ABC | Volume 113, Nº6, Dezembro 2019

Minieditorial Mudanças Posturais e suas Influencias no Comportamento Funcional de Grandes Artérias Postural Changes and their Influence on Functional Behavior of the Great Arteries Luiz Aparecido Bortolott o Unidade Clínica de Hipertensão do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP – Brasil Minieditorial referente ao artigo: Gravidade Influencia o Comportamento Funcional das Grandes Artérias Durante a Ortostase Correspondência: Luiz Aparecido Bortolotto • Universidade de São Paulo Instituto do Coração - Unidade de Hipertensão Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 44. CEP 05403-000, São Paulo, SP – Brasil E-mail: hipluiz@incor.usp.br Palavras-chave Aorta/fisiopatologia; Hipertensão; Hipertrofia Ventricular Esquerda; Fluxo Sanguíneo; Análise de Onda de Pulso; Posição Ortostática; Gravitação; Envelhecimento. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20190691- As grandes artérias, sobretudo a aorta, temreconhecidamente um grande papel na condução do fluxo sanguíneo tanto durante a ejeção ventricular quanto durante a diástole, permitindo suprir a demanda exigida pelos órgãos. Além disso, a função de amortecimento exercida pela aorta tem papel fundamental na hermodinâmica central, proporcionando um acoplamento ventrículo-arterial adequado durante o ciclo cardíaco. 1 A perda desta função por aumento da rigidez arterial tem participação no desenvolvimento de hipertensão arterial e hipertrofia ventricular esquerda, e tem sido associada ao desenvolvimento de aterosclerose e isquemia miocárdica. 2 Métodos não invasivos de avaliação da função de grandes artérias, como a medida da velocidade de onda de pulso (VOP), tem permitido o melhor entendimento das correlações da rigidez arterial com as doenças cardiovasculares, e têm sido usados como marcadores prognósticos em diferentes populações. 3 No entanto, por limitações metodológicas, todos os estudos têm sido realizados na posição supina, e não se avaliou o impacto das mudanças de postura, sobretudo da ortostase, sobre estas propriedades vasculares. Assim, o estudo de Elias Neto et al., 4 publicado nesta edição, por ser o primeiro a avaliar o efeito da ortostase sobre as propriedades funcionais da aorta em indivíduos normotensos e hipertensos não tratados pela medida da VOP aórtica em humanos, traz importantes informações para o entendimento do papel destas propriedades na adaptação fisiológica da hemodinâmica central frente às ações da gravidade. Os autores avaliaram quase 100 indivíduos sem doenças cardiovasculares evidentes pela medida da VOP carótido-femural realizada na posição supina e na posição ortostática após o teste de inclinação a 70 o , e demonstraram um aumento significativo e sustentado da VOP durante todo o teste de inclinação, tanto em indivíduos jovens quanto em indivíduos mais idosos. Um dado interessante é que, embora houvesse uma relação direta e significativa entre os valores de VOP basais e após ortostase com a pressão arterial sistólica (PAS), a PAS manteve-se inalterada ou teve um ligeiro decréscimo durante a inclinação, e portanto o aumento da VOP durante a inclinação ocorreu por outros mecanismos de adaptação circulatória, incluindo um aumento da resistência arterial periférica (sugerido indiretamente pelo aumento da PA média observada) e de alterações da dinâmica circulatória promovidas pela força gravitacional, que estão relacionadas às características estruturais e geométricas diferenciais da aorta durante todo seu trajeto. Em um estudo com número menor de indivíduos e outra metodologia para avaliação da VOP, os autores também evidenciaram aumento da VOP com inclinação, e atribuíram este aumento à uma elevação da pressão hidrostática e maior atividade simpática. 5 Pela ação gravitacional o fluxo sanguíneo aumenta nos segmentos arteriais mais distais que possuem raios menores e menor elasticidade, ocasionando aumento da VOP e também da PA nos territórios infradiafragmáticos. 6 A consequência deste aumento na VOP carótido-femural seria a precocidade do retorno da onda retrógrada ao coração, aumentando a pressão de pulso na raiz da aorta, o que poderia contribuir para manter um fluxo sanguíneo cerebral mais adequado com a posição bípede assumida pelos humanos. É interessante observar que este mesmo mecanismo de precocidade da onda refletida na raiz de aorta é um dos principais responsáveis pelo aumento da PAS do indivíduo idoso, em consequência do aumento da rigidez arterial observado com o envelhecimento. 7 Avaliando os resultados do estudo de Elias Neto et al., a VOP dos indivíduos jovens após ortostase teve valores semelhantes aos encontrados nos idosos em posição dorsal, corroborando o papel da VOP aumentada com aumento da onda retrógrada na adaptação do indivíduo à posição ortostática. Entretanto, ainda é preciso reconhecer qual o papel deste fenômeno adaptativo circulatório à posição ortostática no desenvolvimento de patologias cardiovasculares como a hipertensão arterial e aterosclerose. Poderíamos especular, por exemplo, se uma resposta exacerbada deste mecanismo adaptativo, com aumento exagerado da VOP pela ortostase, poderia participar do mecanismo de hipertensão arterial em algumas situações como a hipertensão sistólica espúria isolada do jovem, explicada parcialmente pelo aumento do fenômeno de amplificação da onda de pulso entre a aorta e a artéria braquial. 8 Recentemente, alguns estudos têm avaliado a influência da gravidade na rigidez arterial e o papel destas alterações na adaptação ortostática à ausência da gravidade. 9.10 Em um destes estudos, os autores demonstraram que astronautas que foram mais tolerantes ao ortostatismo após um periodo prolongado no espaço apresentaram aumento da rigidez 1082

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