ABC | Volume 114, Nº1, Janeiro 2020

Artigo Original Almeida et al. Remodelamento do ventrículo esquerdo na atenção primária Arq Bras Cardiol. 2020; 114(1):59-65 aos padrões de remodelamento, principalmente em relação à remodelamento concêntrico (18% vs. 2%) e hipertrofia excêntrica (13% vs. 29%). Essas diferenças também podem ser explicadas pelo maior número de pacientes hipertensos e diabéticos observados em nosso estudo em relação ao estudo de Lieb et al. 11 Um estudo realizado na comunidade por Teh et al., 12 avaliaram a prevalência dos quatromodelos de remodelamento em 108 pacientes com idade > 70 anos, sendo 56%mulheres, 84% hipertensos e 20% diabéticos. 12 Embora os dados de Teh et al., 12 tenham sido obtidos em uma populaçãomais idosa, eles são semelhantes aos nossos em relação à maior prevalência de hipertrofia excêntrica observada na amostra (26% vs. 29%), mostrando que parece haver uma prevalência aumentada de remodelamento excêntrico em indivíduos mais velhos e com mais comorbidades. O envelhecimento está diretamente relacionado à progressão do remodelamento cardíaco, provavelmente devido à exposição a múltiplos fatores de risco cardiovascular. Essa conclusão esteve presente em nosso estudo e na literatura. 13 Observamos uma associação entre o sexo feminino e a presença de hipertrofia excêntrica do VE após o ajuste para outras variáveis (OR, IC95%, 1,75 [1,17 a 2,61]). Existem diferenças na estrutura e função cardíaca em relação ao gênero, e essas diferenças parecem ser mais pronunciadas na presença de fatores de risco para IC com fração de ejeção preservada (ICFEp), e podem ser explicadas pelo dimorfismo sexual. 14 Um estudo que avaliou mudanças na rigidez do VE em 1.402 indivíduos na comunidade observou um aumento na rigidez com o envelhecimento, que é mais frequente nas mulheres do que nos homens. 15 Um estudo envolvendo Tabela 2 – Parâmetros ecocardiográficos dos indivíduos selecionados, caracterizados pelos padrões de remodelamento do ventrículo esquerdo Variáveis Geometria normal n = 423 Hipertrofia excêntrica n = 186 Hipertrofia concêntrica n = 14 Remodelamento concêntrico n = 13 Valor de p (*) FEVE (%) 61 (58-65) 63 (58-64) 59(50-64) 60 (56-63) 0,01 MVEi (g/m 2 ) 82,8 (72,2-92,0) 84 (70,7-93,4) 120(105,6-150,71) 116,3 (102,4-127,3) < 0,0001 VAEi (ml/m 2 ) 20,8 (17,1-24,5) 18 (14-22,3) 23,6(19,2-33,1) 22,6 (19,2-27,5) < 0,0001 VDFi (ml/m 2 ) 60,1 (51,8-67,2) 41,7 (36,4-49,4) 60,5(52,1-75,9) 74,7 (67,7-83,2) < 0,0001 E’(cm/s) 10 (8-12) 12 (7,5-13) 7,7(6-10,6) 9 (7-11) < 0,0001 E (cm/s) 64 (54-76) 70 (52-93) 68(51-75) 63 (52-78) 0,532 A (cm/s) 65 (53-81) 76 (59-99) 69(56-98) 71 (57-86) 0,242 E/A ratio 1,0 (0,7-1,3) 1,1 (0,6-1,3) 0,9(0,7-1,1) 0,8 (0,7-1,2) 0,003 E/E’ ratio 6,4 (5,3-7,7) 7,1 (4,7-8,7) 8,0(5,7-10,0) 7,1 (5,7-8,4) 0,008 EPS (mm) 8 (7-8) 9 (8-10) 10(10-12) 9 (8-9) < 0,0001 DDVE (mm) 47 (44-50) 40 (34,5-41,5) 43,5(41,7-47,8) 52 (49-54,2) < 0,0001 EPP (mm) 8 (7-8) 9 (8-10) 10(10-12) 8 (8-9) < 0,0001 FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; MVEi: massa ventricular esquerda indexada; VAEi: volume atrial esquerdo indexado; VDFi: volume diastólico final indexado; E´: velocidade mitral diastólica anular precoce; E: velocidade inicial do fluxo mitral;A: velocidade máxima do fluxo mitral na contração atrial; DDVE: diâmetro diastólico do VE; EPS: espessura da parede septal; EPP: espessura da parede posterior (*) = valor de p = a diferença entre os padrões de remodelamento realizados com teste Kruskall-Wallis 1-way ANOVA para múltiplas comparações (todos os pares). 318 adultos saudáveis do FraminghamHeart Study que foram submetidos à RM para determinar os valores de referência dos parâmetros do VE observou um aumento maior nas dimensões lineares do VE após o ajuste da área de superfície corporal em mulheres do que em homens (p < 0,001). 16 Nossos dados mostraram que o baixo nível educacional associou-se à hipertrofia excêntrica. Tal resultado pode ser explicado por uma maior exposição a fatores de risco, menos compreensão sobre o autocuidado e menor adesão ao tratamento medicamentoso. A microalbuminúria é um importante marcador de risco cardiovascular, 17 e os dados apresentados aqui mostraram que indivíduos com alterações na geometria ventricular apresentaram altos níveis de albumina na urina e piora da função renal avaliados pela TFG. Indivíduos com insuficiência renal apresentam aumento progressivo da hipertrofia excêntrica, que pode refletir doenças cardíacas com perda concomitante da função renal. Os padrões concêntricos e excêntricos refletem nefropatia hipertensiva, que progride com doença cardíaca estrutural. Estudos mostram a existência de uma associação entre albuminúria, remodelamento e doenças cardiovasculares. O aumento da excreção urinária de albumina está associado a alterações no remodelamento ventricular em pacientes com hipertensão. Pacientes com hipertensão com incapacidade de regressão à albuminúria têm maior incidência de doença cardiovascular. 18 Nossos dados mostram que existe uma forte associação entre a razão albumina/creatinina e o desenvolvimento de hipertrofia excêntrica do VE. Este estudo foi o primeiro da população brasileira de assistência primária a estudar especificamente a geometria do VE com a inclusão de RWT. 62

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