ABC | Volume 113, Nº4, Outubro 2019

Minieditorial Determinantes Sociais na Hipertensão Arterial Social Determinants of Hypertension José Geraldo Mill 1,2 Departamento de Ciências Fisiológicas do Centro de Ciências da Saúde - Universidade Federal do Espírito Santo, 1 Vitória, ES – Brasil Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes - Universidade Federal do Espírito Santo, 2 Vitória, ES – Brasil Minieditorial referente ao artigo: Prevalência e Fatores Associados à Hipertensão Arterial Sistêmica em Adultos do Sertão de Pernambuco, Brasil Correspondência: José Geraldo Mill • Departamento de Ciências Fisiológicas da UFES - Avenida Marechal Campos, 1468. CEP 29042-770, Vitória, ES – Brasil E-mail: jose.mill@ufes.br Palavras-chave Hipertensão; Hipertensão/prevenção e controle; Prevalência; Fatores de Risco; Obesidade; Diabetes Mellitus; Epidemiologia. DOI: 10.5935/abc.20190220 A hipertensão arterial (HA) é uma doença com prevalência elevada em adultos e geralmente referida como ‘doença complexa’ e este termo temsido usado para indicar a diversidade de fatores que contribuem para o seu aparecimento. 1,2 Estudos em populações, gêmeos e famílias estimam que o impacto da carga genética no aparecimento da hipertensão seja de 34% a 64%. 3 Entretanto, a regulação da pressão depende de uma multiplicidade de órgãos, sistemas e mecanismos, razão pela qual um grande número de genes interfere nos valores individuais. Em consequência, os testes genéticos ainda são pouco efetivos como preditores de hipertensão, pois a herança monogênica desta doença é rara. 4 Os fatores não genéticos também são vários e ligados ao estilo de vida (nutrição, atividade física, consumo de álcool, tabaco, dentre outros) ou à presença de condições que cursam com estado inflamatório crônico, como a obesidade e resistência à insulina. Na presença destes fatores, a elevação da pressão arterial se acentua com a idade fazendo com que, em determinado momento, os níveis pressóricos sejam compatíveis com a presença da doença. Importante destacar que os pontos de corte que separam os estados de ‘normotensão’ e ‘hipertensão’ são estatísticos , sendo adequados para uso em populações, podendo ser inadequados na avaliação individual, 5 pois a doença pode estar presente em estado subclínico, ou seja, mesmo antes de atingir níveis pressóricos de diagnóstico obtidos em estudos epidemiológicos. Portanto, dada a dificuldade do uso de dados genéticos, a prevenção da doença deve ser feita pela identificação dos fatores de risco que contribuem para elevar a pressão arterial. Neste contexto, o conhecimento epidemiológico empopulações específicas constitui ferramenta essencial para enfrentamento da doença. Apesar de seu alto impacto na morbimortalidade e nos custos econômicos e sociais, a epidemiologia da HA e dos seus determinantes ainda são pouco conhecidos na população brasileira. Somente em anos recentes foi conduzido um estudo robusto e de abrangência nacional nessa área. A grande extensão territorial e a diversidade racial e cultural da população brasileira demandam também estudos regionais. A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) realizada em 2013 pelo Ministério da Saúde com apoio do IBGE em amostra representativa e robusta (N > 60 mil) da população brasileira adulta mostrou prevalência auto-referida de HA de 21,4%, mais frequente em mulheres (24,2%) do que em homens (18,3%). Ao mudar o critério de diagnóstico, considerando portador de HA os indivíduos que apresentaram pressão arterial aferida no domicílio ≥140/90 mmHg, ou em uso de anti-hipertensivos, a prevalência subiu para 32,3%, commaior prevalência em homens. 6 O estudo mostrou ainda diferenças entre as regiões, observando-se menores prevalências no Norte e Nordeste e maiores no Sul e Sudeste. A doença também foi menos frequente em moradores de zonas rurais. Parte das diferenças regionais podem decorrer das diferentes composições de raça/cor. Indígenas têm, aparentemente, valores mais baixos de pressão 7 e isso pode se traduzir em menor impacto da doença empopulações commaior presença do traço indígena, como na região Norte. Diferenças regionais também podem decorrer da distribuição não uniforme dos fatores gerais que interferem na regulação da pressão arterial, como o alto consumo de sal, o acúmulo de gordura corporal, o sedentarismo, o consumo abusivo de álcool e a resistência à insulina. A grande extensão territorial e a diversidade cultural podem contribuir para a distribuição não uniforme destes fatores e, consequentemente, a variabilidade na distribuição da HA e de outras doenças crônicas. Mais recentemente vem sendo dada importância crescente ao papel de variáveis socioeconômicas no aparecimento, progressão e desfechos relacionados à pressão arterial. Estudos de grande porte, como o Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA‑Brasil), evidenciam o impacto da baixa escolaridade e renda no aumento da pressão e na prevalência da doença. 8 Esses dados indicam que o segmento populacional do Brasil que vive em condições mais desfavoráveis está mais sujeito ao impacto da doença. E isso tem consequências importantes para o equacionamento deste problema de saúde. Neste número dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia , Santiago et al. 8 publicam dados relativos a estudo de base populacional visando identificar as características e prevalência da HA na população adulta (20 a 59 anos) residente no semiárido de Pernambuco, na região Nordeste do Brasil. 8 Para tanto, foi selecionada aleatoriamente uma amostra representativa de domicílios urbanos e rurais por sorteio de setores censitários de três municípios. A pesquisa mostrou que a prevalência global de HA foi de 27,4%, com predominância no sexo masculino. Apesar de não haver poder estatístico para análises mais detalhadas de subgrupos, fica visível nos dados que a doença atinge, commaior impacto, os segmentos 696

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