ABC | Volume 115, Nº1, Julho 2020

Artigo de Revisão Leite et al. Síndrome cardiorrenal aguda Arq Bras Cardiol. 2020; 115(1):127-133 Pelo menos um quarto dos pacientes hospitalizados com ICD pode desenvolver SCRA, dependendo do critério diagnóstico utilizado. Entre os pacientes com IC hospitalizados, um aumento na creatinina sérica é um dos mais importantes preditores de sobrevida 10,57 e a mortalidade aumenta progressivamente com o incremento da creatinina sérica. 11,27,58,59 Nem todas as alterações da função renal têm a mesma relevância prognóstica. O aumento da creatinina sérica concomitantemente com melhora dos sintomas e perda de peso não está associado a um desfecho desfavorável. 60 A IRA indica que ocorreu lesão renal, que pode ser reversível ou não, enquanto que a piora dos marcadores da função renal pode representar um declínio funcional da TFG sem relação direta com um desfecho adverso. 61 A SCRA intermitente reflete uma redução reversível na TFG e parece menos prejudicial do que a SCRA persistente. Paradoxalmente, nos casos de SCRA na admissão, a diminuição da creatinina durante a hospitalização pode estar associada a desfechos adversos. 28,53,62 Considerando a congestão renal como o principal mecanismo fisiopatológico da SCRA, espera-se um efeito benéfico dos diuréticos no prognóstico. Uma análise post hoc do ensaio clínico DOSE 63 mostrou que a melhora da função renal quando associada ao tratamento inadequado da congestão associou-se com pior prognóstico. Outros estudos mostraram que, na terapêutica com diuréticos e hemoconcentração, a piora da função renal tem menor impacto prognóstico do que em pacientes com congestão persistente e ausência de hemoconcentração. 28,64 Esse achado deve-se em parte a fatores de confundimento na avaliação da creatinina sérica. No contexto do tratamento da congestão, a elevação da creatinina sérica pode resultar de outros mecanismos independentes da redução da TFG, como a hemoconcentração que reduz a distribuição da creatinina. Essa alteração renal é inofensiva e transitória, denominada pseudo-IRA. O conceito de pseudo-IRA pode explicar porque os biomarcadores de lesão tubular foram pobres preditores de SCRA, posto que em estudos anteriores não houve a distinção entre IRA e pseudo-IRA. 62,65 Durante a terapêutica diurética agressiva, o aumento da creatinina sérica ocorreu em 22% dos pacientes com ICD sem aumento de biomarcadores, sugerindo uma proporção potencialmente alta de pseudo-IRA. 65 Não é fácil determinar se a terapêutica é eficaz e a pseudo-IRA pode induzir a descontinuação inapropriada do tratamento. É importante avaliar os parâmetros clínicos de perfusão, débito urinário, perda de peso e hemoconcentração. Além disso, os biomarcadores são promissores para orientar a terapia. 66 A mensuração do débito cardíaco e de outros parâmetros hemodinâmicos pode ajudar a garantir uma terapia diurética adequada e direcionada 67 e permitir um melhor entendimento do quadro de SCRA. Conclusões As diferentes referências de creatinina sérica basal limitam a capacidade de fazer comparações precisas entre estudos e alteram as estimativas de diagnóstico da SCRA, superestimando ou subestimando. Os autores deste artigo sugerem que os critérios de SCRA devem ser revisados para que se inclua o diagnóstico de SCRA na admissão hospitalar. A creatinina de referência deve refletir a função renal basal antes do início da IRA. Contribuição dos autores Concepção e desenho da pesquisa: Leite AM, Gomes BFO, Albuquerque DC, Spineti PPM, Martins WA; Obtenção de dados e Redação do manuscrito: Leite AM; Análise e interpretação dos dados: Leite AM, Gomes BFO, Marques AC, Petriz JLF, Albuquerque DC, Spineti PPM, Villacorta H, Martins WA; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Leite AM, Gomes BFO, Marques AC, Petriz JLF, Albuquerque DC, Spineti PPM, Jorge AJL, Villacorta H, Martins WA. Potencial conflito de interesses Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. Fontes de financiamento Opresente estudo não teve fontes de financiamento externas. Vinculação acadêmica Este artigo é parte de dissertação de Mestrado de Andréa de Melo Leite pela Universidade Federal Fluminense. 1. Rohde LEP, Montera, MW, Bocchi EA, Clausell NO, Albuquerque DC, Rassi S, Colafranceschi AS, et al. Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. Arq Bras Cardiol. 2018;111(3):436-539. 2. Yancy CW, Jessup M, Bozkurt B, Butler J, Casey DE Jr, Drazner MH, et al. 2013 ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: a report of the American College of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2013;62(16):e147-239. 3. Albuquerque DC, Neto JDS, Bacal F, Rohde LEP, Bernardez-Pereira S, Berwanger O, et al. I Brazilian registry of heart failure - clinical aspects, care quality and hospitalization outcomes. Arq Bras Cardiol. 2015;104(6):433-42. 4. Ledoux P. Cardiorenal syndrome. Avenir Med. 1951;48(8):149-53. 5. Ronco C, McCullough P, Anker SD, Anand I, Aspromonte N, Bagshaw SM, et al. Cardio-renal Syndromes: report from the consensus conference of the Acute Dialysis Quality Initiative. Eur Heart J. 2010;31(6):703-11. 6. Verdiani V, Lastrucci V, Nozzoli C. Worsening renal function in patients hospitalized with acute heart failure: risk factors and prognostic significances. Intern J Nephrol. 2010 Oct 11;2011:785974. 7. Mullens, W, Abrahams Z, Skouri HN, Francis GS, Taylor DO, Starling RC, et al. Elevated intra-abdominal pressure in acute decompensated heart failure a potential contributor to worsening renal function? J Am Coll Cardiol. 2008;51(3):300-6. Referências 131

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