ABC | Volume 113, Nº3, Setembro 2019

Artigo Original Figueiredo et al. Febre reumática: uma doença sem cor Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):345-354 Tabela 1 – Descrição detalhada dos custos associados com o diagnóstico de Febre Reumática Aguda, bem como os custos dos procedimentos intervencionistas e internações por Doença Reumática Cardíaca no contexto do sistema público de saúde do Brasil (valores estabelecidos para 2016) Diagnóstico e tratamento Procedimentos Custo individual por procedimento (R$) (US$) † Procedimentos necessários para o diagnóstico de FRA* Consulta médica 10,00 3,04 Eletrocardiograma 5,15 1,56 PCR 2,83 0,86 VHS 2,73 0,83 ASO 2,83 0,86 Cultura orofaríngea 5,72 1,74 Ecocardiograma transtorácico 39,64 12,03 Teste rápido de detecção de antígenos para SBHGA 4,33 1,31 Procedimentos intervencionistas na DRC* Reparo de válvula 6.061,70 1.840,33 Substituição de válvula 6.321,74 1.919,28 Substituição de múltiplas válvulas 7.277,56 2.194,28 Valvoplastia mitral percutânea 1.739,19 528,01 Hospitalização devido às consequências da DRC* Acidente vascular cerebral isquêmico 1.635,55 496,55 Insuficiência cardíaca 699,46 212,35 Fibrilação atrial 219,65 66,68 Endocardite infecciosa 880,00 267,68 FRA: febre reumática aguda; DRC: doença reumática cardíaca; PCR: proteína C-reativa; VHS: velocidade de hemossedimentação; ASO: antiestreptolisina O; SBHGA: Streptococcus β-hemolítico do Grupo A. *Dados do Critério de Jones revisado pela AHA. † Os valores em dólares americanos (US$) foram cotados em 8 de fevereiro de 2018. Um Real (R$) brasileiro é equivalente a US$ 0.3036. Fonte: Os autores. Considerando esse cenário hipotético, em que todas as morbidades exigiam pelo menos uma hospitalização e os valores regulares das cirurgias cardíacas, os gastos para o sistema público de saúde brasileiro teriam um custo anual mínimo de R$56.726.131,10 (US$15.981.534,55), conforme mostrado na Figura 4. Tomando como referência as taxas de mortalidade de duas doenças com alta prevalência global, câncer de mama e câncer de próstata, cuja magnitude originou a força-tarefa preventiva estabelecida por campanhas globais (Outubro Rosa e Novembro Azul), a mortalidade por DRC se comporta de maneira semelhante (Figura 5). Nesse sentido, destacamos que as tendências de crescimento da DRC e do CM são significativas; no entanto, não há diferença significativa entre essas tendências, o que é demonstrado pela sobreposição dos intervalos de confiança. Além disso, a tendência do CP não foi estatisticamente significativa (p-valor = 0,334) para comparação de intervalos de confiança. Discussão A doença reumática cardíaca (DRC) é uma das principais doenças não transmissíveis em países de baixa e média renda, e é responsável por até 1,4 milhão de mortes anualmente. Há poucos dados recentes coletados sistematicamente sobre características da doença, tratamentos, complicações e desfechos de longo prazo em pacientes com DRC. 16 Apesar da magnitude do problema, o Brasil não possui um banco de dados específico para essa patologia. Assim, por não termos dados semanais ou mensais, não foi possível avaliar estatisticamente a sazonalidade da doença. Embora esses números possamestar subestimados pela falta de uma estratégia de vigilância em saúde, durante todo o período estudado, observa-se que a cada ano o número de mortes aumenta, em média, 16,94 unidades, obtidas a partir da equação do modelo para a tendência da taxa de mortalidade por DRC (Figura 1C e D). De fato, a FRA e a DRC estão incluídas na lista brasileira de causas de mortes evitáveis para crianças menores de 5 anos e para a faixa etária de 5 a 75 anos. As causas de morte evitáveis ou redutíveis são definidas como aquelas total ou parcialmente evitáveis por ações efetivas dos serviços de saúde, acessíveis em um determinado local e tempo. No presente artigo, essa taxa de mortalidade refere-se à população brasileira em geral, sem distinção de idade, com valores preditivos para 2019 na magnitude de 8,53 para DRC e 2,68 para FRA, maiores que os de 2017 11 (6,70 para DRC e 1,94 para FRA), representando um aumento de 27,3% e 38,1% para as respectivas patologias. A proposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de reduzir a mortalidade por DRC e outras DNTs (doenças não transmissíveis) em 25% até o ano de 2025 requer uma compreensão das características contemporâneas e o uso de intervenções comprovadas em pacientes que vivem em países endêmicos. 19 Levando em conta nossas projeções, esta proposta da OMS se distancia de nossa realidade, o que poderia estar associado ao fato de que tanto a FRA como a DCR são doenças da pobreza. Além disso, apesar da FRA e DRC terem praticamente desaparecido nas partes mais afluentes do mundo, elas continuam sendo uma 348

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