ABC | Volume 113, Nº2, Agosto 2019

Minieditorial Psoríase e Doença Cardiovascular: Lesão além da Pele Psoriasis and Cardiovascular Disease: Lesion Beyond the Skin Bruno Cesar Bacchiega 1, 2 Hospital de Câncer de Barretos, 1 Barretos, SP – Brasil Santa Casa de Misericórdia de Barretos, 2 Barretos, SP – Brasil Minieditorial referente aoo artigo: Risco Cardiovascular em Pacientes Psoriásicos: Avaliação de Parâmetros Clínicos, Funcionais e Morfológicos Correspondência: Bruno Cesar Bacchiega • Hospital de Câncer de Barretos - Rua Antenor Duarte Vilela, 1331. CEP: 14784-400, Barretos, SP – Brasil E-mail: brunobacchiega@gmail.com Palavras-chave Doenças Cardiovasculares; Aterosclerose; Inflamação; Fatores de Risco; Doença Aterosclerótica Sistêmica; Psoríase. DOI: 10.5935/abc.20190153 Interessante encontrarmos um artigo 1 aparentemente dermatológico em revista cardiológica. Por que ler sobre psoríase? Enfermidade que por muitos colegas, e por vários anos, foi considerada eminentemente cutânea e de curso benigno, principalmente na sua forma em placa. Todavia, estudos epidemiológicos 2,3 e um registro internacional 4 observaram um aumento em torno de 50% no risco de eventos cardiovasculares neste grupo frente à população geral, marcadamente em pacientes mais jovens. 5 Como explicar tudo isso? Inflamação sistêmica parece ser o “elo perdido” entre doença cardiovascular (CV), neoplasias e doenças sistêmicas inflamatórias crônicas (ex, psoríase ou artrite reumatóide). 6 O interesse da cardiologia neste tema interdisciplinar não é novo. Nas últimas duas décadas se consolidou o entendimento da aterosclerose como doença inflamatória sistêmica vascular e que seus mecanismos fisiopatológicos são acelerados por atividade inflamatória sistêmica sustentada. Utilizando a atrite reumatóide como modelo fisiopatológico, Sattar et al . 7 em 2003, sistematizaram o processo de aterosclerose acelerada. A inflamação sistêmica aumentaria a síntese hepática de proteína C reativa (PCR), induziria lipólise com liberação de ácidos graxos livres, intensificaria a resistência insulínica e oxidação de lipoproteínas de baixa densidade (LDL), culminando com disfunção endotelial em conjunto commaior expressão de moléculas de adesão, acelerando a doença aterosclerótica. Em 2011, Boehnck et al. 8 cunharam o termo “ psoriatic march ” para descrever, no modelo fisiopatológico da psoríase, possíveis mecanismos para justificar o aumento dos eventos CV. Como era de se esperar, o esqueleto e as etapas do processo são extremamente assemelhadas ao visto na artrite reumatóide. A inflamação sistêmica sustentada desencadeada pela psoríase elevaria a síntese de PCR, de fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF), p-selectina, resistina e leptina. Tais proteínas estariam envolvidas com o aumento da resistência insulínica, que em última análise intensificaria a disfunção endotelial e estimularia a expressão de moléculas de adesão. Com o reconhecimento destas etapas, fica clara a importância, neste processo fisiopatológico, da fase subclínica da aterosclerose (disfunção endotelial, rigidez vascular e hiperexpressão de moléculas de adesão vascular) e dos biomarcadores (PCR, leptina, resistina). No artigo que ensejou este minieditorial, os autores compararam rigidez arterial por velocidade de onda de pulso (VOP), espessamento médio intimal (EMI) carotídeo, dados para síndrome metabólica e níveis de PCR numa coorte de indivíduos com psoríase e voluntários. Os resultados descritos, com significância estatística, corroboraram com a hipótese de que pacientes com psoríase com atividade de doença intensa teriam mais síndrome metabólica, PCR elevada e indícios de aterosclerose subclínica (EMI e rigidez arterial aumentados) frente ao grupo controle. O desenvolvimento de biomarcadores para auxiliar no diagnóstico, prognóstico e seguimento terapêutico da doença aterosclerótica é uma realidade. No caso da doença arterial coronariana, a PCR está bem estabelecida. Para insuficiência cardíaca, os peptídeos natriuréticos. No caso específico da psoríase e risco de eventos cardiovasculares, diversos biomarcadores foram estudados: PCR, interleucina-6 (IL – 6), leptina e adiponectina. Os resultados foram semelhantes aos da população geral, com aumento do risco CV em vigência de PCR, IL-6 elevadas. A leptina tem achados conflitantes e a adiponectina, por ser uma adipocina com efeitos protetores cardiovasculares, aparece reduzida na maior parte dos estudos. 9 Além destes, uma nova molécula poderá vir a ser um biomarcador protagonista: GlycA. Molécula analisada via espectometria por ressonância nuclear magnética. Este marcador tem correlação com risco de doença arterial coronariana e inflamação vascular. Nos pacientes com psoríase, teve tanto correlação com atividade de doença estimada pelo psoriasis area and severity índex (PASI ) quanto com risco de eventos CV independente dos fatores de risco tradicionais, incluindo a PCR. Ademais, houve redução dos níveis de GlycA e de inflamação vascular nos pacientes submetidos a terapia com drogas anti fator de necrose tumoral alfa (anti-TNF), 10 sugerindo que também tem correlação com resposta clínica terapêutica. Devido à importância do tema, as Sociedades Americana de Dermatologia 11 e a Europeia de Reumatologia 12 já publicaram recomendações sobre como avaliar o risco cardiovascular e fazer as intervenções necessárias para reduzir tais riscos. Dentre os diversos escores para estimar risco cardiovascular existentes, o grupo European League Against Rheumatism (EULAR) optou pelo Systematic Coronary Risk Evaluation ( SCORE), desenhado pela Sociedade Europeia de Cardiologia. Infelizmente nenhum escore ou ferramenta para estimar a probabilidade de eventos consegue determiná-lo de forma segura nestas populações de alto risco (dada pela inflamação sistêmica crônica). Para compensar, a diretriz de dermatologia sugere, nos pacientes psoriásicos com doença 250

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