ABC | Volume 113, Nº3, Setembro 2019

Editorial Mesquita e Souza A cardiologia e o cardiologista – ontem, hoje e amanhã Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):335-338 influenciados por Sylvio Carvalhal (São Paulo), professor Luigi Bogliolo (Rio de janeiro e Minas Gerais). Devemos mencionar também o professor Manoel Barreto Neto, de quem tive a honra de ser aluno e receber o profundo aprendizado e a força do método anátomo-clínico, com a integração dos achados apresentados pelo professor Raul Carlos Pareto Junior. Os Arquivos Brasileiros de Cardiologia publicam ainda sua tradicional sessão anátomo-clínica, importante ferramenta na formação dos jovens cardiologistas. Na segunda metade do século XIX, surge a terceira etapa da Cardiologia: a medicina experimental, fonte da genialidade de escritores como Claude Bernard e Carl Ludwig. As escolas alemã e francesa tornaram a medicina experimental uma área independente, e dois investigadores descreveram a Lei de Frank-Starling, a primeira lei do coração. No século XIX, avanços científicos foram provenientes de novas disciplinas, como a microbiologia, imunologia, histologia e bioquímica. Outras ciências serão incorporadas no estudo da Cardiologia, como a física e eletricidade, que irão contribuir para a descoberta de raios-x e o galvanômetro da corda, e viriam a ser futuramente a base da radiologia cardíaca e da eletrocardiografia. No final do século XIX, a combinação dos dados anátomo-clínico e o registro dos achados estetoacústicos pelos métodos gráficos (fonomecanocardiográfico) consolidaram uma nova visão fisiopatológica, e ocorreu uma pormenorizada descrição de um número crescente dos quadros cardiovasculares. É possível afirmarmos que o estudo oficial da cardiologia como ciência e especialidade teve os seus primeiros passos e contribuição vital com os estudos do Dr. Carlos Chagas que identificou a doença de Chagas em 1909, sendo ele o responsável pelas primeiras pesquisas translacionais e publicação do primeiro grande estudo científico de uma doença cardíaca no Brasil. Também foi responsável pela introdução do primeiro eletrocardiograma instalado no laboratório de Manguinhos, contribuição valorosa e inequívoca para a Cardiologia brasileira. 4,5 O desenvolvimento industrial e o movimento migratório da zona rural para a zona urbana, com a criação das metrópoles, no início da década de 1920, levou a uma enorme mudança nos hábitos alimentares e de trabalho da população brasileira, havendo uma popularização das doenças cardíacas na sociedade. 6 No mesmo período, a disseminação do uso do eletrocardiógrafo impulsionou os estudos específicos, levando a uma ramificação da Clínica Médica, que se tornaria uma área de maior interesse a muitos clínicos que começaram a partir em busca de especializações no Brasil e no exterior. Esse movimento ao longo da década de 30 levou ao surgimento da especialidade que surgiu emnossomeio, através do interesse específico deste grupo entusiasmado pelo estudo específico, direcionando os recursos que surgiam para a investigação das doenças cardiovasculares, através da fonomecanografia e da eletrocardiografia. Inicia-se, destemomento, umgrande processo de criação dos cursos anuais de especialização, que se instalaram inicialmente em São Paulo e Rio de Janeiro, antes mesmo da constituição da cátedra e da formação desta sociedade, em 14 de agosto de 1943. O acesso a grandes redes transnacionais e de todo o continente americano beneficiou a investigação, o aprendizado e treinamento ocorridos até o fim da II Guerra Mundial e foram fruto do processo de internacionalização da SBC, quemanteve a possibilidade do intercâmbio entremédicos do Brasil e dos Estados Unidos e a consequente atuação da mesma junto ao American College of Cardiology. 7 A Cardiologia e o cardiologista apresentaram uma profunda transformação no início do século XX com o emprego do eletrocardiograma como pedra angular do raciocínio cardiovascular. Outra importante mudança foi a progressiva perda da relevância da escola francesa para a Cardiologia e o aparecimento da escola norte-americana e mexicana de Cardiologia. O Instituto Nacional de Cardiologia do México, fundado por Ignacio Chaves, em 1944, se tornou um polo de pesquisa e ensino na área de eletrocardiografia e um exemplar centro de formação cardiovascular, atraindo jovens brasileiros, e de outras nacionalidades, para sua residência em cardiologia. Entre os anos 40-70, ele se tornaria um centro de referência mundial e colaboraria com importantes avanços na fisiopatologia das doenças congênitas, hipertensão pulmonar, hemodinâmica e eletrofisiologia. A influência da escola norte‑americana vai se consolidando no período pós‑guerra ao incorporar recursos econômicos, a profissionalizar a pesquisa clínica e a construção de novos centros de cardiologia e permitindo o desenvolvimento do cateterismo cardíaco e da cirurgia de revascularização miocárdica. O grupo de Harvard liderado pelo professor Eugene Braunwald se consolida na descoberta de novos mecanismos de doença e nos estudos multicêntricos terapêuticos. Figura 1 – Diferentes logomarcas da SBC ao longo da sua história. 336

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