ABC | Volume 113, Nº5, Novembro 2019

Artigo Original Congo et al. Fibrilação auricular de novo no IAMSST Arq Bras Cardiol. 2019; 113(5):948-957 Introdução A fibrilação atrial (FA) é a arritmiamais comumente encontrada e muitas vezes complica o infarto agudo do miocárdio (IAM) com fibrilação atrial de novo de 6–21%. 1 Neste contexto clínica, a ocorr ncia de FA é significativa, tendo em vista que frequ ncias ventriculares rápidas e irregulares podemprejudicar ainda mais a circulação coronariana. A etiologia da FA, nesse contexto, assim como em doenças críticas, é provavelmente multifatorial e inclui isquemia, perfusão atrial reduzida, vias glicolíticas anaeróbias, inflamação, fatores neuro-humorais, anormalidades na regulação auton mica, pressão ventricular esquerda diastólica final elevada e pressão atrial elevada. 2-4 A maior parte das evid ncias demonstra que a FA em pacientes hospitalizados por IAM representa um desafio importante, no que diz respeito ao papel dos fármacos antiarrítmicos e do tratamento antitrombótico. 1,2 O desenvolvimento de FA está ligado a pior prognóstico e impacto adverso na mortalidade intra-hospitalar e a longo prazo. 5,6 Esse fato parece se aplicar também à FA transitória, que se reverteu para ritmo sinusal no momento da alta hospitalar. Com os avanços nas estratégias de reperfusão e tratamentos atuais com inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA), estatinas e terapia antiplaquetária, pode-se prever que haveria uma mudança na incid ncia e no impacto prognóstico da FA no cenário de IAM. 2 O objetivo deste estudo foi determinar a incid ncia de FA em pacientes hospitalizados por infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMcSST), identificar preditores do desenvolvimento de FA e analisar seu impacto na terapia e mortalidade intra-hospitalar, no contexto de IAM administrado de acordo com as estratégias das diretrizes mais recentes. Métodos Realizamos um estudo de coorte retrospectivo multic ntrico e identificamos todas as internações hospitalares no período de outubro de 2010 a agosto de 2017 com diagnóstico inicial, na alta hospitalar, de IAMcSST, incluídas consecutivamente em um registro nacional multic ntrico portugu s sobre Síndromes Coronarianas Agudas (ProACS). O registro portugu s conta com 25 departamentos de cardiologia, tendo recebido a aprovação e autorização do Comit Nacional de Proteção de Dados (número de autorização 3140/2010), e está registrado no site ClinicalTrials. gov com o número de identificação NCT 01642329. Utilizamos a terceira definição universal de IAMcSST como um novo supradesnivelamento do segmento ST no ponto J ≥ 0,1 mV em duas derivações contíguas ou novo bloqueio completo do ramo esquerdo, por mais de 30 minutos, em um cenário clínico compatível com isquemia miocárdica aguda. A FA de novo foi definida como a primeira ocorr ncia de FA no momento do infarto do miocárdio (IM) ou em qualquer momento após o início do IM, na aus ncia de diagnóstico prévio. Dividimos os pacientes em 2 grupos: Grupo 1 – Pacientes que não desenvolveram FA durante a internação hospitalar por IAMcSST e Grupo 2 – Pacientes com FA de novo durante internação hospitalar por IAMcSST. Foram excluídos pacientes comdiagnósticopréviode FAou terapia prévia de anticoagulação. Em cada paciente, foram coletadas as características clínicas basais, incluindo dados demográficos e histórico do paciente (comorbidades cardiovasculares e não cardiovasculares). Foram analisados os dados relacionados à angiografia coronariana, intervenção coronariana percutânea (número de vasos afetados e número de vasos tratados), função ventricular esquerda (avaliada por ecocardiografia, ressonância magnética, tomografia computadorizada, angiografia ou cintilografia) e terapia medicamentosa intra-hospitalar e pós-alta. As variáveis de desfecho estudadas foram mortalidade e complicações intra-hospitalares, a saber: insufici ncia cardíaca, choque cardiog nico, acidente vascular cerebral, hemorragia importante, bloqueio atrioventricular (AV), taquicardia ventricular, parada cardíaca, complicações mecânicas do IAM e necessidade de ventilação mecânica invasiva, cateter de Swan-Ganz, estimulação cardíaca intravenosa, balão intra‑aórtico ou dispositivo de assist ncia ventricular. Comparamos os desfechos definidos em ambos os grupos e realizamos análise de dados multivariada para avaliar os preditores independentes para FA de novo e o impacto da FA de novo na mortalidade intra-hospitalar. O protocolo de estudo está de acordo com a Declaração de Helsinki. Análise de dados As variáveis categóricas foram caracterizadas por frequ ncias absolutas e relativas e as variáveis numéricas por médias e desvios padrão para distribuições simétricas; para distribuições assimétricas, foram usados medianas e intervalos interquartis. Verificou-se a normalidade dos dados através do teste de Kolmogorov-Smirnov. Foram feitas comparações entre os grupos no que diz respeito às variáveis categóricas, utilizando o teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher. Para as variáveis contínuas, utilizamos os testes t não pareados para comparar as médias, quando possível. Do contrário, utilizou-se o teste U de Mann-Whitney para comparar as medianas. Os preditores foram determinados ajustando-se o modelo de regressão logística. As variáveis foram selecionadas para serem incluídas no modelo usando o método stepwise forward , juntamente com o teste da razão de verossimilhança. Para cada variável incluída no modelo de regressão, também foram estimados o intervalo de confiança de 95% (IC95%) e a odds ratio ajustada. A qualidade do ajuste dos modelos foi avaliada determinando a área sob a curva Receiver Operating Characteristic (ROC) e sua sensibilidade e especificidade. Obteve-se uma estimativa de Kaplan-Meier para o tempo até o óbito. Realizou-se a comparação de duas funções de sobrevida pelo teste de log-rank. As análises estatísticas foram feitas no software SPSS 19.0 ® a um nível de significância de 5% para teste de hipóteses. Resultados Identificou-se um total de 6.957 pacientes com diagnóstico primário de infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST. Foram excluídos 632 pacientes devido ao diagnóstico prévio de FA, terapia prévia de anticoagulação ou informações faltantes. No total, 6.325 pacientes foram 949

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