ABC | Volume 113, Nº2, Agosto 2019

Artigo Original Saad et al. Utilização de serviços de saúde e custos após ablação para FA Arq Bras Cardiol. 2019; 113(2):252-257 Introdução A fibrilação atrial (FA) é um problema de saúde pública. As estimativas de incidência e prevalência variam em todo o mundo. 1 A incidência de FA aumentará de 1,2 milhão de casos por ano em 2010 para 2,6 milhões de casos em 2030; no mesmo período, a prevalência aumentará de 5,2 milhões para 12,1 milhões. 2 No Brasil, as estimativas são menos claras; um estudo recente mostrou uma prevalência de 1,8% na população em geral. 3 No entanto, considerando o envelhecimento da população em países em rápido desenvolvimento, como o Brasil, esse número provavelmente aumentará em um futuro próximo. 4 A doença está associada a altos gastos com cuidados de saúde. Nos EUA, o custo anual da FA foi estimado em US$26 bilhões, enquanto na Euro Heart Survey o custo anual combinado estimado em 5 países (Grécia, Itália, Holanda, Polônia e Espanha) foi de € 6,2 bilhões. 4 Tais gastos representam um grande ônus econômico: estima-se que a FA contribua com mais de 1% dos custos totais com saúde em projeções feitas em 10 países de alta renda. 5 A carga clínica também é significativa, especialmente relacionada ao acidente vascular cerebral (AVC): cerca de um terço dos pacientes com AVC apresenta FA, o que, por sua vez, aumenta a probabilidade de uma área maior afetada pelo AVC nos exames de imagem cerebral e, portanto, de um pior prognóstico. 6-8 A ablação por cateter é uma opção de tratamento bem estabelecida para a restauração do ritmo sinusal, o que pode aumentar a qualidade de vida e possivelmente levar à economia de gastos com saúde em longo prazo. 9,10 A redução no consumo de recursos e custos já pode ser vista no primeiro ano do procedimento, sendo mantido nos anos seguintes. 11 Mesmo considerando o custo do procedimento, ele pode levar à redução total dos custos de saúde após 2 anos, especialmente em pacientes mais jovens. 12-15 Até o momento, há dados escassos sobre o impacto econômico da ablação por cateter em países de renda média, como o Brasil. O objetivo deste estudo foi comparar os custos médicos e o uso do serviço ambulatorial e hospitalar, antes e após a ablação por cateter, em uma coorte de pacientes brasileiros com FA atendidos no sistema de saúde privado. Métodos Desenho de estudo e conjunto de dados Este foi um estudo de coorte retrospectivo. O conjunto de dados utilizado para as análises foi a informação de reembolso dos pacientes obtidos da Orizon, que contém um registro datado de todos os itens faturados pelo departamento de contabilidade de custos, incluindo medicamentos (somente para uso hospitalar); serviços de laboratório, diagnóstico e serviços terapêuticos; e diagnósticos primários e secundários para a hospitalização de cada paciente. Tanto a utilização de recursos ambulatoriais quanto de internação estão disponíveis no conjunto de dados. Cerca de 12 milhões de pacientes – os quais representam aproximadamente 25% dos pacientes do sistema de saúde privado brasileiro – estão incluídos nos bancos de dados da Orizon de cobrança dos pacientes. Nenhum consentimento informado foi necessário porque todos os dados eram de informações de reembolso dos pacientes e suas informações pessoais eram anônimas. Todos os pacientes adultos (maiores de 18 anos) que sofreram internação hospitalar entre janeiro de 2014 e dezembro de 2015 e foram submetidos à ablação por cateter com um código CID–10 de FA (I48) foram potencialmente elegíveis para a análise atual. Os seguintes critérios de elegibilidade precisavam ser atendidos para a inclusão do paciente na análise atual: • Procedimento eletivo de ablação por radiofrequência, com mapeamento eletrofisiológico tridimensional anterior; • Informações disponíveis sobre idade, sexo e código CID; • Nenhum registro de procedimentos de ablação anteriores no conjunto de dados; • Uso de ablação ponto a ponto (irrigada padrão, irrigada com sensores de força de contato e não irrigada); • Mínimo de 3 meses de seguimento antes e depois do procedimento de ablação. Os resultados foram avaliados tanto na admissão perioperatória quanto em qualquer rehospitalização ocorrida até 2 anos após o procedimento de ablação. Variáveis do estudo As seguintes variáveis ​foram avaliadas para cada paciente: idade, gênero, comorbidades (como cardiopatia isquêmica [CI], insuficiência cardíaca crônica [ICC] e distúrbios de condução, entre outros), complicações perioperatórias, taxa de FA livre de recidiva em curto e longo prazo, eventos cardiovasculares, utilização de recursos de saúde (incluindo atendimento ambulatorial e de emergência) e custos. Detalhes sobre as definições dessas variáveis estão descritos nos próximos parágrafos. As comorbidades foram definidas de acordo com os códigos da CID-10, registrados nas consultas ambulatoriais e de emergência dos pacientes incluídos no banco de dados. A recidiva de FA foi definida quando um novo procedimento de ablação ou de cardioversão foi realizado ou após o reinício do uso de medicamentos antiarrítmicos durante o seguimento, após o período de três meses sem recorrência de FA ( blanking period ). Os eventos cardiovasculares avaliados (tanto no pré como no pós-procedimento) foram: síndromes coronarianas agudas (SCA), AVC e arritmias. A SCA foi definida sempre que um paciente apresentava pedidos de eletrocardiograma mais troponina ou fração MB de creatina quinase (CK-MB), assim como um dos seguintes itens faturados: qualquer procedimento trombolítico, de angioplastia ou uma combinação de medicamentos altamente sugestivos de SCA (como qualquer forma de heparina, drogas antiplaquetárias, nitratos e estatinas). O AVC isquêmico foi definido quando um paciente apresentou solicitação de tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética do cérebro, prescrição de antiagregante plaquetário ou heparina de baixo peso molecular, além da cobrança de exames como ecocardiograma, ultrassonografia com Doppler de carótida 253

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