ABC | Volume 114, Nº5, Maio 2020

Artigo Original Bianco et al. Ablação de Flutter e Fibrilação Atrial. Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):775-782 a ser considerada é a realização combinada de um único procedimento de ablação para eliminar ambas as arritmias, evitando-se uma segunda intervenção. 9,11 Vale a pena realizar o isolamento das veias pulmonares simultaneamente à ablação do FLA-ICT em pacientes sem o registro prévio de FA? Na ablação do FLA-ICT o eletrofisiologista busca a construção de uma linha de ablação na região do istmo cavo- tricuspídeo, no intuito de impedir e bloquear a condução do circuito macro-reentrante no átrio direito. Neste caso, o acesso dos cateteres de ablação ao átrio direito dá-se exclusivamente pela punção das veias femorais. A ablação de FA – por outro lado – é um procedimento de maior complexidade e duração que necessita de acesso ao átrio esquerdo por meio de uma punção transeptal (passagem dos cateteres do átrio direito ao esquerdo por punção pelo septo interatrial) para isolamento elétrico das veias pulmonares, geralmente responsáveis pelo gatilho da FA. O estudo REDUCE AF, envolvendo 216 pacientes, demonstrou que a ablação combinada de FLA-ICT + FA resultou emmaior tempo livre de arritmia comparado ao grupo submetido à ablação de FLA-ICT apenas, especialmente nos pacientes com> 55 anos. Nesse subgrupo de pacientes, o número necessário para tratar (NNT) da estratégia de ablação combinada foi de 7, levando a uma redução de 14% no risco absoluto de ocorrência de FA. 11 Em uma análise de custo-efetividade, um estudo canadense propõe que a ablação combinada de FLA-ICT + FA não apresenta benefícios do ponto de vista financeiro e de riscos envolvidos. Com uma taxa de incidência de FA de 33% ou menos, o custo médio da realização dos procedimentos separadamente (ablação de FLA-ICT apenas, e se necessário, ablação de FA no futuro) foi menor quando comparado à estratégia combinada. Para a ablação de FLA-ICT isolada, o risco médio também é menor, considerando-se que o risco da ablação de FA excede o risco da ablação de FLA-ICT em 25% ou mais. Deve-se considerar, no entanto, que os riscos, custos e complicações variam regionalmente assim como a incidência de FA pós ablação de FLA-ICT, sendo em nossa amostragem quase 2 vezes maior que o previsto em análises de custo- efetividade. Outra ressalva dá-se ao fato de as análises de custo-efetividade não ponderarem negativamente os eventos embólicos a longo prazo nos pacientes em que a FA passa a se manifestar. Em Santa Catarina, o custo médio da internação por AVC cardioembólico por FA chega a R$ 40.539,00 por paciente.18 Assim, os riscos e custos envolvidos na ablação combinada de FLA-ICT + FA não se justificariam em curto prazo; estudos a longo prazo investigando os benefícios relacionados à estratégia combinada serão necessários para sugerir o benefício da abordagem simultânea em pacientes sem o registro prévio de FA.19 Vale a pena destacar que o tratamento combinado é sempre realizado quando existe registro de FA em pacientes com FLA-ICT. Fatores preditores da ocorrência de FA No presente estudo, nenhuma das variáveis ou escores analisados mostrou-se capaz de predizer a ocorrência de FA pós-ablação de FLA-ICT na população estudada. A literatura é divergente quanto aos achados de preditores para ocorrência de FA. Diferentes estudos encontraram variáveis clínicas como comorbidades, história prévia, duração do flutter atrial, 20 variáveis ecocardiográficas e eletrocardiográficas como preditoras de FA. 6,10,21-23 Apesar disso, Chinitz et al., 5 em estudo com 254 pacientes submetidos a ablação de FLA-ICT e seguimento de 30 ± 22 meses, não encontraram quaisquer variáveis preditoras para ocorrência de FA, mesmo dentre as mais comumente associadas à arritmia, corroborando nossos achados. O escore HATCH foi proposto no intuito de predizer a progressão da atriopatia associada à FA, principalmente pela evolução clínica da FA paroxística à FA persistente. Em subanálises, o escore HATCH mostrou-se útil ao predizer ocorrência de FA em pacientes assintomáticos. Em nossa análise, não houve diferença entre os grupos quanto à ocorrência de FA pós-ablação de FLA-ICT relacionada ao escore HATCH. 24 Além de predizer o risco de AVC na população portadora de FA, o escore CHA 2 DS 2 -VASC é sabidamente utilizado como preditor de morbimortalidade em diferentes contextos clínicos. No entanto, em nossa análise não houve significância estatística na predição da ocorrência de FA pós-ablação de FLA-ICT com base no CHA 2 DS 2 -VASC. Limitações A primeira limitação associa-se ao caráter retrospectivo do estudo. Em segundo lugar, o tamanho limitado da amostra pode não ter sido suficiente para evidenciar diferenças entre os dois grupos (FA x não-FA) e identificar variáveis preditoras de FA pós-tratamento invasivo do FLA-ICT. Por fim, não foi realizado monitoramento para arritmias assintomáticas após a ablação de FLA-ICT, de modo que a real incidência de FA pode ter sido subestimada. Conclusões Emnosso estudo, a ablação de FLA-ICT foi umprocedimento eficaz e seguro. A FA apresentou alta incidência após ablação de FLA-ICT mesmo em pacientes sem história prévia de FA, independentemente das características clínicas dos pacientes. Não há dados suficientes para indicação de ablação combinada para tratamento do flutter atrial visando prevenção da ocorrência de FA. Estudos de maior seguimento serão necessários para documentar os reais benefícios de uma abordagem simultânea. Contribuição dos Autores Concepção e desenho da pesquisa: Bianco I, Silva GO, Pereira E, d’Avila A; Obtenção de dados e obtenção de financiamento: Bianco I; Análise e interpretação dos dados: Bianco I, Silva GO, d’Avila A; Análise estatística: Bianco I, Silva GO; Redação do manuscrito: Bianco I, Pereira E, d’Avila A; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Bianco I, Silva GO, Dal Forno ARJ, Nascimento HG, Lewandowski A, Pereira E, d’Avila A. Potencial Conflito de Interesses Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. 781

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