ABC | Volume 114, Nº1, Janeiro 2020

Artigo Original Figueiredo et al. Baixa qualidade de vida em pacientes com insuficiência cardíaca Arq Bras Cardiol. 2020; 114(1):25-32 Análise estatística As variáveis contínuas foram apresentadas em média ± desvio padrão (variáveis com distribuição normal), ou mediana e primeiro e terceiro quartis (variáveis sem distribuição normal). A normalidade dos dados foi testada pelo teste de normalidade de Shapiro-Wilk . A comparação entre os grupos NYHA = I/II e NYHA = III/IV foi feita pelo teste t de Student não pareado para variáveis contínuas com distribuição normal, Wilcoxon rank sum test para variáveis contínuas sem distribuição normal, e o teste binomial para variáveis categóricas. O escore total, e as dimensões física, emocional e geral do MLwHF foram as variáveis de desfecho. A associação das variáveis descritas acima com os desfechos e dimensões de QV foi avaliada usando um modelo paramétrico de regressão beta e uma árvore de regressão não paramétrica. 15 A regressão beta é um modelo novo, desenvolvido pelos autores brasileiros Silvia Ferrari e Francisco Cribari, utilizada quando o desfecho for uma variável contínua que varia no intervalo (0,1). A árvore de regressão, além de seu poder preditivo e de fácil interpretação visual, é também muito útil para identificar possíveis interações entre variáveis preditivas, inclusive em situações de interações inesperadas, como no nosso caso. Os nós finais resultam no boxplot das variáveis de desfecho. 16,17 Foi utilizado o pacote Betareg 18 do programa R. 19 nas análises. Valores de p < 0,05 e 0,05 < p < 0,10 foram considerados de significância estatística e relevância clínica, respectivamente. Dados de 99 pacientes foram analisados; dois pacientes não apresentavam dados de FEVE, e três não apresentavam dados de renda familiar mensal. Os dados faltantes foram repostos considerando o MCAR ( missing completely at random ) como mecanismo de perda desses dados, ou seja, totalmente ao acaso. 20 Para facilitar a leitura das figuras, as escalas do MLwHF foram ajustadas para variarem de 0 a 100 (0, 1) e os escores foram invertidos, de modo que os escores mais altos corresponderiam a uma melhor QV. Resultados A Tabela 1 descreve as características da amostra dividida de acordo com a classe funcional NYHA. Valores mais baixos de FEVE e de todas as dimensões do MLwHF foram significativamente mais comuns nos pacientes com classe funcional NYHA III e IV. Por outro lado, apoio familiar, ausência de comorbidades tais como diabetes mellitus, fibrilação atrial, insuficiência renal crônica e a não utilização de espironolactona, nitrato ou furosemida foram significativamente mais frequentes nos pacientes com classe funcional NYHA I e II. Os resultados da análise por regressão beta estão apresentados na Tabela 2. Vale destacar que a variável preditora classe funcional da NYHA apresentou associação estatisticamente significativa com todas as variáveis de desfechos, mostrando que a QV dos pacientes, em todas suas dimensões, foi influenciada pelos sintomas físicos da IC. Os sintomas de ansiedade também se associaram com todos os desfechos, exceto a dimensão bem-estar geral. Sintomas de depressão se associaram com a dimensão emocional, demonstrando que os sintomas psicológicos afetaram a QV dos pacientes nesta amostra. A ocorrência de internação hospitalar prévia piorou a QV dos pacientes ambulatoriais com IC em relação a aspectos emocionais e físicos. O uso de medicamentos tais como betabloqueadores, IECA e furosemida associou-se com pior MLwHF em diferentes dimensões. A dimensão bem-estar geral do MLwHF diminuiu com menor renda familiar dos pacientes. Vale mencionar que todos os modelos de regressão beta apresentaram um coeficiente de determinação R2 de aproximadamente 50% (Figura 1: A-50, B-48, C-56, D-44), o que significa que as variáveis prognósticas explicam 50% da variação do desfecho ou das variáveis dependentes. A árvore de regressão, modelo não paramétrico, também avaliou a associação do conjunto das variáveis preditoras com cada variável de desfecho (Figura 1). Os resultados desse modelo estão de acordo com o modelo beta mostrado na Tabela 2, além de fornecer informações acerca de interações entre variáveis independentes. A Figura 1 ilustra os efeitos de uma pior classe funcional da NYHA sobre todas as dimensões do MLwHF. Os sintomas de ansiedade contribuíram direta ou indiretamente para um escore total mais baixo e piora da dimensão emocional no MLwHF. Omesmo foi observado para a variável internações anteriores na dimensão emocional, indicando uma interação com as classes funcionais NYHA I e II. Na dimensão bem-estar geral, as classes funcionais NYHA I e II associaram-se com pior MLwHF se os pacientes tivessem idade inferior a 60 anos. Devido à inversão do sistema de pontuação, a interpretação das árvores de regressão considera que os valores mais altos de cada variável de desfecho correspondem a uma melhor QV. Em outras palavras, poderíamos exemplificar que a melhor QV foi observada em pacientes com classe funcional da NYHA I, sem sintomas de ansiedade (Figura 1A: escore total, 14 pacientes, 14,1%), pacientes com classe NYHA I (Figura 1B: dimensão Física, 19 pacientes, 19,2%), pacientes com classe funcional NYHA I ou II pacientes sem sintomas de ansiedade ou hospitalização prévia (Figura 1 C: dimensão emocional, 27, 27.3%), e pacientes com classe funcional NYHA I ou II com idade superior a 59 anos (Figura 1D: dimensão bem-estar geral, 32 pacientes, 32,3%). Nós criamos um pseudocoeficiente de determinação R2 para a árvore de regressão, resultando em coeficientes de 30% e 40% aproximadamente (Figura 1: A-42, B-29, C-44, D- 29). Discussão A originalidade deste estudo consiste nos métodos aplicados à pergunta em questão. A árvore de regressão é uma regressão não paramétrica, útil para a predição, e para obter dados não só a partir das variáveis relevantes, mas também das importantes interações entre essas variáveis. Na regressão tradicional, podemos obter as variáveis relevantes, porém é necessário definirmos quais interações nós consideramos relevantes. Na árvore de regressão, o algoritmo do Data Mining verificou, a partir dos dados existentes, quais variáveis e quais interações são as mais importantes, favorecendo um melhor entendimento das complexas relações observadas na prática clínica. 27

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