ABC | Volume 115, Nº1, Julho 2020

97 Artigo Original Taniguchi et al. Programa boas práticas em cardiologia (BPC) Arq Bras Cardiol. 2020; 115(1):92-99 qualidade de vida e na percepção em saúde, observados ao longo do tempo nas instituições participantes, serão ajustados pelo MLGM mutivariado quanto às variáveis demográficas, clínicas e socioeconômicas, gravidade da doença, fatores de risco, percepção da saúde (NRS), nível de alfabetismo em saúde, e grau de adesão geral e específica da instituição às recomendações clínicas. As variáveis serão incluídas no modelo quando estiverem associadas na análise univariada e bivariada (p < 0,10) e de acordo com a relevância clínica. Serão calculados odds ratio e riscos relativos, conforme apropriado, com respectivo IC95%. Todas as análises serão bicaudais e realizadas de maneira independente em cada braço do protocolo, adotando-se um nível de significância de 0.05. Discussão Por que este projeto é necessário? No Brasil, um país vasto e com um sistema universal de saúde complexo, 1 a qualidade do cuidado cardiovascular tem sido o tema de avaliação e preocupação. O acesso dos pacientes aos vários níveis de saúde varia por todo o país e a qualidade do cuidado oferecido é bastante heterogêneo. 1,2 Assim como em outras partes do mundo e apesar de esforços da sociedade médica em publicar diretrizes clínicas, a mortalidade relacionada às DCVs ainda é alta, refletindo a dificuldade dos pacientes em terem acesso a terapias e cuidados recomendados em tempo apropriado. 31,32 Registros realizados pela SBC em várias regiões do Brasil mostraram uma alta variação na qualidade do cuidado a condições cardiovasculares de alto encargo econômico, 32,33 tais como doença arterial coronariana (DAC), 3,34 IC, 4 acidente vascular cerebral, e FA. 35 Esses registros mostraram que a adesão a terapias baseadas em evidência ainda é insuficiente e, pelo menos para IC, a ausência de terapias adequadas é mais crítica em instituições públicas não acadêmicas das regiões mais pobres do Brasil. 4 Também se observou que a morbidade e a mortalidade relacionadas à IC são muito maiores que àquelas em países desenvolvidos, mesmo após ajuste por região, número de leitos hospitalares e tipo de instituição. Os registros brasileiros deram uma grande contribuição ao demonstrar como tem sido a abordagem dessas condições altamente prevalentes em todo o país. No entanto, não têm abordado a lacuna existente na implementação dessas intervenções que têm dificultado a ocorrência de melhorias na qualidade do cuidado. Ainda, esses registros não controlaram situações em que terapias específicas não são recomendadas ou são contraindicadas. 3,4,34,35 Os dois ensaios randomizados realizados no Brasil (BRIDGE-ACS e IMPACT-AF) para testar intervenções multifacetadas para melhorar a adesão às recomendações de diretrizes mostraram que a implementação de intervenções de MQ é viável e pode ser eficaz. 6,7 Contudo, esses estudos não levaram em consideração barreiras relacionadas ao contexto local, não testaram se os resultados observados sobre adesão às recomendações são mantidos ao longo do tempo, ou o efeito das intervenções na qualidade de vida dos pacientes. 6,7 O estudo BRIDGE-ACS, por exemplo, que foi realizado principalmente em instituições acadêmicas, 36 atingiu no máximo 68% de adesão a terapias agudas e somente 51% se fossem consideradas todas as terapias agudas e na alta, sem impacto na mortalidade em 30 dias. 6 O programa GWTG mostra que os hospitais que atingem 85% de adesão a terapias baseadas em evidência alcançaram melhores resultados em desfechos clínicos. 37,38 Esses achados fornecem um argumento convincente para a implementação da iniciativa de MQ em hospitais brasileiros que considera a complexidade da realidade local e que já foi testada e cuja eficácia demonstrada previamente. O programa GWTG, implementado em cerca de 50% dos hospitais nos EUA, mostrou um efeito duradouro sobre a mortalidade, tempo de internação e custos. 39 Existe, então, um potencial de diminuição do encargo econômico imposto pela SCA, IC, e FA sobre o sistema de saúde brasileiro. Em que se difere o programa brasileiro? O programa GTWG funciona nos EUA há mais de 15 anos. Apesar disso, somente recentemente, em 2016, um outro país (a China) beneficiou-se de um programa similar para SCA. 36 No Brasil, estamos iniciando o programa em três dimensões – SCA, FA e IC. Um programa de qualidade de abrangência nacional, com foco em diferentes condições, que inclua ambulatórios ainda não foi testado no programa GWTG. 8,22 Ainda, a ideia de desfechos relatados pelo próprio paciente, incluindo a qualidade de vida, foi contemplada pelo programa BPC e pode ajudar ministérios e sociedades de cardiologia em direcionar políticas de saúde às necessidades locais. A identificação de barreiras e facilitadores em cada hospital é considerada uma das etapas chaves no sucesso de estratégias de implementação clínica. Neste projeto, estamos utilizando, como modelo conceitual, uma estrutura didática proposta por Michie, Stralen e West, 24 que integra uma ampla gama de mecanismos dinâmicos e interativos para promover mudanças comportamentais resultantes da interação entre o indivíduo (capacidade e motivação) e o meio ambiente (oportunidades). 24 Esse modelo também auxiliará o centro coordenador em identificar e agir sobre necessidades institucionais específicas durante o projeto. Dessa maneira, em algumas instituições, o foco da intervenção será melhorar a capacidade, enquanto em outras será aumentar a motivação, ou ainda, aumentar ou restringir o fornecimento de oportunidades, individualmente ou em conjunto, dependendo dos objetivos de cada instituição. Intervenções como o programa de premiações que foi considerado uma das chaves para o sucesso no programa GWTG será enfatizado em todas as instituições participantes. 40 Aprendizados da experiência escola aberta do IHI, que incluiu a formatação da intervenção de auditoria e feedback por meio de gráficos de execução, também serão usados neste projeto. 41 Essas abordagens consideram dados institucionais longitudinais de métricas de qualidade, não só em relação aos padrões médios de referência de outras instituições, como também aos objetivos estabelecidos para aquela instituição pela linha mediana de escores para todo o período de observação. 27,41 Essa curva de feedback permite que a instituição se avalie continuamente e redefina processos em ciclos

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