ABC | Volume 114, Nº6, Junho 2020

Artigo de Revisão Figueiredo Neto et al. Coronavírus e o Miocárdio Arq Bras Cardiol. 2020; 114(6):1051-1057 pode justificar, em parte, os sintomas pulmonares frequentes na síndrome 5 (Figura 1). 6 A ECA-2 também é altamente expressa no coração, neutralizando os efeitos da angiotensina II em estados com ativação excessiva do sistema renina-angiotensina, como hipertensão arterial sistêmica (HAS), insuficiência cardíaca (IC) e aterosclerose, por converter angiotensina II em angiotensina I-VII, que tem efeito cardioprotetor. Além do coração e do pulmão, a ECA-2 é expressa no epitélio intestinal, endotélio vascular e rins, fornecendo um mecanismo para a disfunção de múltiplos órgãos que pode ser observada na infecção por SARS-CoV-2. COVID-19 e Lesão Miocárdica A presença de troponina elevada na admissão hospitalar esteve associada com maior mortalidade em dois estudos envolvendo pacientes internados com COVID-19. 7-8 Um destes estudos, desenvolvido em um hospital da Universidade deWuhan, avaliou uma coorte de 416 pacientes hospitalizados por COVID-19 em que a média de idade foi 64 anos, 50% do sexo feminino e a DCV mais frequente foi HAS (30,5%). Dentre os pacientes incluídos, 82 (19,7%) tiveram injúria miocárdica, definida através da troponina I de alta sensibilidade acima do percentil 99. Pacientes hipertensos tiveram mais injúria miocárdica que aqueles sem hipertensão (59% x 23%); assim como pacientes com doença arterial coronária (DAC) (29,3% x 6,0%); doença cerebrovascular (15,9% x 2,7%) e IC (14,6% x 1,5%) (p < 0,001 para todas as variáveis). Os autores observaram maior frequência de síndrome da angústia respiratória aguda (58,5% x 14,7%, p < 0,001) assim como maior mortalidade entre os pacientes com injúria miocárdica (51% x 4,5%, p < 0,001). 7 O outro estudo trata-se de uma coorte retrospectiva unicêntrica que avaliou 187 pacientes com COVID-19. A média de idade foi de 58 anos; 35% apresentavam alguma DCV (HAS, DAC ou cardiomiopatia) e 43 pacientes evoluíram a óbito (23%). Os autores observaram troponina T elevada em 27,8% dos casos. A taxa de mortalidade foi em torno de 7% para pacientes sem DCV e troponina T negativa, porém este valor foi 10 vezes maior quando a presença de DCV associou-se à presença de injúria cardíaca. 7 Vale destacar que os pacientes com DCV que apresentavam troponina T negativa durante a infecção não tiveram mortalidade tão expressiva (13,3%) quanto aqueles que apresentaram elevação de troponina. 8 Pacientes com troponina elevada erammais idosos; tinham mais comorbidades e níveis mais elevados de leucócitos, NT-pró-BNP, proteína C-reativa e procalcitonina, mas com contagem mais baixa de linfócitos. Um estudo demonstrou que, no quarto dia após o início dos sintomas, os níveis médios de troponina foram de 8,8 pg/ mL em não sobreviventes vs. 2,5 pg/mL em sobreviventes. Durante o acompanhamento, a mediana de troponina entre os sobreviventes não mudou significativamente (2,5 – 4,4 pg/ mL), enquanto subiu para 24,7 pg/mL no sétimo dia, 55,7 pg/ mL no décimo terceiro dia, 134,5 pg/mL no décimo nono dia e 290,6 pg/mL no vigésimo segundo dia entre os não Figura 1 – O SARS-CoV-2 liga-se por meio da proteína spike da superfície viral ao receptor da ECA-2 humana após a ativação da proteína spike pela TMPRSS2. SARS- CoV: coronavírus da síndrome respiratória aguda grave; SARS-COV-2: coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2; COVID-19: doença do coronavírus 2019; ECA-2: enzima conversora de angiotensina-2; TMPRSS2: serina protease transmembrana-2. Fonte: Costa IBSS, Brittar CS, Rizk SI, et al., 2020. 1052

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