ABC | Volume 113, Nº2, Agosto 2019

Artigo de Revisão Lamounier Júnior et al. Genética e miocardiopatia dilatada Arq Bras Cardiol. 2019; 113(2):274-281 afetados por vtTTN teriam desfecho mais precoce do que os não portadores, considerando morte por todas as causas, estar em lista de TxC e uso de dispositivo de assistência ventricular. 28 Nessa mesma linha, os portadores do sexo masculino apresentaram uma menor sobrevida (28% dos homens tiveram um evento cardiovascular até os 50 anos de idade vs. 8% das mulheres), considerando os desfechos morte por IC, TxC ou uso de dispositivo de assistência ventricular. 27 Em uma amostra robusta (n = 558) foi evidenciada uma elevada incidência de morte cardiovascular a partir dos 40 anos de idade em pacientes portadores de vtTTN. 29 Nestes pacientes foi maior a ocorrência de eventos cardiovasculares nos homens (1,25% vs. 0,75% ao ano; entre os 40-60 anos), sendo a morte súbita cardíaca o desfecho mais frequente. Por sua vez, diferentes publicações descrevem alta incidência de fibrilação atrial, assim como taquicardia ventricular sustentada e não sustentada, nesses pacientes. 24,25,28,30 Muito embora, segundo a literatura, a presença de vtTTN seja associada a um início precoce de manifestações arrítmicas, ainda não foi possível definir um fenótipo característico para esses pacientes, diferentemente do que ocorre com portadores de outras mutações em genes relacionados à MCD. Mais ainda, tem sido postulado que mutações do tipo vtTTN possam fazer parte de um substrato genético predisponente a diferentes tipos de MCPs (induzida por antraciclinas, periparto e alcoólica). 27-29 Por fim, pacientes comMCD por vtTTN teriamum curso clínico mais favorável e responderiammelhor à terapia medicamentosa quando comparados àqueles afetados por variantes na lamina (gene LMNA ). 31-33 Lamina : Variantes patogênicas no gene LMNA produzem um fenótipo bem caracterizado de MCD associada a transtornos de condução/arritmias malignas, denominado cardiolaminopatias. 34 A expressão fenotípica se dá por distúrbio progressivo da condução atrioventricular, a qual geralmente precede a disfunção ventricular e/ou as arritmias ventriculares, embora possam ser identificadas arritmias ventriculares ou supraventriculares (em especial fibrilação atrial), como primeira manifestação. 19,34 A idade de diagnóstico ocorre, em geral, após os 20 anos de idade com alta penetrância após os 40 anos (> 90%). 35 Uma vez manifestado os primeiros sintomas, as cardiolaminopatias podem evoluir com maior rapidez para estágios avançados de IC quando comparadas a outras etiologias de MCD primária. 19,36 A prevalência de mutações no gene LMNA varia entre 5-10% em coortes de MCDF e em torno de 2-5% em casos esporádicos, perfazendo até 30% dos casos de MCD associada a transtornos de condução/arritmias, sendo muito menos frequente em casos de MCD isolada (não arrítmica). 34,35 Entre 2013 e 2015, Hasselberg et al., 37 identificaram prevalência de mutações no gene LMNA em torno de 6% em uma coorte de 79 jovens noruegueses com MCDF. Nestes, houve necessidade de TxC em uma alta proporção dos portadores (19%). Em outro estudo 122 afetados foram seguidos por 7 anos. Entre eles, 27 evoluíram para MCD terminal ou para óbito. É digno de nota citar que nesta mesma coorte, os portadores assintomáticos apresentaram incidência anual de 9% de um evento cardíaco documentado ao longo de 4 anos de seguimento. 19 Estes dados sugerem um prognóstico bastante desfavorável e de evolução mais célere para TxC/óbito do que em MCD de outras etiologias. Tais características clínicas e epidemiológicas corroboram com as recomendações para que o estudo genético seja realizado em pacientes com MCD não isquêmica, além de se considerar o implante precoce de cardiodesfibrilador (CDI) caso seja identificada uma variante patogênica no gene LMNA (Classe de Recomendação IIa, nível de evidência B). 38 Neste contexto e, com base em um estudo publicado em 2012 que arrolou 269 pacientes com cardiolaminopatia, o risco de eventos será maior quando no momento do diagnóstico o paciente apresenta dois ou mais destes critérios de risco: 1) taquicardia ventricular não sustentada; 2) fração de ejeção do VE < 45%; 3) sexo masculino; 4) variante do tipo truncamento. 39 Desde então, outros autores já propuseram que não apenas as variantes truncadas seriam relevantes, mas também variantes genéticas do tipo missense , as quais também seriam potencialmente malignas. 40 Por fim, ainda não disponível, um escore de risco para pacientes com MCD afetados por variantes na LMNA deverá ser publicado muito em breve. Nesse particular, esperamos que o mesmo aumente a precisão na estratificação de risco destes indivíduos. Outros Genes : Mais frequentemente associadas à miocardiopatia hipertrófica (MCH), algumas mutações sarcoméricas também podem causar MCD. 25 Os genes sarcoméricos da cadeia pesada da beta miosina 7 ( MYH7 ) , troponina T tipo 2 (TNNT2) e tropomiosina 1 ( TPM1 ) são aqueles que apresentam informação prognóstica associada. Dependendo da localização da variante genética no gene MYH7 , a evolução pode ser particularmente grave, de forma similar ao que ocorre nos casos deMCD causadas pela TNNT2. 25 Mutações genéticas observadas na TPM1 causammenos que 1% dos casos de MCD, mas correspondem a parcelas significativas dos casos pediátricos desta doença, nos quais o desfecho rápido para morte ou TxC não é incomum. 25 Uma metanálise composta por quase 8.100 pacientes avaliou a correlação genótipo‑fenótipo na MCD para os genes TTN e LMNA, assim como para proteínas sarcoméricas como a proteína C de ligação à miosina ( MYBPC3), MYH7, TNNT2 , troponina T tipo I3 ( TNNI3), proteína 20 ligada ao RNA (RBM20) e fosfolambano (PLN) . 41 Maior frequência de TxC foi observado em portadores de mutações na LMNA (27%), percentual significativamente maior do que para mutações nos genes RBM20 e MYBPC3 (≈10% cada). Afetados do sexomasculino forampredominantes nos diferentes genes (79% no gene MYBPC3 e 69% nos genes LMNA e MYH7 ), comproporção significativamente menor entre os portadores do gene PLN (46% homens). Mais recentemente, os genes Filamina C ( FLNC ) e Chaperona Reguladora 3 ( BAG3 ) tiveram sua história natural da doença bem caracterizada em publicações de alto impacto. 20,21,42 O primeiro deles apresentou um perfil mais arritmogênico e o segundo um maior número de eventos relacionados à IC. Variantes tipo truncamento na FLNC foram identificadas cosegregando em 28 famílias afetadas com uma forma particular de MCP arritmogênica/dilatada. 20 Os achados clínicos mais prevalentes foram dilatação ventricular (68%), disfunção sistólica (46%) e fibrose miocárdica (67%). Arritmias ventriculares foram documentadas em 82% dos portadores e casos de morte súbita foram relatados em 21 das 28 famílias. Em torno de 95% dos portadores já expressavam o fenótipo 277

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