ABC | Volume 115, Nº1, Julho 2020

Editorial COVID-19: Um Novo Desafio para a Cardiopatia na Gravidez COVID-19: A New Challenge in Pregnancy and Heart Disease Walkiria Samuel Avila 1 e Regina Coeli de Carvalho 2 Universidade de São Paulo Instituto do Coração, 1 São Paulo, SP - Brasil Hospital Geral de Fortaleza, Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (SESA), 2 Fortaleza, CE - Brasil Correspondência: Walkiria Samuel Avila • Rua Martiniano de Carvalho 864, cj 1107-1108 Bela vista - São Paulo CEP01321-000 E-mail: val_walkiria@incor.usp.br Artigo recebido em 22/05/2020, revisado em 27/05/2020, aceito em 27/05/2020 Palavras-chave Coronavírus; COVID-19; Pandemia; Gravidez; Gravidez de Alto Risco; Síndrome Respiratória Aguda Grave; Pneumonia; Hipertensão/prevenção e controle; Fatores de Risco; Morbidade; Mortalidade. O novo coronavírus (SARS-CoV-2, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus -2) é o agente etiológico da COVID-19 (doença do novo coronavírus 2019), cujo surto foi declarado pandemia pela Organização Mundial da Saúde em 11 de março de 2020. 1 Apesar de terem sido obtidos o isolamento, o sequenciamento genético e a análise estrutural do SARS-CoV-2, ainda não existem terapias especificas para COVID-19. Os primeiros dados epidemiológicos indicam pior evolução e maior mortalidade para os pacientes com COVID-19 portadores de doenças crônicas, como cardiopatia e hipertensão arterial. OMinistério da Saúde do Brasil expandiu esse grupo de alto risco para grávidas, puérperas e mulheres após aborto. 2 Evidências epidemiológicas anteriores sugerem fortemente que as mulheres grávidas têm um risco aumentado de doenças graves e morte por infecções virais durante pandemias, como a gripe. 3 Alterações fisiológicas no período gestacional não aumentam apenas suscetibilidade a infecção viral, mas também a gravidade dessa doença ( 1) . 4-6 Durante a gravidez, a resposta imune predomina através das células T-helper 2 (Th2), que protegem o feto, mas tornam a mãe mais vulnerável a infecções virais, que são combatidas de forma mais eficaz pelas células Th1. 7 Grávidas infectadas com o vírus influenza, subtipo H1N1, e com dois outros coronavírus patogênicos, SARS-CoV (do inglês, severe acute respiratory syndrome coronavirus ) e MERS- CoV (do inglês, Middle East respiratory syndrome coronavirus), apresentaram alta morbimortalidade durante a gravidez e após o parto. Estimou-se que 90% das grávidas com essas infecções virais evoluíram para insuficiência respiratória grave com complicações obstétricas, como aborto, parto prematuro e crescimento intrauterino restrito. Em grávidas infectadas com SARS-CoV ou MERS-CoV, foi relatada mortalidade materna de até 25%, mas não houve relato de transmissão vertical transplacentária. 8 Não há dados de que a gravidez aumente a suscetibilidade à COVID-19. Apesar de escassa evidência, parece que a COVID-19 durante a gravidez é menos grave do que as infecções pelo vírus influenza subtipo H1N1, SARS-CoV e MERS-CoV. Estudos em grávidas infectadas com o SARS-CoV-2 são limitados a pequenas séries . Uma revisão sistemática 9 de 108 grávidas com COVID-19 identificou tosse e febre como as principais queixas, presentes em quase 80% das mulheres, enquanto dispneia foi informada por apenas 12%. Não há relato de morte materna. Das três pacientes graves que precisaram de ventilação mecânica, duas apresentavam obesidade (índice de massa corporal > 35) como fator de morbidade. Outro estudo 10 avaliando 116 grávidas com pneumonia por COVID-19 concluiu que as características clínicas da pneumonia das grávidas eram semelhantes àquelas da população geral. Atualmente não há evidência de que grávidas com COVID-19 estejam mais propensas a desenvolver pneumonia grave em comparação a não grávidas. Felizmente, não houve aumento de aborto espontâneo nem de parto prematuro natural, nem ainda evidência de transmissão vertical de SARS-CoV-2. Transmissão perinatal de COVID-19: Devemos nos preocupar? Dos 75 recém-nascidos de mães com COVID-19, apenas um foi positivo para o vírus e apresentou evolução clínica satisfatória com leve alteração nas enzimas hepáticas. 9 Entretanto, alguns bebês que testaram negativo para COVID-19 apresentaram linfocitopenia e achados radiológicos de pneumonia, e um apresentou coagulação intravascular disseminada. Todos os bebês se recuperaram totalmente. 11,12 Em vista disso, não se pode excluir a possibilidade de uma resposta subclínica de fetos e recém-nascidos à infecção materna, nem transmissão vertical transplacentária. Portanto, recomenda-se o monitoramento cuidadoso de recém- nascidos de mães com COVID-19. As grávidas com cardiopatia ou hipertensão arterial e infecção pelo SARS-CoV-2 devem ser consideradas de maior risco para mortalidade? O documento da Sociedade Brasileira de Cardiologia para conduta em doenças cardíacas na gravidez, 13 que inclui protocolos de cuidados, estratégias de tratamento e prevenção de complicações cardíacas durante a gravidez, contribuiu para a redução da mortalidade materna no Brasil. No entanto, enfrentamos a emergência da COVID-19, uma doença que compromete essas conquistas. A continuidade das pesquisas clinicas e novas abordagens DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20200511 1

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