redução de 89% das transmissões da mesma. 3 As taxas de mortalidade secundárias à DC também já foram reduzidas em 75% desde a década de 1990. 4 Todavia, a OMS ainda estima em 300.000 o número de novos casos por ano na América Latina e acredita que existam 8 milhões de pessoas infectadas em todo o mundo. A CCDC é considerada um sério problema de saúde pública nas áreas endêmicas da América Latina, representando uma das maiores causas de insuficiência cardíaca emorte súbita. Atualmente, graças à globalização International Journal of Cardiovascular Sciences. 2018;31(2)173-189 ARTIGO DE REVISÃO Correspondência: Prof. Dr. Marcus Vinicius Simões, MD, PhD Centro de Cardiologia - Departamento de Clínica Médica Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, 3900 Bandeirantes Avenue, Ribeirão Preto, SP – Brasil e-mail: msimoes@fmrp.usp.br Cardiomiopatia da Doença de Chagas Chagas Disease Cardiomyopathy MarcusVinicius Simões, MinnaMoreira Dias Romano, André Schmidt, Káryta SuelyMacedoMartins, José Antonio Marin-Neto Divisão de Cardiologia - Departamento de Clínica Médica - Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, SP – Brasil Artigo recebido em 08/09/2017; revisado em 27/10/2017; aceito em 13/11/2017 Cardiomiopatias,CardiomiopatiaChagásica,Trypanosoma Cruzi, Doença de Chagas, Insuficiência Cardíaca. Palavras-chave

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=