ABC | Volume 113, Nº3, Setembro 2019

Artigo Original Dracoulakis et al. Alta atividade plaquetária em uso de AAS na SCA Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):357-363 Introdução O ácido acetilsalicílico (AAS) é amplamente utilizado como tratamento antiplaquetário de primeira linha para as síndromes coronarianas agudas (SCA), sendo recomendado pelas diretrizes da American Heart Association e American College of Cardiology, 1 European Society of Cardiology 2 e Sociedade Brasileira de Cardiologia 3 para pacientes com SCA sem supradesnível do segmento ST (SCASSST). O AAS foi testado com eficácia comprovada em vários ensaios clínicos randomizados em todo o espectro da doença arterial coronariana, tanto aguda quanto crônica. 4-7 No entanto, alguns estudos têm demonstrado alta variabilidade na resposta antiplaquetária individual ao AAS em diferentes populações e cenários. 8 Esta variabilidade pode contribuir, pelo menos em parte, para a elevada taxa de recorrência de eventos isquêmicos em pacientes com doença arterial coronariana. 9,10 A prevalência de alta atividade plaquetária (AAP) em pacientes utilizando AAS depende, entre outros fatores, do teste laboratorial e do ponto de corte utilizados, e tambémdo cenário clínico. Nos portadores de doença arterial crônica a prevalência varia de 0 a 57% (24%, emmédia). 10-13 Mais importante tem sido descrito que os pacientes portadores de AAP têm pior evolução clínica, com maior incidência de eventos cardiovasculares graves, incluindo mortalidade. 10,11,14 Nas SCA, a prevalência estimada de AAP é supostamente maior. 15 Estudos prévios sugerem que a carga aterosclerótica e a inflamação sistêmica podem ter influência importante na reatividade plaquetária. 16,17 No entanto, não está claro se esta alta prevalência de AAP é um fenômeno transitório da fase aguda ou uma característica permanente dessa população de alto risco, já que nenhum estudo de nosso conhecimento analisou a resposta ao AAS durante as fases aguda e crônica em uma mesma população. O presente estudo foi desenhado para dar uma resposta definitiva sobre essa importante questão. Métodos População do estudo Inclusão prospectiva de 70 pacientes consecutivos admitidos no departamento de emergência (DE) de um hospital terciário de cardiologia com diagnóstico de SCASSST, com avaliação inicial na admissão (fase aguda) e subsequentemente 3 meses após a alta (fase tardia). Os pacientes foram considerados elegíveis para inclusão se ≥ 18 anos de idade, tivessem sido diagnosticados com angina instável ou infarto agudo do miocárdio sem supradesnível do segmento ST nas primeiras 48 horas do início do quadro clínico, e estivessem em uso de 100 mg a 200 mg de AAS por, pelo menos, 7 dias antes do evento. Os principais critérios de exclusão eram uso de outro antiagregante plaquetário além do AAS, uso de anticoagulação oral ou parenteral, realização de intervenção coronariana percutânea (ICP) nos últimos 30 dias ou cirurgia de revascularizaçãomiocárdica nos últimos 90 dias. Outros critérios de exclusão eram hemoglobina < 10 g/dL; plaquetas < 100.000/mm 3 ou > 500.000/mm 3 ; clearance de creatinina < 30 mL/minuto; insuficiência cardíaca descompensada (Killip III ou IV); uso atual de inotrópicos ou vasopressores; e doenças hematológicas ou neoplásicas conhecidas. Modelo Os pacientes foram avaliados em dois momentos diferentes: inicialmente, quando da admissão no DE, antes da administração de qualquer outro tratamento antitrombótico exceto AAS, e 3 meses após a alta hospitalar, quando também deveriam estar em uso de AAS como único antiagregante plaquetário. Em cada avaliação, os pacientes fizeram avaliação e entrevista médica e submeteram-se a coleta sanguínea 1 a 4 horas após o uso do AAS. Adesão ao tratamento com AAS era sistematicamente avaliada na entrevista médica presencial. O estudo está de acordo com a Declaração de Helsinki e foi aprovado pelo Comitê de Ética local, e os pacientes forneceram consentimento informado. Objetivos O objetivo primário do estudo foi comparar a agregação plaquetária, em pacientes com SCASSST, na fase aguda (primeiras 48 horas do quadro clínico) em relação à fase tardia (3 meses após), utilizando quatro métodos diferentes de avaliação da agregação plaquetária: VerifyNow™ aspirin (VFN) (Accumetrics, Inc., San Diego, Califórnia, EUA); agregometria de sangue total (AST) usando ácido araquidônico (AA) (Sigma‑Aldrich, Saint Louis, Missouri, EUA) e colágeno (Chrono‑Log ® ; Chrono-Log Co., Havertown, Pennsylvania, EUA); analisador de função plaquetária PFA-100 ® com o cartucho de colágeno e epinefrina (COL/EPI) (Siemens Healthcare Diagnostics, Newark, Delaware, EUA). Os objetivos secundários foram a correlação entre os quatro testes na fase aguda e a relação entre cada um dos testes com marcadores inflamatórios (proteína C reativa e interleucina-6). Coleta de sangue Todas as coletas sanguíneas foram realizadas por meio de punção venosa de veia antecubital com agulha de calibre 21, entre 10h00 e 13h00. Em até 2 horas da coleta os quatro testes eram realizados. Definição de AAP Os valores de corte utilizados para definição de AAP foram: PFA-100 ® , tempo de fechamento (CT; do inglês, closure time ) < 150 segundos; 18 VFN, aspirin reaction units (ARU) ≥ 550 (de acordo com o fabricante); AST com AA, Ω ≥ 3; 19 AST com colágeno, Ω ≥ 10. 20 Análise estatística O tamanho amostral foi calculado com base no resultado médio esperado do teste de PFA-100 ® de 191 segundos ± 100 21 durante a fase aguda e a estimativa de redução de 25 segundos desse valor na fase crônica. De acordo com o teste de McNemar, com poder de 80% e alfa de 0,05, foram necessários 70 pacientes. As variáveis contínuas foram avaliadas quanto à sua distribuição (gaussiana ou não) pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. 358

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