ABC | Volume 113, Nº5, Novembro 2019

Artigo Original Muniz et al. Distúrbios metabólicos em um modelo de dislipidemia modificada Arq Bras Cardiol. 2019; 113(5):896-902 Introdução A preval ncia mundial de doenças metabólicas e complicações de saúde associadas aumentou nas últimas décadas. Excesso de gordura corporal, resist ncia à insulina, doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) e dislipidemia levam a distúrbios metabólicos relacionados ao maior risco de desenvolver doenças cardiovasculares. 1 A DHGNA varia desde um pequeno acúmulo de gordura no hepatócito até estágios mais graves de necrose inflamatória, com ou sem fibrose. Estudos indicam uma associação entre DHGNA e resist ncia à insulina, inflamação de hepatócitos e comprometimento do metabolismo lipídico, 2,3 já que a maioria dos pacientes com DHGNA apresenta dislipidemia. 4 A dislipidemia é caracterizada por níveis aumentados de triacilglicerol (TG) e colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL-c), e diminuição do colesterol de lipoproteína de alta densidade (HDL-c). 5 Hipercolesterolemia (aumento isolado do LDL-c) e hipertrigliceridemia (aumento isolado do TG) são as formas mais comuns de dislipidemia. 6 Em geral, o desequilíbrio do metabolismo lipídico resulta da interação entre fatores genéticos e ambientais, como hábitos alimentares, especialmente o consumo de lipídios. Portanto, o conteúdo lipídico da dieta tem sido investigado como um fator chave na prevenção de doenças cardiovasculares e hepáticas. 7 Estudos experimentais com dietas hiperlipídicas usaram teores muito altos de gordura dietética (cerca de 50% da composição da dieta), em protocolos de curto período (quatro semanas), sem constatar um comprometimento lipídico sérico. 8,9 Por outro lado, estudos testando concentrações lipídicas mais próximas do consumo humano t m sido realizados durante um período experimental relativamente longo, como em relatos anteriores com ratos (21% de gordura por 9 semanas) 10 e com camundongos (15% a 20% de gordura durante 12 a 16 semanas). 11,12 Nesse contexto, este estudo teve por objetivo avaliar os efeitos metabólicos de uma dieta rica em banha suplementada com colesterol ou não, num modelo modificado de dislipidemia, com tempo de experimentação e concentração lipídica da dieta menores em relação aos relatos anteriores. Métodos Animais, dietas e desenho experimental O experimento foi conduzido com ratos Wistar machos adultos fornecidos pela Universidade de São Paulo (Ribeirão Preto, Brasil). Os ratos foram mantidos em gaiolas plásticas (2 animais/gaiola) por sete semanas (uma semana de aclimatação e seis semanas de ensaio), sob condições ambientais controladas (ciclo claro-escuro de 12 h e temperatura de 22 ± 2°C). No experimento, dividimos aleatoriamente 24 ratos em 3 grupos de 8 animais, de acordo com um delineamento de blocos casualizados, com base no peso corporal. O tamanho da amostra foi definido com base em estudos prévios sobre dislipidemia experimental. Cada grupo recebeu uma das seguintes dietas: dieta padrão (DP; RH19521, Rhoster, Brasil) preparada de acordo com AIN-93M, 13 uma dieta rica em banha (DRB; RH195143, Rhoster, Brasil), e dieta rica em banha e colesterol (DRB/RC; RH195142, Rhoster, Brasil). Óleo de soja e banha foram utilizados como fontes lipídicas; colesterol, para induzir hipercolesterolemia; e ácido cólico, para aumentar o efeito hipercolesterol mico do colesterol suplementado 14 (Tabela 1). As dietas e água filtrada foram fornecidas ad libitum . A ingestão dietética e o peso corporal dos animais foram monitorados tr s vezes por semana. Após seis semanas de experimentação, os animais foram eutanasiados (xilazina + cetamina /10 mg/kg + 100 mg/kg). Em seguida, coletamos amostras de sangue por punção abdominal (cerca de 5 mL) para análises bioquímicas (perfil lipídico sérico e enzimas hepáticas). Após a eutanásia por exsanguinação da aorta abdominal, extraímos, pesamos e preparamos o fígado dos animais para avaliação morfológica. Todos os procedimentos estavam de acordo com o Guia para o Cuidado e Uso de Animais de Laboratório 15 e foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade Federal de Goiás (protocolo número 039/15). Análises bioquímicas Amostras de sangue foram coletadas em tubos de heparina e centrifugadas a 4.000 rpm por 10 min para separar o soro, que foi imediatamente armazenado a -80°C para as análises de perfil lipídico e enzimas hepáticas. Os níveis de colesterol total (CT), TG, LDL-c, HDL-c, alanina aminotransferase (ALT) e aspartato aminotransferase (AST) foram determinados por kits comercialmente disponíveis (Labtest Diagnóstica SA, Lagoa Santa, Brasil). O colesterol da lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL-c) foi estimado pela equação de Friedewald. A fração não-HDL-c foi obtida pela diferença entre os níveis de CT e HDL-c. A importância da fração não-HDL-c tem sido destacada na predição do risco de doença cardiovascular. Boekholdt et al. 16 revelaram que as concentrações de não‑HDL-c tiveram uma associação direta mais forte com o risco de DCV que o LDL-c e a apolipoproteína B (Apo B). Avaliação morfológica do fígado Os lóbulos do fígado foram lavados em solução fisiológica gelada a 0,9% e fixados por imersão em formalina a 10% tamponada com fosfato por 24 h. Posteriormente, os lobos foram cortados em fragmentos de 4 a 5 mm de espessura, desidratados em concentrações crescentes de álcool (80%, 95% e 100%), clarificados em xilol (3 banhos de 30 min cada) e embebidos em parafina. Secções seriadas de 5 µm de espessura foram obtidas e coradas com hematoxilina e eosina (HE). Usamos as secções coradas com HE para analisar as alterações no arranjo do par nquima hepático e a presença de infiltrados inflamatórios com um Leica Las V4 Software ( Leica Imaging Systems Ltd ., Cambridge, Reino Unido), um microscópio Leica DM2000 ( Leica Microsystems Wetzlar GmbH , Wetzlar, Suíça), uma câmera de vídeo Leica DC230 ( Leica Microsystems AG, Heerbrugg, Suíça) e um computador com internet. Vinte campos de par nquima hepático de cada animal foram selecionados aleatoriamente e analisados, com aumentos de 100x e 400x. 897

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