ABC | Volume 114, Nº5, Maio 2020

Posicionamento Posicionamento da Sociedade Brasileira de Cardiologia para Gravidez e Planejamento Familiar na Mulher Portadora de Cardiopatia – 2020 Arq Bras Cardiol. 2020; 114(5):849-942 de eventos tromboembólicos. É oportuno considerar que o puerpério acrescenta um maior risco de tromboembolismo, daí a anticoagulação ser indicada nessa fase do ciclo gravídico-puerperal. Quanto às arritmias na IC, a mais comum é a FA, que pode ser tratada com betabloqueadores; se necessário, acrescenta‑se a digoxina para controlar a frequência cardíaca. Quanto às arritmias ventriculares frequentes ou à taquiarritmia ventricular sustentada, o tratamento inclui o uso de amiodarona e, quando de maior risco, estão indicados os CDI. Quando ocorrer instabilidade hemodinâmica e choque cardiogênico, a paciente deverá ser transferida inicialmente para UTI e, se possível, com SMC 346 e em sequência o parto cesárea de urgência; entretanto, em caso eletivo, a via de parto fica por indicação obstétrica, levando em consideração a paridade da mãe, as comorbidades existentes e a gravidade da lesão cardíaca. No puerpério, deve-se evitar sobrecarga de volume resultante da infusão de fluidos no intraparto e pós-parto. O uso da ocitocina em baixas doses deve ser considerado, a despeito das suas propriedades vasoativas, e a ergonovina deve ser evitada devido ao seu efeito vasoconstritor periférico. 5.3.2. Pontos-chaves • Os sintomas e sinais fisiológicos da gravidez podem atrasar o diagnóstico de IC; • O BNP (≤ 100 pg/ml) é um marcador de IC também válido na gravidez; • O BNP seriado na gestação auxilia no diagnóstico de IC e na terapêutica; • Os betabloqueadores são considerados os fármacos de primeira linha e devem ser mantidos durante a gestação em casos de ICFEr; • No planejamento familiar, a gravidez deve ser desaconselhada para mulheres com IC crônica que apresentam FEVE < 40% e contraindicada naquelas em CF III/IV com FEVE < 20%. 5.4. Tratamento e Prevenção 5.4.1. Endocardite Infecciosa EI é rara durante a gravidez; ocorre em 0,006% da população geral; porém, em paciente com doença valvar ou cardiopatia congênita, esse percentual chega a 1,2%. 270,350 As pacientes portadoras de prótese valvar e cardiopatias complexas cianogênicas, bem como as usuárias de drogas ilícitas, constituem o grupo de maior risco. Trata-se de uma doença grave com mortalidade materna próxima de 33%, consequente IC e fenômeno tromboembólico. 350,351 Durante a gravidez, deve ser dada atenção especial a febre sem causa aparente e à semiologia do coração, uma vez que o aparecimento de sopros cardíacos inocentes ou funcionais é muito frequente durante a gestação normal. A abordagemda EI demanda uma assistênciamultidisciplinar em centro terciário de cardiologia, apoiada nas decisões do “heart team” que esteja capacitado a oferecer os recursos disponíveis para diagnóstico, tratamento e seguimento de acordo com as recomendações convencionais. 350 A profilaxia da EI durante a gravidez segue as mesmas recomendações utilizadas para pacientes não grávidas. 350,351 Promover saúde bucal, orientar sobre a higienização e consulta odontológica periódica na vigilância do aparecimento da gengivite gravídica que favorece a doença periodontal é uma orientação básica na prevenção da EI, uma vez que a porta de entrada para os agentes etiológicos mais frequentes é a cavidade oral. A antibioticoprofilaxia para tratamento odontológico é controversa; contudo, quando indicada, utiliza-se amoxacilina 2 g por via oral ou clindamicina 600 mg por via oral nos pacientes alérgicos à penicilina, 1 h antes da intervenção. A antibioticoprofilaxia da EI na ocasião do parto vaginal ou cesárea é também controversa, 350 e a falta de evidências sobre a prevenção da doença pelo uso de antibióticos na ocasião do parto fragiliza tal indicação. Entretanto, deve-se considerar que a ocorrência de EI no pós-parto é grave e as complicações peculiares a esse período, que elevam a bacteremia (extração manual da placenta, curetagem, retenção placentária), 352 não são previsíveis. Vale lembrar que a infecção puerperal no Brasil é uma das principais causas obstétricas de morte materna. Por isso, a decisão de se realizar a antibioticoprofilaxia para a EI na ocasião do parto deve ficar a critério da equipe que atende a parturiente, de acordo com a individualização de cada caso. Embora, ainda controverso, as situações clínicas de alto risco para a EI que podem exigir a antibioticoprofilaxia de rotina estão apresentadas na Tabela 39, 350 e as recomendações quanto ao modo de aplicação estão na Tabela 40. O diagnóstico clínico da EI resume-se a história de febre, calafrio, queda do estado geral, fenômeno embólico, periférico ou central, fenômeno vascular ou imunológico, glomerulonefrite e aparecimento de novo sopro. Quanto aos exames complementares, o doppler-ECO transtorácico deve ser sempre realizado quando houver a suspeita clínica; o transesofágico é indicado quando o transtorácico for negativo para EI e nos casos de prótese valvar. As hemoculturas devem ser coletadas antes da introdução dos antibióticos, mínimo de três amostras, em um intervalo de 30 min, por meio de técnicas estéreis em punção venosa periférica, independente do pico febril; se possível, repetir em 12 horas. O tratamento deve ser iniciado após a coleta das hemoculturas e precisa ser pautado na epidemiologia, na história clínica e no resultado das hemoculturas e do antibiograma, de acordo com as diretrizes convencionais. 350,351 Vale lembrar que o agente etiológico mais comum da EI no Brasil é o Streptococcus viridans da cavidade oral. A escolha do antibiótico, pela via de administração intravenosa, e o tempo de antibioticoterapia são os mesmos da paciente não grávida, considerando-se os possíveis efeitos tóxicos dos antibióticos sobre o feto. 52,350,351,353 Nesse sentido, existem três grupos de antibióticos classificados quanto aos riscos para a gestação: (1) os mais seguros, que compreendemampicilina, penicilina, amoxacilina, oxacilina, eritromicina, daptomicina e cefalosporinas; 914

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