ABC | Volume 114, Nº1, Janeiro 2020

Minieditorial Alta Prevalência de Dislipidemias em Crianças e Adolescentes: Oportunidade para Prevenção High Prevalence of Dyslipidemia in Children and Adolescents: Opportunity for Prevention Leonardo Mangi li Parana Medical Research Center (PMRC), Maringá, PR – Brasil Minieditorial referente ao artigo: Avaliação de Perfis Lipídicos Infanto-Juvenis Solicitados nas Unidades Básicas de Saúde em Campinas/SP, Brasil: Um Estudo Laboratorial Transversal Correspondência: Leonardo Mangili • Parana Medical Research Center (PMRC) Av. Dr. Luis Teixeira Mendes,1929. CEP 87015-000, Maringá, PR – Brasil E-mail: leomangili@yahoo.com.br Palavras-chave DoençasCardiovasculares,Dislipidemias,Hipercolesterolemia, Criança, Adulto Jovem, Sistema Único de Saúde, Adolescente, Testes Laboratoriais. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20190761 As doenças cardiovasculares são importantes causas de morbidade e mortalidade. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, globalmente, um terço das doenças isquêmicas do coração são atribuíveis ao colesterol elevado e este causa 2,6 milhões de mortes por ano. 1 A aterosclerose se inicia na infância e evolui em um processo insidioso que pode levar décadas desde as primeiras lesões arteriais até os desfechos clínicos (morte, infarto do miocárdio ou acidentes vasculares encefálicos). Este processo é acelerado por fatores de risco como colesterol, tabagismo, obesidade e hipertensão arterial. 2 O estudo multicêntrico Pathological Determinants of Atherosclerosis in Youth (PDAY) revelou presença de lesões ateroscleróticas em todas as aortas e 50% das artérias coronárias direitas de 1.532 necropsias de indivíduos de 15 a 19 anos de idade. 3 Quando foi analisado o papel dos fatores de risco em indivíduos entre 15 e 34 anos encontrou-se que as lesões aórticas e coronárias estavam positivamente com os níveis de LDL e VLDL, intolerância a glicose, tabagismo, hipertensão arterial, obesidade e negativamente associados com níveis de HDL. 4 Achados semelhantes foram descritos no Bogalusa Heart Study que associou a presença de estrias gordurosas na aorta commaiores níveis de colesterol total e LDL, alémda associação inversa com o HDL. 5 Houve também maior gravidade das lesões ateroscleróticas na presença de múltiplos fatores de risco concomitantes (índice de massa corporal, pressão arterial, concentrações de colesterol e triglicerídeos). 6 Em concordância com as evidências que elevações do colesterol promovem a aterosclerose, estudos de randomização mendeliana evidenciamque a exposição à níveis geneticamente mais baixos de colesterol desde a infância se associa a uma redução de risco de doença arterial coronariana (DAC). Foi estimado que para cada 1 mmol/l (38,7 mg/dl) de redução no LDL há uma redução de 54,5% (IC 95% 48,8%-59,5%) no risco de DAC. 7 Tal redução é 3 vezes superior a obtida com uso de estatinas em idades mais avançadas. 7 O metabolismo do colesterol pode ser analisado pela dosagem de esteróis não-colesterol no sangue, marcadores de síntese e absorção de colesterol. Em crianças de 1 a 10 anos de idade a absorção prevalece em relação a síntese. 8 Este achado demonstra a importância da dieta como ferramenta de redução do colesterol neste grupo etário. Nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Gomes et al., 9 avaliaram a prevalência de dislipidemias isoladas e em combinação em 62.530 crianças e adolescentes, com idades entre um dia e 19 anos, atendidos na rede de Unidades Básicas de Saúde da cidade de Campinas. Encontraram alterações bioquimicamente classificadas em 67% dos perfis lipídicos avaliados. As prevalências de aumento de colesterol total, triglicerídeos, colesterol LDL e colesterol não-HDL foram, respectivamente, 33%, 40%, 29% e 13%. A presença de colesterol HDL baixo foi encontrada em 39% dos casos analisados. 9 Embora o número de indivíduos analisados seja um ponto forte deste estudo, a análise exclusiva dos perfis lipídicos impede quaisquer outras conclusões além da frequência de alterações nesta população. Os fatores de risco presentes na infância e adolescência provavelmente persistirão até a idade adulta. Este período da vida é uma janela de oportunidade para iniciar medidas efetivas para prevenção de aterosclerose e de eventos clínicos na idade adulta. É, portanto, necessário rastrear e tratar alterações no perfil lipídico de crianças e adolescentes, especialmente daqueles com outros fatores de risco. Desta forma, a Atualização da Diretriz de Prevenção Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia – 2019 recomenda a dosagem de perfil lipídico universal entre 9‑11 anos de idade e a partir de 2 anos quando estiverem presentes outros fatores de risco. A adoção de dieta saudável, a prática de atividade física regular e o controle de peso são os pilares do tratamento das dislipidemias neste grupo etário. O uso de medicação, predominantemente estatinas, deve ser reservado aos casos mais graves (como dislipidemias genéticas) e para falha do tratamento não farmacológico. 10 57

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