ABC | Volume 114, Nº4, Abril 2020

Artigo Original Scherr et al. Interleucina 18, proteína precursora do trombo DAC Arq Bras Cardiol. 2020; 114(4):692-698 Introdução A doença arterial coronariana é, no século XXI, uma das principais manifestações de doença cardiovascular, e sua importância está em suas altas morbidade e mortalidade. A identificação dos pacientes de maior risco torna-se necessária para contribuir para melhora desse quadro e racionalização de custos.¹ A medicina moderna tem evoluído rapidamente no âmbito da prevenção, da detecção precoce e do rastreamento de doenças, não se restringindo ao tratamento. Nesse sentido, a detecção precoce, associada ao tratamento imediato da doença cardiovascular (DCV), tornou-se um dos empreendimentos mais desafiadores para médicos e pesquisadores em todo o mundo. Numerosos biomarcadores têm sido estudados nos últimos anos no diagnóstico, no prognóstico, na predição de eventos adversos e no monitoramento terapêutico. 2 No entanto, a primeira iniciativa em direção à prevenção é aplicar estratégias para identificar o indivíduo com probabilidade de apresentar eventos ateroscleróticos. Nesse sentido, além de os fatores de risco amplamente conhecidos contribuírem no processo de identificação de vulneráveis, o uso de biomarcadores envolvidos na aterogênese pode constituir peça-chave na avaliação do risco de doença arterial coronariana (DAC).³ ,4 A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica, multifatorial, lenta e progressiva, resultante de inúmeras respostas celulares e moleculares específicas que levam à agressão endotelial, acometendo principalmente a camada íntima de artérias de médio e grosso calibre. Em geral, a ruptura da capsula fibrosa da placa aterosclerótica leva a trombose, que, em menor proporção, pode resultar da erosão endotelial superficial. As placas que se rompem geralmente estão associadas a inflamação da íntima e da adventícia, hemorragia intraplaca, exposição de material trombogênico na circulação sanguínea disparando acúmulo de plaquetas, ativação da cascata de coagulação e deposição de fibrina. 5 A resposta inflamatória na aterogênese consiste em mudanças funcionais em células endoteliais, linfócitos T, macrófagos derivados de monócitos, células dos músculos lisos e nos estágios iniciais, provocada pelo acumulo de lipídeos nas paredes das artérias. 6 A ativação dessas células desencadeia a formação e interação de várias citocinas, moléculas de adesão, fatores de crescimento, acúmulo de lipídeos e proliferação de células do músculo liso. Além desses fatores, a resposta inflamatória pode ser induzida por estresse oxidativo (oxidação de lipoproteína de baixa densidade - LDL). 7,8 Atualmente, novos biomarcadores vêm sendo estudados, em associação a síndrome coronariana aguda ou crônica e correlacionados ao valor prognóstico; este é o objetivo do presente estudo. Neste estudo, foram avaliados dois biomarcadores: a proteína precursora do trombo (TpP) e a interleucina 18 (IL-18) em indivíduos com infarto agudo do miocárdio (IAM) com e sem supradesnivelamento de ST, angina instável (AI), doença arterial coronariana crônica e indivíduos que não apresentavam evidência de doença aterosclerótica coronariana obstrutiva, porém na presença de fatores de risco para DAC. A escolha dos biomarcadores foi baseada no envolvimento destes com o processo inflamatório (IL-18) e trombótico (TpP), inserido no contexto de aterosclerose e agudização da doença aterosclerótica. TpP é um biomarcador usado para estimativa de polímeros de fibrina solúveis. Níveis elevados de TpP são indicativos de estado pró-trombótico e de trombogênese em atividade. Nos pacientes com SCA, o aumento dos níveis desse biomarcador estão associados a maior risco de morte e complicações isquêmicas; portanto, a TpP tem-se mostrado um marcador independente para desfechos cardiovasculares adversos. 9 O biomarcador IL-18 é uma citocina pró-inflamatória, intimamente relacionada com a instabilidade da placa aterosclerótica, sendo por isso boa preditora de eventos indesejáveis na SCA. 10,11 Em estudo observacional, a IL-18 também se mostrou boa preditora de eventos cardiovasculares adversos em coronariopatas crônicos ao longo de dois anos. 12 Estudar pacientes vulneráveis a doença aterosclerótica e até mesmo poder dispor de parâmetros de gravidade naqueles com doença já presente através de novos marcadores tem sido um desafio para as pesquisas médicas na atualidade. Nesse contexto, os novos biomarcadores conquistam um espaço importante, considerando-se o aspecto de morbidade e mortalidade da doença coronariana, podendo vir a ser preditores de eventos cardiovasculares e, assim, contribuir para prevenção, detecção precoce e rastreamento da DAC. Métodos Objetivo primário Avaliar os níveis séricos dos biomarcadores interleucina 18 (IL-18) e proteína precursora do trombo (TpP) em pacientes com síndrome coronariana aguda ou crônica em relação ao grupo-controle. Objetivos secundários Verificar a associação dos níveis séricos dos biomarcadores interleucina 18 (IL-18) e proteína precursora do trombo (TpP) com a cronicidade, agudização da doença arterial coronariana ou ausência de processo aterosclerótico coronariano obstrutivo. Avaliar a relação dos dados epidemiológicos, antropométricos e fatores de risco da população estudada com os biomarcadores interleucina 18 (IL-18) e proteína precursora do trombo (TpP). Nessa coorte transversal, foram estudados 119 pacientes, de ambos os sexos, maiores de 30 anos de idade, estratificados em três grupos: agudo (Grupo I – n=39), crônico (Grupo II – n=40) e controle (Grupo III – n=40), de acordo com os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos para o estudo e comparados com o montante de dois biomarcadores: IL-18 e TpP. Os pacientes pertencentes ao Grupo I (agudo) foram recrutados a partir de história clínica típica de síndrome coronariana aguda (IAMSST, IAMCSST e AI), acrescida dos dados eletrocardiográficos e enzimas cardíacas no momento da admissão. Uma vez identificados, foi coletado sangue em até 48 horas do início dos sintomas, para posterior dosagem 693

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