ABC | Volume 113, Nº6, Dezembro 2019

Artigo Original Elias Neto et al. Comportamento das grandes artérias durante a ortostase Arq Bras Cardiol. 2019; 113(6):1072-1081 Por outro lado, durante o teste de inclinação, observou-se correlação negativa entre a VOPp e a FC (Figura 2D). A frequência cardíaca representou aproximadamente 13% da variação da VOP durante o teste de inclinação (r 2  = 0,136, p < 0,001), sendo que essa influência continuou sendo observada mesmo após a VOP ter sido ajustada para idade (r 2  = 0,154, p < 0,001). A diminuição da frequência cardíaca na posição ortostática se mostrou significativamente condicionada ao aumento da idade dos participantes (r 2  = 0,27, p < 0,001). Por fim, avaliou-se a correlação entre o comportamento da FC na posição ortostática e os parâmetros hemodinâmicos no início do estudo. Observou-se correlação negativa com a medida da VOP basal (r = –0,30, p < 0,01). Discussão O principal novo achado deste estudo foi o aumento instantâneo e significativo da VOP na posição ortostática (Tabela 3). Esse padrão de comportamento funcional vascular esteve presente em todos os indivíduos estudados independentemente da idade, resultando em níveis de VOP em indivíduos jovens durante o teste de inclinação semelhantes aos dos idosos em decúbito dorsal. Como observado neste estudo, embora a PAS seja uma das variáveis mais importantes responsáveis pelo aumento direto na VOP, tanto no início quanto na posição ortostática (Tabela 4), nenhum aumento adicional na PAS foi detectado durante o teste de inclinação em comparação com seus níveis basais (PAS basal: 130 ± 18 mmHg, PASp: 128 ± 15 mmHg, NS). De fato, observou-se uma tendência decrescente na posição ortostática. Esse achado está de acordo com dados encontrados na literatura, que também evidenciaram ausência de aumento estatisticamente significativo ou mesmo tendência decrescente na PAS na posição ortostática. 14 Outro aspecto importante é que, embora este estudo não tenha avaliado diretamente a atividade vasomotora, o fato de ter encontrado um aumento na PAM (PAM basal: 99 ± 15, PAMp: 103 ± 11, p < 0,05) significa que houve provavelmente um aumento na resistência vascular periférica devido à ativação simpática reflexa induzida pela queda na pressão de pulso na posição ortostática. Assim, embora uma VOP variável possa ser fortemente influenciada pela PAM, a elevação na VOP pode ser atribuída tanto aos distúrbios circulatórios secundários devido ao estresse gravitacional quanto ao aumento da resistência vascular periférica, e não ao efeito da PAM elevada. Sabe-se que a transmissão da onda de pulso depende principalmente da elasticidade arterial ou do coeficiente de rigidez. No entanto, outros fatores devem ser considerados. Alguns desses fatores estão relacionados à fisiologia cardiovascular, enquanto outros resultam de condições fisiopatológicas específicas. 15 Analisando-se a correlação entre a VOP basal e a VOPp, observou-se influência direta do padrão basal de complacência arterial na resposta das grandes artérias à posição ortostática (Figura 2). Como não foi observado aumento significativo da PAS na posição ortostática, o aumento da VOP pode ter resultado de distúrbios da dinâmica circulatória decorrentes da força gravitacional, associados a características estruturais e geométricas da aorta. Essa hipótese se baseia na fórmula de Moens-Korteweg e no conhecimento de que a VOP depende do raio e da espessura vascular, bem como do módulo elástico vascular. A medição da VOP durante o teste de inclinação expõe os segmentos arteriais ao estresse gravitacional de forma distinta, imitando, até certo ponto, o que ocorre durante a posição ortostática ativa. De fato, a consequência imediata da ortostase é que a gravidade favorece um aumento progressivo da pressão arterial nos segmentos abaixodonível cardíaconaposiçãoortostática. 8,16–18 A pressão hidrostática gerada pela força gravitacional altera o ponto hidrostático indiferente, definido como a referência axial na qual a pressão da coluna sanguínea venosa não é alterada pela reorientação postural. Tal ponto está localizado no nível atrial direito em decúbito dorsal e no território aórtico infradiafragmático em posição ortostática. Devido a isso, ocorre um aumento do fluxo sanguíneo para os segmentos arteriais com maior módulo elástico e menor raio, evidenciando o aumento da VOP carotídea-femoral medida. 11,16 Esse aumento na VOP responde pelo retorno precoce das ondas refletidas das regiões periféricas à aorta ascendente. Essa onda, refletida anteriormente (durante o período de ejeção ventricular), se soma à onda incidente gerada pela ejeção ventricular esquerda e influencia o contorno das ondas de pressão e fluxo. 10 Em outras palavras, o retorno anterior do componente refletido, ocorrendo durante o componente sistólico da onda de pulso, leva a um aumento na pressão de pulso. 19–20 Esse aumento, proporcionado pela onda refletida na porção inicial da onda de pulso arterial, pode resultar de um processo complexo evolutivo funcional de adaptação anatômico-humoral do sistema vascular, para manter um fluxo sanguíneo cerebral efetivo em resposta ao bipedismo (Figura 3). 21 O aumento observado na VOPp também pode ser atribuído ao surgimento de novos locais de reflexão do pulso na circulação periférica devido a um possível aumento da resistência vascular periférica em resposta à posição ortostática. Houve relatos de resposta fásica da hemodinâmica central ao estresse gravitacional em estudos experimentais com babuínos. Nesses animais, o pico sistólico posterior resultante do componente refletido da onda de pulso não ocorre imediatamente após a mudança para a posição ortostática. Portanto, a onda refletida aparece mais tarde na diástole, sugerindo uma diminuição na VOP. Então, a fase denominada compensatória ocorre durante a resposta ao barorreflexo. 12,22 O papel desempenhado pela reflexão das ondas na homeostase circulatória na posição ortostática é reforçado pela observação de que a nitroglicerina, utilizada sublingualmente para sensibilização ao teste de inclinação, causa vasodilatação periférica, levando a um retardo no componente refletido da onda de pulso e consequente redução da pressão sistólica proximal, culminando em sintomas de baixo fluxo sanguíneo cerebral em pacientes com síncope neuromediada. 23–24 1077

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