ABC | Volume 115, Nº1, Julho 2020

Artigo Original Macedo et al. Hipertensão resistente em afrodescendentes Arq Bras Cardiol. 2020; 115(1):31-39 também é demonstrado pela avaliação do ERF, onde 61% dos indivíduos foram categorizados como risco moderado/ alto. Esses achados são consistentes com outros estudos que demonstraram associação de HR com sexo feminino, idade avançada e obesidade 18,29 Calhoun et al., 7 relataram um ERF médio de 17,5% em pacientes comHRf e 11,7% em pacientes com HR, com risco de eventos coronarianos e acidente vascular cerebral em 10 anos de 20,8% em HRf e 16,2% em indivíduos com HR, respectivamente. 7 Também contribuindo para o aumento do RCV na população de nosso estudo, houve uma alta prevalência de função renal anormal, demonstrada por uma TFG estimada de <60ml/min em 34,2% dos indivíduos e uma alta proporção de eventos cardiovasculares prévios (IAM e AVC). Isso sugere que a presença de lesão em órgãos-alvo deve ser frequente nesses pacientes. Muntner et al., 30 comparando participantes do estudo ALLHAT com e sem HR, também observaram alto risco de doença coronariana (RR=1,44; IC95%=1,18-1,76), AVC (RR=1,57; IC95%=1,18-2,08) e doença renal em estágio terminal (RR=1,95; IC95%=1,11-3,41) naqueles com HR. 30 Em nosso estudo, à semelhança de outras publicações, 7,8 houve uma prevalência significativamente maior de AVC prévio em pacientes com HRf, que tiveram PA médias significativamente maiores e uma maior frequência de dislipidemia. A frequência de outros fatores de risco, bem como ERF e adesão terapêutica por MMAS-8 foram semelhantes nos dois subgrupos. Esses dados sugerem que a persistência da PA elevada, provavelmente mais do que os demais fatores de RCV, parece ter um papel fundamental nesse desfecho desfavorável nos portadores de HRf. A hiperatividade simpática, mecanismo proposto para a persistência da PA não controlada em pacientes com HRf, 14 poderia estar associada a uma maior incidência de AVC nesses indivíduos. A dislipidemia e sua associação íntima com a aterosclerose também podem contribuir negativamente para o prognóstico de pacientes com HRf e precisam ser melhor avaliadas em outros estudos. Apesar da alta média de idade, observou-se uma proporção significativamente menor de indivíduos com mais de 60 anos entre os pacientes com HRf, apesar da tendência de maior tempo de diagnóstico de HAS dentre estes. Achados semelhantes foram descritos em outros estudos. 14,15,27 Esses dados provavelmente estão associados aos possíveis mecanismos imbricados na fisiopatologia da HRf, atribuindo a esse grupo de indivíduos características que implicam no desenvolvimento mais precoce e maior gravidade da HAS. Em relação ao predomínio do sexo feminino, baseado no estudo ALLHAT, Cushman et al. 28 encontraram maior dificuldade no controle da HAS em mulheres negras. 28 Em um estudo populacional realizado na Suécia, Holmqvist et al., 31 também relataram que as mulheres tinham uma maior prevalência de HR, exceto quando avaliaram especificamente o subgrupo com HR controlada. 31 O presente achado de maior proporção de mulheres em nossa amostra de indivíduos com HR deve ser interpretado com cautela, pois pode ser superestimada pelos aspectos culturais brasileiros, uma vez que as mulheres tendem a buscar mais os cuidados com a saúde. 18 No entanto, esse fato pode identificar um problema que mereça maior atenção, a fim de incentivar uma melhor avaliação clínica e da terapia anti-hipertensiva utilizada nestes indivíduos. Em contraste, alguns autores relataram uma maior prevalência de HR entre os homens. 32 Em relação à terapia, observou-se um grande uso das várias classes de anti-hipertensivos disponíveis e uma grande proporção de participantes utilizou a combinação de IECA ou BRA, BCC e diurético tiazídico, conforme recomendado na literatura. 2,9 Essa combinação foi prescrita com maior frequência em pacientes com HRf, provavelmente devido à maior dificuldade em obter o controle da PA nesses pacientes. As prescrições de espironolactona como o quarto fármaco a ser introduzido na terapia anti-hipertensiva bem como a opção da clortalidona como o diurético tiazídico de escolha, devido à sua ação mais prolongada, também têm sido recomendadas na literatura. 2,3,33,34 Alguns autores até sugerem que o uso Figura 3 - Proporção de uso concomitante de clortalidona e espironolactona, de acordo com hipertensão resistente ou refratária. HR: hipertensão resistente; HRf: hipertensão refratária; P < 0,001; para diferença de frequência do uso de clortalidona entre HR versus HRf; P < 0,001; para diferença de frequência do uso de espironolactona entre HR versus HRf. 36

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