ABC | Volume 114, Nº5, Maio 2020

Ponto de Vista Ferrari COVID-19 e Doença Cardiovascular Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):823-826 jovem na região de Lombardia foi internado com pneumonia atípica que mais tarde provou ser COVID-19. Durante as 24 horas seguintes, houve mais 36 casos, nenhum dos quais havia tido contato com o primeiro paciente ou com outros casos confirmados de COVID-19. 13 Infelizmente, apesar de medidas agressivas de contenção, a doença continua a se espalhar e o número de pacientes afetados está aumentando. A taxa de letalidade não está baixa, e predomina em pacientes idosos. 12 Portanto, atenção especial deve ser dada a essa população. Até 23 de abril o mundo já havia registrado 2.707.356 casos de COVID-19, incluindo 83.880 casos na China. Dos 190.743 óbitos da doença até esta data, 4.636 ocorreram na China. Já a Europa tinha registrado 1.193.276 casos, com 114.259 óbitos, 7 tornando-se a região com o maior aumento de novas infecções a cada 24 horas. Várias regiões também registraram seus primeiros casos, incluindo Somália, Benin, Libéria e Bahamas. 14 Existem incertezas sobre as estimativas do número real de pessoas infectadas, que seria crucial para determinar a severidade da infecção e a incidência de casos leves ou assintomáticos, bem como a sua possível transmissão. 15 Crianças Fatores epidemiológicos do COVID-19 entre crianças são escassos. Por meio de análise retrospectiva de crianças com uma idade média de 7 anos incluídas no Centro Chinês para Controle e Prevenção de Doenças entre 16 janeiro e 8 fevereiro 2020, Dong et al. 16 observaram que houve 731 casos confirmados no laboratório e 1.412 casos suspeitos. Significativamente, mais de 90% destas crianças eram assintomáticas ou apresentaram apenas sintomas leves ou moderados. Esses dados chamam atenção para o fato de que não somente adultos e idosos mas também crianças de qualquer idade são suscetíveis ao COVID-19. Por este motivo, atenção e cuidados devem ser direcionados para a população inteira, sem distinção. COVID-19 e o Sistema Cardiovascular Infecções respiratórias e influenza podem desempenhar um papel importante no aumento a curto prazo do risco de infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral isquêmico. 17 SARS-CoV-2 possui uma patogenicidade que pode aumentar danos no miocárdio causado por esta infecção viral. Os dados sugerem que lesão cardíaca aguda, choque e arritmia estavam presentes em 7,2%, 8,7% e 16,7% dos pacientes, respectivamente, e a sua prevalência era mais alta entre pacientes que necessitaram cuidados intensivos. 10 Baseado no fato de que o vírus pode causar danos ao sistema cardiovascular, atenção cuidadosa deve ser dada à proteção cardiovascular durante o tratamento para COVID-19. 18 De fato, doenças cardiovasculares e hipertensão foram associadas a uma taxa de letalidade aumentada de COVID-19 na China. 19 Lesão do miocárdio associada a SARS-CoV-2 foi relatada em 5 dos primeiros 41 pacientes diagnosticados com COVID-19 em Wuhan, os quais apresentaram níveis de troponina cardíaca I de alta sensibilidade > 28 pg/ml. 20 Em outro estudo, realizado em 2019, Panhwar et al. 21 observaram que infecção concomitante à influenza aumentou os riscos de pacientes internados com insuficiência cardíaca. Em uma pesquisa de 25 pacientes que haviam recuperado de infecção por SARS-CoV-1, quase a metade apresentou alterações no sistema cardiovascular, e 60% apresentou distúrbios no metabolismo da glicose. 22 Outro estudo incluiu 1.099 pacientes com COVID-19 confirmado, dos quais 173 apresentaram doença severa, com comorbidades de hipertensão (23,7%), diabetes mellitus (16,2%), doenças coronárias (5,8%) e doença cerebrovascular (2,3%). 23 Em uma avaliação de dados de 138 pacientes internados por COVID-19 na China, o tempo mediano entre o primeiro sintoma e a dispneia foi de 5 dias, e de 7 dias entre o primeiro sintoma e a internação hospitalar. A tomografia computadorizada do tórax mostrou sombras fragmentadas bilaterais ou opacidade de vidro fosco nos pulmões de todos os pacientes. Aproximadamente 90% dos pacientes receberam terapia antiviral com oseltamivir, e mais de 60% receberam terapia antibacteriana com moxifloxacina. Trinta e seis paciente foram transferidos para a unidade de terapia intensiva devido a complicações, incluindo síndrome do desconforto respiratório agudo (61,1%), arritmia (44,4%) e choque (30,6%). Os pacientes que necessitaram cuidados intensivos tinham idade mais avançada e maior probabilidade de apresentar comorbidades subjacentes, em adição à dispneia. Em 3 fevereiro, 34% haviam recebido alta hospitalar e 6 morreram, representando uma mortalidade geral de 4,3%. 10 Em pacientes com COVID-19, a incidência de sintomas cardiovasculares é alta, devido à resposta inflamatória sistêmica e distúrbios do sistema imunológico durante a progressão da doença. Por este motivo, pacientes com doenças cardiovasculares subjacentes que são infectados por COVID-19 podem apresentar prognóstico pior. Atenção especial deve, portanto, ser dada à proteção cardiovascular durante o tratamento de COVID-19. Receptores da Enzima conversora da Angiotensina e Bloqueadores de Receptores de Angiotensina O COVID-19 usa receptores da enzima conversora da angiotensina (ECA), mais especificamente a ECA2, para penetrar nas células. Tem sido hipotetizado que o uso de inibidores de ECA e bloqueadores de receptores de angiotensina (BRAs) possam aumentar esses receptores, assim facilitando a penetração do vírus. 24 Em uma nota recente, a Sociedade Brasileira de Cardiologia enfatizou dados sobre a importância de tais fármacos, como inibidores de ECA e BRAs, uma vez que não há evidência clara apoiando a associação entre a terapia com esses medicamentos e prognóstico piorado da doença. 25 Portanto, recomenda-se que os médicos cuidadosamente avaliem a relação risco-benefício antes de suspender os medicamentos, visto que são pilares fundamentais para o manejo de doenças crônicas, como hipertensão e insuficiência cardíaca. Da mesma forma, pacientes não devem interromper seu uso indiscriminadamente, sem antes consultar seus médicos. 824

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