ABC | Volume 114, Nº5, Maio 2020

Artigo de Revisão Costa et al. O coração e a COVID-19 Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):805-816 a resposta inflamatória. Na China, um estudo mostrou que a CQ estava associada a maior porcentagem de cura clínica e virológica e passou então a ser adotada naquele país no tratamento da COVID-19. Um pequeno estudo relatou que a HCQ com ou sem a azitromicina reduziu a detecção do RNA do SARS-CoV-2 em swab respiratório, não tendo sido analisado desfecho clínico. 51-53 Os principais efeitos colaterais dessas medicações são intolerância gastrointestinal (náuseas e vômitos) e, no uso a longo prazo, retinopatia, maculopatia e cardiomiopatia. Efeitos comuns são bloqueio atrioventricular total, bloqueio de ramo, arritmias cardíacas, hipotensão, torsades de pointes , inversão de onda T, fibrilação ventricular e taquicardia ventricular, ainda mais frequentes no uso prolongado e na disfunção hepática e renal. Em 10 de março de 2020, uma publicação do Journal of Critical Care reuniu a evidência científica a respeito da CQ e da HCQ no tratamento da COVID-19. Foram incluídas recomendações de especialistas, editoriais, estudo in vitro e descritos 23 estudos chineses em andamento ou prestes a iniciar o recrutamento. 54 No dia 21 de março de 2020, o presidente dos Estados Unidos cobrou celeridade do FDA na aprovação do fármaco no tratamento da COVID-19. Entretanto, no momento, o FDA recomenda o uso por compaixão até que tenhamos evidências científicas da eficácia da CQ, da HCQ e da azitromicina no tratamento da COVID-19. No Brasil, dois estudos foram aprovados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) no dia 23 de março de 2020: a) estudo de fase IIb para avaliar eficácia e segurança do difosfato de CQ no tratamento de pacientes hospitalizados com SARS-CoV-2: um ensaio clínico, duplo- cego e randomizado – estudo multicêntrico com 440 pacientes proposto pela Diretoria de Ensino e Pesquisa da Fiocruz Amazonas – até o momento incluiu 50 pacientes; e b) avaliação da segurança e da eficácia clínica da HCQ associada à azitromicina em pacientes com pneumonia causada pelo vírus SARS-CoV-2 – estudo multicêntrico com 400 pacientes proposto pela Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein – aguardando para iniciar recrutamento. OMinistério da Saúde do Brasil, a partir do dia 25 de março de 2020, portanto, passa a adotar a medicação como terapia adjuvante no tratamento de formas graves, exclusivamente, sem que outras medidas de suporte sejam preteridas em seu favor, conforme sugestão abaixo. A indicação considera que não existe outro tratamento específico eficaz disponível até o momento e que essa recomendação pode ser modificada a qualquer momento, a depender de novas evidências. Em 31 de março de 2020, em um estudo preprint , sem peer review , um grupo chinês demonstrou eficácia superior da HCQ em 62 pacientes analisados (com grupo controle) em casos de pneumonia leve. 55 Esse dado deverá ser confirmado em estudo commaior poder amostral e maior rigor metodológico. Outras medicações em análise são os glicocorticoides, as imunoglobulinas, o interferon e o tocilizumabe. Ressuscitação cardiopulmonar. Quando o paciente com COVID-19 evolui para parada cardiorrespiratória, cuidados especiais devem ser tomados, com atenção no manejo da via aérea por risco maior de contaminação da equipe pela liberação de aerossóis durante as manobras de compressão torácica e ventilação. 56,57 Todos os profissionais de saúde que estão em contato com pacientes devem seguir as orientações locais e nacionais para controle de infecção e uso de equipamentos de proteção individual, que devem estar em locais de fácil acesso. 58,59 Pacientes infectados com SARS-CoV-2, que correm risco de deterioração aguda ou parada cardíaca, devem ser identificados precocemente. Aqueles que foram definidos por quaisquer motivos como ‘não ressuscitação cardiopulmonar’ também devem ser identificados precocemente, e tal definição deve ser baseada nas diretrizes locais vigentes. 58 A causa mais provável é hipóxia; entretanto, todas as possibilidades devem ser consideradas (hipoglicemia, acidose, trombose coronariana). Os algoritmos já validados na literatura devem ser aplicados conforme a identificação de ritmos chocáveis e não chocáveis. 56,57 A manipulação da via aérea deve ser realizada por profissionais experientes e treinados. As equipes de profissionais que cuidam de pacientes com COVID-19, sejam médicos, enfermeiros ou fisioterapeutas, têm alto risco de contrair a infecção. 60,61 Os procedimentos de geração de aerossóis, como ventilação não invasiva, uso de cânula nasal de alto fluxo, ventilação com bolsa-valva-máscara ou bolsa-tubo endotraqueal, são de risco particularmente alto. 62 Deve-se evitar a ventilação com bolsa-valva-máscara ou bolsa-tubo endotraqueal, devido ao risco elevado de aerolização e contaminação da equipe e não há evidências de que esse tipo de ventilação seja superior à ventilação mecânica. 56 Em caso de necessidade de ventilação com bolsa-valva-máscara, deve-se selar corretamente a máscara, sendo necessário o envolvimento de mais de um profissional. Além disso, a utilização de filtros entre a máscara e a bolsa é mandatória. O estabelecimento de via aérea avançada deve ser priorizado nesses pacientes e realizado por indivíduos experientes. 56 A falha no procedimento de intubação ou impossibilidade requer o auxílio de dispositivos como tubo laríngeo ou máscara laríngea, para que permitam a ventilação mecânica em circuito fechado até que haja possibilidade de acesso definitivo à via aérea, seja por intubação traqueal ou por cricotireoidostomia. 57 No caso de parada cardiorrespiratória em pacientes sob ventilação mecânica, para que não haja contaminação por aerossóis pelas manobras de reanimação cardiopulmonar e ventilação, deve-se manter o paciente conectado ao ventilador mecânico em circuito fechado, com manutenção de FiO 2 de 100%, modo assíncrono, com frequência respiratória de 10 a 12 incursões por minuto (Figura 4). 56 Prevenção e manejo da trombose A literatura sugere que a exacerbada resposta inflamatória sistêmica presente na COVID-19 possa causar disfunção endotelial e aumento da atividade pró-coagulante, o que associado à menor oferta de oxigênio pode contribuir para a formação de trombo sobre uma placa coronariana rompida ou para a instabilidade de placa coronariana, tornando-a vulnerável. 10,11,63 É importante o diagnóstico diferencial da coronariopatia obstrutiva com infarto do miocárdio tipo II. 64 O paciente com COVID-19 pode apresentar uma 812

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