ABC | Volume 113, Nº3, Setembro 2019

Minieditorial Febre Reumática no Brasil: Que Cor Deve Ser? Rheumatic Fever in Brazil: What Color Should It Be? Chris T. Longenecker 1, 2 University Hospitals Harrington Heart and Vascular Institute, 1 Cleveland, Ohio – EUA Case Western Reserve University School of Medicine, 2 Cleveland, Ohio – EUA Minieditorial referente ao artigo: Febre Reumática: Uma Doença sem Cor Correspondência: Chris T. Longenecker • Case Western Reserve University School of Medicine - 2103 Cornell Rd WRB 4533 Cleveland, Ohio, 44106-4915 – EUA E-mail: cxl473@case.edu Palavras-chave Febre Reumática/economia; Cardiopatia Reumática/ economia; Procedimentos Cirúrgicos Cardiovasculares/ mortalidade; Hospitalização/economia; Antibiótico Profilaxia/ economia; Políticas Públicas de Saúde. DOI: 10.5935/abc.20190178 A febre reumática (FR) e sua sequela valvar, a doença reumática cardíaca (DRC), têm sido um flagelo para a humanidade há muito tempo, e apenas recentemente tem ocorrido um declínio acentuado da FR nos países de alta renda. No entanto, o Estudo de Carga Global de Doenças ( Global Burden of Disease – GBD) estima quemais de 275.000mortes devido àDRC ainda ocorrem a cada ano em todo omundo, especialmente empaíses de baixa e média renda, incluindo o Brasil. 1 Nesta edição da revista, Figueiredo et al. 2 apresentaram uma modelagem ambiciosa da carga da doença e dos custos da FR e DRC no Brasil. Usando dados do Sistema de Informações Hospitalares do Brasil, seus achados centrais são que as taxas de mortalidade por FR e DRC aumentaram em 215% e 42,5%, respectivamente, de 1998 a 2016. Além disso, o custo estimado para procedimentos relacionados ao diagnóstico de FR/DRC, intervenções como a cirurgia valvar, e as hospitalizações por complicações da DRC, como acidente vascular cerebral e endocardite, foram de aproximadamente US$ 27 milhões em 2019. Embora surpreendentes, esses números são – fato admitido pelos próprios autores – provavelmente subestimados. Há várias razões para isso. Primeiro, os autores reconhecem uma estratégia inadequada de notificação e vigilância da doença como possível fonte de erro nas estimativas de mortalidade. Além disso, a análise de custos considerou apenas custos diretos para o sistema médico, o que não inclui os custos indiretos para a macroeconomia com a perda de produtividade. Em comparação com as doenças de idosos (por exemplo, insuficiência cardíaca), esses custos indiretos com a produtividade perdida são mais elevados para doenças como FR e DRC, as quais tiram a vida de crianças e jovens adultos com potencial para uma vida inteira de trabalho produtivo. Além de uma avaliação completa da carga de custos, são necessários estudos para avaliar a relação custo-benefício de intervenções para reduzir a FR/DRC no Brasil. Em geral, as intervenções que melhoram o diagnóstico e o tratamento apropriados das infecções por estreptococos do grupo A (isto é, prevenção primária) e o uso da penicilina benzatina para todos os pacientes com histórico de FR/DRC (isto é, prevenção secundária), têm se mostrado custo-efetivas em diversos contextos, incluindo países de baixa e média renda. 3,4 As premissas utilizadas na modelagem de custo-efetividade devem, no entanto, ser adaptadas ao contexto brasileiro. É possível que algumas inovações brasileiras possam melhorar o custo-efetividade da prevenção de FR/DRC? Um exemplo é o uso da telemedicina para o diagnóstico remoto por ECG e encaminhamentos adequados para o infarto agudo do miocárdio em Minas Gerais. 5 Esse grupo já implementou uma estratégia baseada na telemedicina para triagem ecocardiográfica para DRC através da iniciativa PROVE. 6 Figueiredo et al., 2 incluíram uma discussão cuidadosa e completa dos muitos outros problemas enfrentados pelos países que buscam implementar um programa nacional de controle de FR/DRC. Estes incluem problemas com a cadeia de fornecimento global de penicilina e a difícil tarefa de abordar os determinantes sociais da FR/DRC, como pobreza e superlotação. No entanto, falta à sua discussão mencionar a resolução da Organização Mundial da Saúde sobre FR/DRC publicada em abril de 2018. 7 Esta resolução histórica apela aos Estados Membros de regiões endêmicas para que tomem oito ações específicas: (1) implementar um programa nacional de controle da DRC; (2) melhorar o diagnóstico e o tratamento da faringite por estreptococos do grupo A; (3) implementar programas de monitoramento para prevenção secundária; (4) garantir um suprimento consistente de penicilina benzatina sem custo para os pacientes; (5) educar os profissionais e o público sobre a prevenção de FR/RDC; (6) melhorar o acesso ao atendimento terciário para DRC grave; (7) abordar os determinantes sociais conhecidos da FR/DRC; e (8) desenvolver a colaboração bilateral, regional e multilateral e a mobilização de recursos. A resolução também pede que a Secretaria da OMS lance uma resposta global coordenada à FR/DRC, forneça assistência técnica aos Estados Membros, trabalhe com as indústrias farmacêuticas para garantir uma cadeia de fornecimento segura de penicilina e convença seus acionistas a avançar nas prioridades de pesquisas no desenvolvimento de vacinas, patogênese da doença e formulação de penicilina de ação prolongada. A resolução da OMS representa o surgimento de uma nova onda de entusiasmo pela prevenção da FR/DRC entre clínicos, formadores de políticas e – o mais importante – pessoas afetadas que vivem com a DRC. Agora é o momento de convencer os governos a investir nesta missão. Recursos técnicos estão disponíveis através de organizações como a RHD Action (http://rhdaction.org/) ou Reach (www. rheach.org) para ajudar os Estados Membros na construção de programas abrangentes de controle. 355

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