ABC | Volume 112, Nº6, Junho 2019

Artigo Original Scheer et al Exercício na escola e fatores de risco cardiovascular Arq Bras Cardiol. 2019; 112(6):775-781 além de diferentes métodos, incluindo as medidas obtidas por aparelhos oscilométricos e aneroides. 15 Quanto às diferenças entre os GEOs e as ERs, Cureau et al., 14 fornecem achados importantes para explicá-los, já que a prevalência de sedentarismo em sua coorte era de aproximadamente 51%. Considerando o risco atribuível ao sedentarismo no desenvolvimento de hipertensão e obesidade, 16-18 parece plausível a hipótese de que as diferenças no estado de saúde entre alunos de GEO e ERs podem ser resultantes da política de AF adotada na GEO. O período de tempo para as mudanças de peso e o controle da PA por meio de intervenções não‑farmacológicas, 19 e a associação entre a política de AF e os fatores de risco cardiovasculares 20,21 podem apoiar essa hipótese. Para o perfil lipídico, a ausência de diferença estatística entre os estudantes das duas escolas não foi um resultado surpreendente, já que a AF sabidamente exerce somente um pequeno efeito sobre os níveis lipídicos. 22 Contudo, a alta prevalência de dislipidemia deve ser investigada. Na amostra total, a prevalência de dislipidemia foi quase duas vezes maior na ER que nos GEOs (38,1% vs . 64,9%). No estudo ERICA, 23 a frequência de indivíduos com hipercolesterolemia e com hipertrigliceridemia foi de 20,1%, e 7,8%, respectivamente, em uma amostra de 38 069 adolescentes com idade entre 12 e 17 anos. Uma possível explicação para a discrepância entre nossos dados e os dados da literatura é a de que a faixa etária de 12‑13 anos corresponde ao período de estirão de crescimento em meninos e meninas, em que ocorrem interações hormonais e biológicas que podem afetar os marcadores biológicos, o que torna difícil sua quantificação. 24 Também é importante destacar a associação entre obesidade e hipertensão. Bloch et al., 12 relataram uma maior prevalência de hipertensão em adolescentes obesos (28,4%) que em adolescentes com sobrepeso (15,4%) e eutróficos (6,3%). A fração de hipertensão atribuível à obesidade foi 17,8%, o que aumenta a hipótese de que cerca de um quinto de pacientes hipertensos não seriam hipertensos se não fossem obesos. Tal fato é importante e poderia ser usado como referência aos tomadores de decisões sobre os potenciais benefícios de se aumentarem intervenções de prática de AF nas escolas, incluindo desfechos intermediários, tal como o controle da hipertensão, a qual é considerada a principal causa de mortalidade cardiovascular na vida adulta. 25 Um dado interessante foi que, apesar de que estudantes de ambos os sexos das ERs eram mais sedentários e hipertensos/ pré-hipertensos, somente as do sexo feminino pareciam se beneficiarem mais do fato de frequentarem os GEOs considerando o controle de peso corporal. Uma possível explicação para esse achado é a de que os meninos são geralmente mais fisicamente ativos que as meninas, e frequentemente mais envolvidos em AF não regular. 26 Em relação à análise de regressão logística binominal exploratória usada em nosso estudo, após ajuste quanto à idade e sexo, os alunos de ERs apresentaram maior chance de apresentarem sobrepeso e pré-hipertensão/hipertensão que os alunos de GEOs, corroborando o racional e os resultados descritos acuma. 19 Na realidade, não foram observadas diferenças entre os grupos quanto à frequência de estudantes com glicemia ou perfil lipídico alterado. Os resultados do International Study of Childhood Obesity, Lifestyle and the Environment (ISCOLE), um amplo estudo transversal multicêntrico, mostrou uma associação positiva entre o comportamento sedentário e a obesidade, mesmo em análise de agrupamento com 6000 estudantes de 12 países, 27 e na avalição daqueles que seguiam as recomendações das diretrizes sobre prática de exercício física nas 24 horas do dia. 28 Em relação à nossa análise de sensibilidade no modelo de regressão logística, é importante destacar que a magnitude da associação entre a política escolar e apresentar sobrepeso aumentou para estudantes do sexo feminino [OR: de 1,49 [1,13–1,98] para 1,89 [1,13–2,75]) e diminuiu nos do sexo masculino [OR: de 1,49 [1,13–1,98] para 1,09 [0,71-1,69]), quando comparada ao modelo todo ajustado. Em relação à associação entre a política da escola e a presença de pré‑hipertensão/hipertensão, a magnitude da associação diminuiu ligeiramente para estudantes do sexo feminino [OR: de 1,86 (1,36–2,54) para 1,66 (1,10–2,51)] e aumentou para estudantes do sexo masculino (OR: de 1,86 [1,36–2,54] para 2,20 [1,37–3,54]), sem diferença no perfil lipídico. 29 Apesar do desequilíbrio entre os sexos, o qual motivou a análise de sensibilidade, deve existir uma explicação para as mudanças na magnitude das estimativas pontuais. Estudos prévios indicam que, em geral, adolescentes do sexo feminino têm maior probabilidade de apresentar sobrepeso que os do sexo masculino, possivelmente por esses serem mais fisicamente ativos e menos sedentários. 30 No entanto, dados do NHANES revelaram que a prevalência dos fatores de risco para DCV e síndrome metabólica era maior em meninos que em meninas, 31 o que está de acordo com a afirmativa que meninos têm mais chance de apresentar pré-hipertensão/ hipertensão que as meninas. 32 Esse fato aparentemente inesperado é corroborado pelo presente estudo. Entre as adolescentes, 606 apresentavam sobrepeso, e 603 tinham o diagnóstico de pré-hipertensão ou hipertensão. Esses números indicam que outros fatores de risco, tais como história familiar, podem estar associadas com PA elevada – uma vez que pelo menos 98 adolescentes do sexo masculino apresentavam essa condução apesar da ausência de sobrepeso. Portanto, as interações entre o ambiente escolar e o sexo não são suficientes para explicar as diferenças observadas para sobrepeso e pré-hipertensão/hipertensão no modelo ajustado e no modelo estratificado por sexo. No entanto, essa análise corrobora o fato de que o sexo pode influenciar a prevalência de sobrepeso e pré-hipertensão/hipertensão em adolescentes, independentemente da prática ou não de AT. Limitações e direções futuras Os resultados deste estudo precisam ser interpretados considerando algumas limitações. Primeiramente, devido ao delineamento transversal, não podemos estabelecer uma relação causal entre o meio escolar (isto é, adoção de políticas de AF) e o desenvolvimento de fatores de risco para DCV. Segundo, não medidos o nível de AF dos participantes para assegurar se eles cumpriam as recomendações das políticas implementadas pela escola – o que explica o fato por que escolhemos a escola, e não o nível de AF, como exposição. Terceiro, não foi feito nenhum ajuste quanto ao 779

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