ABC | Volume 114, Nº4, Abril 2020

Artigo Original Carrion et al. Disfunção ventricular direita e transplante cardíaco Arq Bras Cardiol. 2020; 114(4):638-644 principal foi que a rejeição celular moderada (2R) foi associada à disfunção contrátil de VD avaliada por SLG VD, bem como por parâmetros ecocardiográficos convencionais como TAPSE, onda S e VFA. Por outro lado, não houve alterações na função sistólica do VE neste grupo. Adicionalmente, rejeição moderada foi associada a um aumento na espessura da parede posterior do VE, na relação E/e’ e na relação E/A. Na busca de métodos não invasivos para auxiliar na triagem para rejeição celular, alguns estudos avaliaram strain e a strain rate por Doppler tecidual (DT). Marciniak et al., 10 estudando uma população de 31 pacientes com 106 pares de biópsia/ecocardiograma, demonstraram uma redução em strain e strain rate no DT em segmentos basais e apicais da parede livre do VD e em segmentos médios da parede lateral do VE no grupo com ≥ rejeição 1B, sugerindo que estes achados possam ser uma ferramenta adicional na detecção de rejeição aguda. Os mesmos autores também observaram que, quando o acometimento histopatológico era leve (< 2B), essas alterações assumiram um padrão de acometimento segmentar, com pouco ou nenhum impacto no SLG, revelando uma baixa sensibilidade do último para rejeição de baixo grau. 10 Mais recentemente, o advento da avaliação da função miocárdica regional ou global por speckle tracking forneceu uma técnica mais robusta para a detecção de disfunção miocárdica subclínica, superando as limitações de strain medido pelo DT, especialmente a dependência na aquisição prospectiva e o ângulo de aquisição. 10,11 Pelo menos 3 estudos, publicados quase concomitantemente, mostraram uma redução em SLG VE relacionada à rejeição, 14-16 enquanto um outro grupo, como no nosso estudo, não achou diferenças em SLG VE ao comparar exames de pacientes com leve ou nenhuma rejeição com aqueles de pacientes com rejeição moderada. 17 Vale ressaltar que os valores de SLG VE, mesmo no grupo 0R do nosso estudo, excederam as faixas relatadas como normais após TC na literatura. 18,19 Avaliação de parâmetros do VD como potenciais marcadores de rejeição subclínica foi relativamente menos explorada em estudos prévios. Clemmensen et al. estudaram um grupo de 36 pacientes de TC, achando que a TAPSE foi reduzida no grupo com rejeição celular. 16 Outro grupo, que estudou um número parecido de pacientes (n = 34), achou uma redução no strain da parede livre do VD associada à rejeição ≥ 2R. 15 Estes achados foram observados como uma tendência parecida no nosso estudo, onde a diminuição da função do VD foi demonstrado por TAPSE, onda S, VFA e SLG pico do VD em rejeição moderada. Eleid et al. demonstraram uma diminuição do SLG VE no começo do período pós-TC, e a associação da ausência de melhoramento no SLG durante o acompanhamento foi um preditor independente de pior prognóstico nesses pacientes, independente dos resultados histopatológicos das biópsias endomiocárdicas. 20 Adicionalmente, o começo do período pós-TC é um momento de adaptação do coração novo ao espaço torácico, em uma posição diferente do tórax em comparação com o coração nativo, com alterações estruturais esperadas, por exemplo, aumento na massa do VE e na espessura da parede devido à infiltração de células inflamatórias e edema do enxerto, as quais fazem parte do processo fisiológico do TC. Estas abnormalidades melhoram gradualmente durante os primeiros 6 meses pós-TC, mas podem ser variáveis de confusão com alguns sinais de rejeição do enxerto. Além disso, em concordância com os achados do nosso estudo, a hipertrofia do VE e alterações na função diastólica, especialmente pressão de enchimento do VE, têm sido associadas à rejeição celular, apesar da sensibilidade menor destes achados, que podem ser confundidos com as alterações habituais pós-TC. 15,18 Devem ser observadas algumas limitações desta análise. Considerando que a maioria das ecocardiografias pelas quais as biópsias correspondentes estavam disponíveis foi realizada para detectar complicações da biópsia endomiocárdica, como efusão pericárdica e lesão da válvula tricúspide, muitos desses exames não conseguiram incluir uma avaliação detalhada da função e das dinâmicas cardíacas. Consequentemente, tivemos que excluir 34% das biópsias. Também constituiu uma limitação o desenho de único centro desta pesquisa, principalmente porque foi realizado em uma instituição que está ainda no processo de expandir o seu programa de TC, fato que justifica o pequeno tamanho da amostra. Informações sobre rejeição mediada por anticorpos não foram incluídas neste estudo; portanto, achados ecocardiográficos por essa situação não podem ser extrapolados. Em geral, o estudo compreendeu uma população de baixo risco imunológico. Conclusões Em conclusão, na avaliação de strain pelo 2D STE, bem como por métodos ecocardiográficos convencionais, achamos evidências de disfunção sistólica do VD após TC em pacientes com rejeição moderada, em comparação com aqueles sem sinais significativos de rejeição na histopatologia. Função sistólica do VE permaneceu sem alterações, sugerindo que a disfunção subclínica do VE possa surgir após a disfunção do VD. Além disso, pacientes cujas biópsias evidenciaram rejeiçãomoderada tinhammaior hipertrofia do VE e pior função diastólica e pressão de enchimento do VE na ecocardiografia. Opapel destes achados na triagem e no diagnóstico da rejeição, que podem resultar em atualizações que mudarão a prática dos protocolos das biópsias endomiocárdicas, ainda precisa ser explorado em um estudo prospectivo multicêntrico. Contribuição dos autores Concepção e desenho da pesquisa e Análise e interpretação dos dados: Carrion LFBM, Rohde LE, Santos ABS; Obtenção de dados, Análise estatística e Redação do manuscrito: Carrion LFBM, Santos ABS; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Sperotto A, Nazario R, Goldraich LA, Clausell N. Potencial conflito de interesses Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. 643

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