ABC | Volume 114, Nº5, Maio 2020

Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):943-987 Diretrizes Diretriz Brasileira de Reabilitação Cardiovascular – 2020 de pulso do fluxo sanguíneo, da pressão de pulso (diferença entre a PA sistólica [PAS] e a diastólica [PAD]) e da pressão hidrostática no capilar. Soma-se a todo esse desequilíbrio estrutural a disfunção do endotélio, com o aumento de substâncias vasoconstritoras, de mediadores inflamatórios e de agentes oxidantes, em detrimento da produção de agentes vasodilatadores e antioxidantes. 95,96 O exercício físico, por meio do aumento do estresse tangencial derivado da fricção do fluxo sanguíneo na superfície endotelial da parede do vaso (definido como força de cisalhamento e comumente descrito pelo termo “ shear stress ”), estimula positivamente o tecido endotelial, com aumento da produção de enzimas antioxidantes e agentes vasodilatadores, além de diminuição da ação dos radicais livres, das citocinas pró-inflamatórias, das moléculas de adesão e dos agentes vasoconstritores, restaurando, assim, o equilíbrio do funcionamento endotelial. 97,98 Estudos experimentais 94 em ratos espontaneamente hipertensos demonstram a reorganização de todas as estruturas vasculares da artéria aorta após a implementação de um período de exercício aeróbico. O treinamento aeróbico promove adaptações vasculares nas artérias de condutância (com diminuição da rigidez arterial e melhora da função endotelial), nas arteríolas (pela diminuição da razão parede/luz do vaso) e nos capilares, estimulando a angiogênese. 99,100 Dessa maneira, a prática de exercícios físicos atua de modo multifatorial na HAS, sendo considerada intervenção-chave para mitigar o ônus da doença e suas comorbidades, 101 com efeito anti-hipertensivo semelhante ao das medicações, 102 embora essa ação possa se superpor às dos fármacos e, eventualmente, exigir ajustes das doses medicamentosas. Os exercícios físicos aeróbicos são os mais bem estudados e commaiores evidências de benefícios na redução pressórica em hipertensos, algo corroborado na meta-análise de Cornelissen et al., que mostrou redução média da PAS de 8,3 mmHg e da diastólica de 5,2 mmHg, decorrente dos exercícios aeróbicos. Os exercícios de resistência, que também exercem efeito anti-hipertensivo, 103 agem na preservação ou no aumento de massa muscular, força e potência, fatores que diminuem a intensidade relativa para realização de tarefas do cotidiano, com consequente amortecimento da resposta pressórica, além de possivelmente promoverem uma melhora da sensibilidade barorreflexa. 104 Além dos exercícios aeróbicos e resistidos dinâmicos, existem alguns estudos sobre exercícios isométricos (resistidos estáticos), que têm demonstrado efeitos expressivos na redução dos níveis tensionais. 105-107 Em uma meta-análise, foi demonstrado que o exercício isométrico de handgrip , realizado por 12 minutos, 3 a 5 vezes por semana, reduziu a PA em 5,2/3,9 mmHg. 108 No entanto, há falta de estudos sobre a segurança e a eficácia dessas modalidades em longo prazo. 6.2.2. Indicações de Exercícios Físicos na Hipertensão Arterial Sistêmica Maiores níveis de atividade física têm sido associados a uma diminuição no risco de desenvolvimento de HAS. Com o advento dos rastreadores eletrônicos de atividade e do monitoramento ambulatorial da PA, tornou-se cada vez mais viável a realização de estudos que correlacionem a atividade física e a PA. 109 A aptidão física, medida objetivamente por meio de testes de esforço graduados, atenua o aumento da pressão com a idade e impede o desenvolvimento de hipertensão. Em uma coorte de homens de 20 a 90 anos de idade, que foram seguidos por 3 a 28 anos, uma maior aptidão física diminuiu a taxa de aumento pressórico ao longo do tempo e atrasou o período até o início da HAS. 110 Estudos epidemiológicos têm revelado associação inversa entre o nível de atividade física e a aptidão cardiorrespiratória, com a presença de hipertensão arterial. 111,112 Os grandes ensaios clínicos randomizados e as meta-análises têm confirmado que o exercício físico regular pode reduzir os níveis pressóricos. 102,112 Além disso, a prática constante de atividades físicas pode ser benéfica tanto na prevenção quanto no tratamento da hipertensão, reduzindo a morbimortalidade cardiovascular. Indivíduos ativos apresentam um risco até 30% menor de desenvolver hipertensão que os sedentários 111 e o aumento da atividade física diária reduz a pressão aterial de maneira significativa. 113 A inatividade física tem sido um dos maiores problemas de saúde pública do mundo moderno, 114 por ser o mais prevalente dos fatores de risco cardiovasculares e um dos principais fatores contribuintes para mortalidade no mundo. 115 A sobrevida é menor em pessoas que passam a maior parte do tempo sentadas do que naquelas que passam pouco tempo desse modo. 116 Há relação direta entre o período sentado ou o tempo de televisão com níveis elevados de PA, morbidade e mortalidade cardiovascular. 117 Por esta razão, para a redução do tempo sentado, recomenda-se levantar-se por, pelo menos, 5 minutos a cada 30 minutos sentado, como medida válida de prevenção. A prática de exercícios físicos está indicada para todos os pacientes com HAS (Tabela 4). 72,73,118 Além dos exercícios, o tratamento da hipertensão requer outras modificações do estilo de vida, como alimentação correta, controle do peso e remoção de fatores de risco como o tabagismo e o excesso de consumo alcoólico. Além do efeito direto dos exercícios na HAS, outro componente importante da RCV se relaciona ao manejo da terapia farmacológica, a qual pode ser otimizada no ambiente da reabilitação, por meio de educação sobre a doença, aconselhamento quanto à necessidade de tratamento e informações sobre os efeitos colaterais e importância da adesão. 119 6.2.3. Avaliação Pré-participação Obviamente, cabe ao médico assistente estabelecer o diagnóstico da HAS, pesquisar outros fatores de risco cardiovasculares e rastrear lesões em órgãos-alvo e outras doenças associadas, de modo a definir a estratégia terapêutica, que pode ser farmacológica e/ou composta de uma ou mais modificações comportamentais. 72 Na avaliação para a prescrição de exercícios físicos é relevante a realização de um TCPE ou TE, especialmente se houver suspeita de cardiopatia, lesões em órgão-alvo ou presença de três ou mais fatores de risco. 72 Quando o TCPE ou TE for utilizado para prescrição de exercícios físicos, o ideal 956

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