ABC | Volume 115, Nº1, Suplemento, Julho 2020

Relato de Caso Bloqueio do Ramo Esquerdo Idiopático e Sintomas Inexplicáveis Durante o Exercício: Um Relato de Caso Idiopathic Left-Bundle Branch Block and Unexplained Symptom At Exercise: A Case Report Guilherme Veiga Guimarães 1 e Edimar Alcides Bocchi 1 Universidade de São Paulo Instituto do Coração, 1 São Paulo, SP – Brasil Introdução A presença de bloqueio do ramo esquerdo (BRE) na aparente ausência de outra doença cardíaca suscita questões e preocupações a respeito da estratificação de risco de eventos ou sintomas cardiovasculares subsequentes. 1-5 Estima-se que a detecção de BRE em adultos assintomáticos, inclusive em atletas, varie entre 0,1% e 0,8%, o que muito provavelmente corresponde a doenças cardíacas estruturais, e não a respostas fisiológicas ao exercício. 6-8 Por outro lado, alguns estudos demonstraram que o risco de morte dos pacientes com BRE e doença cardíaca varia entre 2,4% e 11% ao ano. 9 Embora vários estudos tenham sugerido que o BRE induzido por exercício esteja geralmente associado à doença cardiovascular, sobretudo à doença arterial coronariana, há estudos contrastantes que demonstram uma relação entre o BRE induzido por exercício e artérias coronárias normais. 6,7,9 Entretanto, os efeitos cardiovasculares adversos relacionados ao exercício no BRE com função cardíaca normal em repouso ainda são pouco definidos. Este relato de caso examinou a relação entre o exercício, o BRE, sintomas e capacidade de exercício em mulher mais jovem com BRE típico, sem história de doença cardiovascular, que relatou ansiedade e falta de ar súbitas durante exercício vigoroso, o que pode ser sugestivo de doença cardíaca, tendo sido encaminhada para teste de esforço. Relato de Caso Mulher saudável de 42 anos de idade com BRE, que relatou ansiedade e falta de ar súbitas durante exercício vigoroso, encaminhada para teste cardiopulmonar do exercício (TCPE) para avaliação dos sintomas inexplicáveis. Ela não estava tomando nenhuma medicação e não tinha histórico médico relevante. Sem sintomas prévios sugestivos de doença cardíaca (desconforto no peito, palpitações, desmaios e angina). Não havia história de doença neuromuscular ou pulmonar. Ela não fumava nem consumia álcool. Não havia história familiar de doença cardíaca ou ataque cardíaco. Nos seis meses anteriores, ela vinha se exercitando três vezes por semana em uma academia. O programa de exercício consistia em sessões de pelo menos 60 minutos de atividade regular de intensidade moderada, incluindo exercícios aeróbicos, de fortalecimento e flexibilidade muscular e de fortalecimento do equilíbrio. Seu exame físico foi considerado normal, o IMC era 21,5 kg/m 2 e a pressão arterial em repouso estava em 110/70 mmHg. O eletrocardiograma (ECG) em repouso mostrou ritmo sinusal (RS) e frequência cardíaca (FC) de 70 bpm, com característica dominante de bloqueio intraventricular: complexo QRS prolongado (≥0,12s) resultante do atraso na ativação do ventrículo esquerdo, acompanhado de morfologia característica do complexo QRS.6 A angiotomografia coronariana (ATC) foi realizada, e não mostrou depósitos de cálcio e gordura nas artérias coronárias, nem artérias coronárias com estenose. O hemograma completo mostrou resultados normais: glicemia de jejum: 78 mg/dL; colesterol lipoproteína de baixa densidade (LDL): 168mg/dL; colesterol lipoproteína de alta densidade (HDL): 81 mg/dL; colesterol total (CT): 159 mg/ dL; lipoproteína (a) [Lp(a)]: 7 mg/dL; triglicérides (Tg): 49 mg/dL e creatina fosfoquinase (CPK): 26 U/L. A ressonância magnética (RM) do coração mostrou função biventricular normal, fração de ejeção do VE de 65% e dimensões preservadas, exceto por um movimento septal anormal. Foi submetida ao TCPE em uma esteira. Ao longo do TCPE, o ECG de 12 derivações mostrou ritmo sinusal (Figura 1). As aferições da pressão arterial estavam dentro da normalidade: em repouso (126/82 mmHg), pico (160/90 mmHg) e recuperação (120/90 mmHg). Ela parou o exercício por causa da fadiga (RER=1,29). Os valores de pico de consumo de oxigênio (VO 2 , pico = 27,1 ml/kg/min) e frequência cardíaca máxima (FCM = 176 bpm) obtidos no TCPE foram normais para a idade e o sexo: 95% e 102%, respectivamente (https:// www.ahajournals.org/doi/10.1161/01.CIR.91.2.580) . Do estágio 14 do protocolo de Balke modificado até o final do teste, o TCPE identificou uma redução do VO 2 e do pulso O 2 (VO 2 /FC, ml/bpm), e um aumento da FC e da relação espaço morto/volume corrente (Vd/Vt) (Figura 2). A partir deste evento, a inclinação da relação entre ventilação minuto/ produção de dióxido de carbono (VE/VCO 2 ) aumentou abruptamente e não foi acompanhada de hipóxia (Figura 2). Discussão Tanto quanto é do nosso conhecimento, relatamos pela primeira vez o caso de uma paciente mais jovem com BRE sem cardiomiopatia aparente e com sintomas inexplicáveis Correspondência: Guilherme Veiga Guimarães • Universidade de São Paulo Instituto do Coração – Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 44. CEP 05403-000, São Paulo, SP – Brasil E-mail: gvguima@usp.br Artigo recebido em 05/06/2019, revisado em 25/07/2019, aceito em 10/09/2019 Palavras-chave Bloqueio de Ramo; Exercício; Atividade Física; Consumo de Oxigênio/fisiologia; Doenças Cardiovasculares/prevenção e controle. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20190363 10

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