ABC | Volume 113, Nº1, Julho 2019

Ponto de Vista Telemedicina e a Relação Médico–Paciente Telemedicine and the Doctor/Patient Relationship Protásio Lemos da Lu z Universidade de São Paulo – Hospital das Clinicas Instituto do Coração, São Paulo, SP – Brasil Correspondência: Protásio Lemos da Luz • Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44. CEP 05403-000, 5andar - Bloco II sala 08, São Paulo, SP – Brasil E-mail: protasio.luz@incor.usp.br Artigo recebido em 04/04/2019, revisado em 10/04/2019, aceito em 10/04/2019 Palavras-chave Relações Médico-Paciente; Telemedicina/tendências; Redução dos Custos; Cuidados Médicos; Humanismo; Participação do Paciente. DOI: 10.5935/abc.20190117 Introdução Há 8 anos, A.C, um simpático italiano, recebeu stents coronários. Há mais ou menos 3 meses passou a ter dificuldade respiratória progressiva com sensação de aperto no peito; perda de apetite e emagreceu 4 kg, mas continuou trabalhando com boa disposição. Estivera em duas consultas hospitalares prévias, nas quais foi informado de que o pulmão estava normal, com base na radiografia. Não haviam chegado a diagnóstico definitivo, e por isso veio ao consultório. Sua aparência geral era normal; nada na inspeção denotava anormalidade. Apresentava sinais vitais normais; não tinha palidez que sugerisse anemia. Os exames de pulmões, coração, abdômen emembros inferiores eram normais, bem como o eletrocardiograma (ECG) de repouso. À palpação do pescoço, percebi uma massa na face lateral esquerda. Exames subsequentes comprovaram que se tratava de tumor que comprimia a traqueia, o que explicava sua dificuldade respiratória. Esse é um típico exemplo de caso em que exame clínico completo encaminha o diagnóstico. Isso não seria possível com a telemedicina (TM), pois a simples inspeção não dava pistas, e a história clínica sugeria várias possibilidades, tais como doença cardíaca, pulmonar, descompensação diabética, uremia ou anemia. Atualmente, há um grande debate, tanto no nível de sistema de saúde quanto no plano individual sobre TM. Tecnologias de telecomunicação sãousadas hámuito temponoensino, na ciência, na formaçãode consórcios para estudodedoenças, na transmissão de procedimentos médicos diagnósticos ou terapêuticos, na interpretação de imagem entre especialistas, em teleconferência com eficiência indiscutível, e não serão considerados aqui. Uma curiosidade que merece ser citada é que muitas pessoas chegaram a dizer que com a internet os congressos médicos iriam se esvaziar, porque tudo poderia ser visto à distância – o que não aconteceu, pois os congressos médicos continuam com grande audiência, tanto quanto antes das transmissões online . Isso comprova que o homem é um ser social e que gosta de conviver com o semelhante. Telemedicina e a relação médico-paciente Considera-se TM o atendimento médico não presencial. Um aspecto essencial é que a TM requer estruturas próprias, necessita de uma estação central que possa receber informações e que tenha profissionais médicos preparados para dar respostas; e que médicos e pacientes forneçam dados corretos para avaliação. Os iphones recentes são fundamentais; permitem transmissão de imagens e textos. Outros aparelhos registram ECG, frequência cardíaca e pressão arterial. E se vislumbra o dia que em que parâmetros laboratoriais serão transmitidos online a partir de sensores de pele. Portanto, os sistemas de telecomunicação não são limitação importante para TM. Outro aspecto fundamental é o impacto sobre os sistemas de saúde, compreendendo neste aspecto: eficiência, custos, satisfação e adesão de pacientes e médicos. Como a implementação da TM é relativamente recente, há poucos estudos sobre o tema. Uma revisão Cochrane, 1 que incluiu 93 estudos e 22.047 pacientes analisou 36 estudos de doenças cardiovasculares, 21 de diabetes, 9 de condições respiratórias, 7 de saúde mental, 6 em que um especialista precisava ser consultado, 3 condições urogenitais, 3 com lesões neurológicas e outros menores. Comparando TM com cuidados habituais, eles mostraram que não houve diferença na mortalidade global por insuficiência cardíaca, que admissões hospitalares reduziram em 64% em alguns estudos, e aumentavam 60% em outros. Havia alguma evidência na melhora da qualidade de vida, e no diabetes observou-se hemoglobina glicada mais baixa; também se observavam reduções mais acentuadas de LDL e da pressão arterial. Não houve diferenças entre atendimento presencial e por TM nos casos de saúde mental. Em relação aos custos e aceitação pelos pacientes, os autores observaram que não havia dados suficientes para conclusões. Eles observaram que a eficiência da TM depende de múltiplos fatores, tais como se ela é utilizada para monitorar condições crônicas e pacientes conhecidos ou para facilitar acesso a serviços diagnósticos. Digno de nota é que todos os estudos se referem a monitorização de condições crônicas conhecidas, ofertas de treinamento para reabilitação, educação para vida saudável, consultas com especialistas ou terapia cognitiva; ou seja, eram sempre casos de diagnósticos conhecidos e não avaliações primárias. Outra análise, de Ekeland et al., 2 incluiu 80 estudos e observou que 21 deles consideram TM efetiva, 18 promissoras, mas ainda inconclusiva e os demais tinham evidências limitadas e inconsistentes. Bertoncello et al., 3 analisaram os fatores envolvidos na eficiência da TM segundo relatos de 25 revisões criteriosamente escolhidas, compreendendo 15 anos (2000 a 2015) de observações. Foram incluídos hipertensão, diabetes, asma, doença pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência cardíaca e cuidados de idosos. Essa análise considerou vários fatores que podem influenciar a eficiência da TM, tais como localização geográfica, características demográficas 100

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