ABC | Volume 115, Nº1, Julho 2020

Artigo de Revisão Costa et al. Imagem Cardiovascular e Procedimentos Intervencionistas Arq Bras Cardiol. 2020; 115(1):111-126 protetora para o transdutor, se possível. Em pacientes com COVID-19 suspeita ou confirmada e sob ventilação mecânica não invasiva ou invasiva, a precaução aérea também deve ser adotada para a execução do ETT. 16 Em pacientes internados, a preferência é fazer os ecocardiogramas necessários à beira do leito, com as medidas de proteção adequadas e com o menor número possível de indivíduos no aposento. Devem ser feitas a limpeza e a desinfecção apropriadas das máquinas e transdutores logo após o uso, de acordo com as especificações de cada fabricante. Integrantes do laboratório de ecocardiografia acima de 60 anos de idade, portadores de doenças crônicas, imunodeprimidos e gestantes devem idealmente ser afastados. 5,17 3.2. Indicações de Ecocardiografia em Pacientes de Baixo Risco para Covid-19 Durante a pandemia, as solicitações de ecocardiografia em indivíduos com baixo risco de COVID-19 devem ser baseadas nas indicações de uso apropriado e devem ser realizadas somente se a informação gerada pelo exame for essencial para o manejo do caso. 5 Todos os exames considerados eletivos devem ser adiados para quando as operações voltarem ao normal, incluindo ETT, ETE, ecocardiograma sob estresse (ESE) e ecocardiograma fetal (EF). A urgência da realização de um ecocardiograma em paciente ambulatorial deve ser avaliada caso a caso, mas sugere-se ser urgente aquele exame cujo resultado possa prevenir um evento adverso ou uma internação hospitalar em espaço de tempo de 2 a 4 semanas. 17 Como sugestões de recomendação de ecocardiografia nesses cenários, incluem- se: suspeita de nova cardiomiopatia francamente sintomática [classe funcional III/IV da New York Heart Association (NYHA)]; piora de insuficiência cardíaca preexistente com sintomas graves (síncope, dor torácica, classe funcional III/ IV da NYHA); terapia do câncer em uso de medicação cardiotóxica com suspeita de insuficiência cardíaca ou queda prévia da fração de ejeção; suspeita de estenose aórtica grave sintomática; alta probabilidade pré-teste de endocardite infecciosa em portador de prótese valvar com sintomas agudos. 17 A ecocardiografia de rotina para seguimento de pacientes com sintomas não graves ou daqueles não elegíveis para terapia clínica, cirúrgica ou invasiva urgente deve ser adiada ou cancelada. Em pacientes internados, as indicações de ecocardiograma de urgência em geral são as mesmas que antes da pandemia. 3.3. Indicações de Ecocardiografia em Pacientes com Covid-19 Suspeita ou Confirmada A ecocardiografia permanece um método crucial de imagem durante o surto de coronavírus e a consideração de “em quem”, “como” e “onde” empregá-la é fundamental para diminuir os riscos de contaminação e, ao mesmo tempo, garantir cuidado médico de alta qualidade. Alguns autores advogam a realização do ETT em todos os pacientes com COVID-19 complicada (alterações eletrocardiográficas, aumento de troponinas, sintomas moderados a graves requerendo internação), 12,18 especialmente se houver doença cardiovascular prévia. Embora não existam indicações formais fundamentadas em evidências científicas sólidas, enfatiza-se a importância de avaliar a função cardíaca frente à potencial coincidência de doença cardiovascular prévia e aguda nos pacientes com COVID-19 grave. Zhou et al., 9 relataram que insuficiência cardíaca esteve presente em 23% dos pacientes com COVID-19 e se associou commaior mortalidade (51,9% versus 11,7%). 9 Não está claro se a taxa de insuficiência cardíaca se deveu a exacerbação de disfunção ventricular prévia, nova cardiomiopatia ou ambas. É plausível que pacientes com disfunção ventricular prévia possam desenvolver profunda descompensação da insuficiência cardíaca no contexto da COVID-19 grave, acompanhada de hipotensão e/ou choque cardiogênico. Aventam-se várias possibilidades para a lesão miocárdica aguda, como ação viral direta (miocardite), injúria hipóxica, efeito tóxico pela “tempestade” de citocinas, vasoespasmo, trombose, stunning miocárdico por cardiomiopatia de estresse ou instabilidade hemodinâmica. 19-21 Muito se tem discutido no meio científico a possibilidade de o SARS-CoV-2 causar miocardite. Em uma análise retrospectiva de 68 mortes ocorridas em uma série de 150 pacientes com COVID-19, 53% foram atribuídas à insuficiência respiratória, 7% à miocardite com choque circulatório, 33% à combinação de ambas as anteriores, restando 5% de causa desconhecida. 15 Os autores empregaram dados clínicos para diagnosticar miocardite fulminante, sem comprovação por biópsia. Da mesma forma, relatos de miocardite fulminante foram publicados em pacientes com ou sem febre que tiveram dor torácica, elevação do segmento ST sem obstrução coronariana e disfunção ventricular grave, respondendo à terapia salvadora com corticoide e imunoglobulinas. 22,23 Embora nesses dois relatos a RMC tenha demonstrado achados compatíveis commiocardite, não houve constatação histológica comprobatória. 22,23 No diagnóstico diferencial commiocardite e cardiomiopatia de estresse, é obviamente necessária a inclusão das síndromes coronarianas agudas, que também têm sido descritas em pacientes com COVID-19. 24,25 Acredita-se que a intensa resposta inflamatória e as alterações hemodinâmicas associadas com a doença grave possam conferir maior risco de ruptura de placas ateroscleróticas e/ou fenômenos tromboembólicos em pacientes suscetíveis. 14 Pelo acima exposto, mesmo em pacientes sem febre ou tosse, que cursam com manifestação clínica tipicamente cardíaca, a COVID-19 deve entrar no diagnóstico diferencial durante a pandemia e a ecocardiografia pode auxiliar no julgamento clínico. Arritmias cardíacas são manifestações comuns em pacientes com COVID-19 hospitalizados, sendo descritas em 16,7% dos casos em coorte chinesa com 138 pacientes. 7 A ecocardiografia pode ser útil em alguns casos, especialmente para arritmias ventriculares malignas, ao diagnosticar disfunção ventricular esquerda ou cardiopatia estrutural preexistente. No contexto da pneumopatia grave e SDRA, torna-se importante avaliar hipertensão pulmonar e disfunção do ventrículo direito associada. Derrame pericárdico tem sido relatado como achado de exame em associação com miocardite (miopericardite), em geral sem repercussão hemodinâmica significativa. 22,23 113

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