ABC | Volume 114, Nº6, Junho 2020

Artigo Especial Barros e Silva et al. Registro Brasileiro de Síndromes Coronárias Aguda Arq Bras Cardiol. 2020; 114(6):995-1003 A taxa de eventos nos usuários do SUS foi de 16,6 por 100 pacientes-ano, ao passo que, na rede privada/convênio, foi de 9,10 por 100 pacientes-ano (p<0,01). Na análise por região, a taxa de óbito em 1 ano foi significativamente maior na região norte (19,8%; IC95% 12,6-27,0), seguida pelas regiões sudeste (8,0%; IC 95% 7,0-9,1), sul (6,8%; IC 95% 4,8-8,7) e nordeste (5,6%; IC 95% 3,7-7,5). A região centro-oeste teve menor representação de pacientes com taxa de mortalidade intermediária entre o norte e o restante do país (14,2%; IC95% 2,8-25,5). Na comparação dos preditores de eventos entre a região norte e as 3 regiões com taxa de eventos menores (sul, sudeste e nordeste), houve maior frequência de IAM cSST (51,0% x 35,3%; p <0,01), atendimento pelo SUS (100% x 51,8%; p < 0,01) e terapia incompleta nos pacientes incluídos na região norte do país (47,9% x 37,2%; p < 0,01). Discussão Neste, que é o maior registro prospectivo brasileiro de pacientes com SCA, observou-se que mais de dois terços dos eventos são classificados como infarto agudo do miocárdio na admissão. O perfil dos pacientes indica predomínio do sexo masculino (70%), quase um terço de diabéticos e a hipertensão arterial sistêmica como o fator de risco mais comum (74,6%). Quase 40% dos pacientes não recebeu pelo menos uma das terapias baseadas em evidência na internação e a conformidade às recomendações variou de acordo com a região, com o tipo de SCA e com a estratégia de revascularização. O risco de eventos cardiovasculares maiores em 1 ano foi de 13,6 por 100 pessoas ano e dos sete fatores associados a estes eventos, dois são relacionados a aspectos do atendimento: financiamento (público x privado) e qualidade da terapia (completa ou não). A publicação com resultados parciais do ACCEPT feita em 2013 10 tinha incluído 2.584 pacientes e analisado 2.485, após exclusão de casos não confirmados de SCA. Na presente análise, foram acrescidos 2.463 pacientes, o que totalizou 5.047 arrolados ao final do estudo (4.782 casos de SCA confirmados). Além do tamanho amostral, uma outra diferença marcante é o tempo de seguimento, pois, assim como a publicação de dados intermediários do ACCEPT, 10 a maioria das publicações de registros nacionais em SCA reportaram dados apenas de desfechos intra- hospitalares ou de seguimento de 30 dias. 12,13 O estudo ERICO, publicado em 2015, reportou o seguimento de 1 ano dos pacientes internados por SCA em um hospital público de São Paulo/SP. 14 Dessa forma, a presente análise incluiu, de forma inédita, dados do seguimento de 12 meses de uma grande população contemporânea de pacientes com SCA de diversas regiões do Brasil, incluindo a análise da conformidade da prescrição médica às recomendações de terapias baseadas em evidência em 12 meses. A adesão inicial da prescrição médica identificada no ACCEPT foi semelhante ao que foi encontrado em registros de países em desenvolvimento, 15 embora tenha se apresentado abaixo do encontrado em centros que participam de programa de qualidade nos mesmos países. 9 No seguimento de 1 ano, houve queda na prescrição de todas as terapias, especialmente inibidores de P2Y12, cuja utilização estava bem abaixo daquela identificada em registros internacionais de países desenvolvidos. 16,17 No seguimento de 12 meses, identificou-se também um risco residual de 13,6 por 100 pacientes-ano para eventos cardiovasculares maiores (reinfarto, morte, AVE). A relação destes eventos com a realização de revascularização pareceu mais clara nos casos de IAM, pois na angina instável a análise combinada dos desfechos CV não mostrou menor taxa nos pacientes submetidos a revascularização. Por ser uma análise observacional (não randomizada), tal evidência não permite estabelecer relação de causa-efeito, mas reforça a validade externa do conceito gerado por ensaios clínicos sobre o benefício de revascularização em pacientes com SCA, especialmente aqueles de maior risco. 18,19 Uma forma deminimizar o viés de uma análise observacional é incluir as diversas variáveis coletadas em um modelo que permita identificar a relação individual de forma independente. Dentre os fatores identificados em análise multivariada, dois foram relacionados ao atendimento: público x privado e qualidade da terapia (completa ou não). A qualidade da terapia se baseou nas recomendações baseadas em evidência para essa população. 6,7 A relação de desfecho com qualidade da terapia já foi demonstrada em diversas publicações prévias 8,15 e apresenta importância adicional para a validade externa Tabela 3 – Relação entre procedimento de revascularização e desfecho clínico nos 3 tipos de síndrome coronária aguda Eventos nos pacientes revascularizados em relação aos não- revascularizados Angina Instável HR [95% IC] IAM sem supra de ST HR [95% IC] IAM com supra de ST HR [95% IC] Sangramento Grave 2,03 [0,75 ; 5,44] 1,15 [0,55 ; 2,41] 1,28 [0,37 ; 4,50] Parada Cardiorrespiratória 0,27 [0,09 ; 0,79] 0,54 [0,34 ; 0,87] 0,54 [0,36 ; 0,83] Reinfarto do miocárdio 1,69 [1,03 ; 2,76] 1,28 [0,85 ; 1,90] 0,87 [0,53 ; 1,43] Acidente vascular encefálico (AVE) 1,18 [0,26 ; 5,28] 0,80 [0,30 ; 2,13] 1,02 [0,34 ; 3,11] Óbito 0,33 [0,17 ; 0,65] 0,53 [0,37 ; 0,76] 0,45 [0,33 ; 0,63] Óbito Cardiovascular 0,45 [0,20 ; 1,06] 0,43 [0,28 ; 0,66] 0,43 [0,31 ; 0,62] Desfecho Combinado 0,97 [0,66 ; 1,42] 0,75 [0,57 ; 0,98] 0,64 [0,48 ; 0,85] Desfecho Combinado: Óbito, Reinfarto do miocárdio e AVE. HR: Hazard Ratio 1001

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