ABC | Volume 112, Nº6, Junho 2019

Artigo Original Scheer et al Exercício na escola e fatores de risco cardiovascular Arq Bras Cardiol. 2019; 112(6):775-781 Introdução O número de mortes atribuídas ao sedentarismo pode atingir valores próximos a cinco milhões de pessoas no mundo. 1 Entre os adolescentes, a prevalência de um estilo de vida sedentário também é alta. O Estudo dos Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA) encontrou uma frequência de 54% de sedentarismo, o qual foi ainda mais prevalente entre as adolescentes do sexo feminino. 2 Omesmo estudo, ao considerar cerca de 37 mil indivíduos, relatou que níveis maiores de atividade física (AF) associaram de maneira independente com risco cardiovascular e com tempo de inatividade física. Um dado interessante foi que os níveis de AF parecem não mudar a associação entre índice de massa corporal (IMC) e risco cardiovascular. 3 Padrões de estilo de vida relacionados a hábitos alimentares e práticas de AF estabelecidos no meio escolar podem ter consequências potenciais na vida adulta. Existem evidências de que a aterosclerose se inicia em fases precoces da vida, evoluindo lenta e progressivamente até idades avançadas. 4 Scherr et al., 5 afirmaram que é importante considerar a presença de fatores de risco cardiovascular em escolares e que esses fatores podem estar relacionados com o estilo de vida. Considerando que os jovens passam a maior parte do seu tempo na escola, o papel dos programas escolares não pode ser subestimado. 6 Nesse sentido, as formas mais comuns de aumentar AF por meio da escola baseiam-se em aulas de educação física e atividades físicas extracurriculares. No entanto, essas atividades são geralmente pouco aplicadas. 7 Intervenções escolares para aumentar a prática de AF parece uma estratégia viável para reduzir fatores de risco. Knox et al., 8 relataram uma diminuição nos fatores de risco cardiovasculares em 115 alunos de 12 anos de idade após uma intervenção na escola durante 18 semanas. O projeto ACORDA também relatou uma redução na obesidade em adolescentes após aumentarem os níveis de AF com e sem orientação sobre a alimentação após uma abordagem durante um período de oito meses. 9 Em 2012, o governo da cidade do Rio de Janeiro iniciou um projeto que integrou treinamento acadêmico e esportivo, o Ginásio Experimental Olímpico (GEO). 10 O projeto deu ênfase à prática de esportes (duas horas por dia, cinco vezes por semana), e foram fornecidas cinco refeições saudáveis para os estudantes diariamente. Nas escolas regulares (ERs), por outro lado, a prática de AF é limitada (uma vez por semana), e os estudantes recebem somente uma refeição por dia. Nesse contexto, nosso objetivo foi avaliar possíveis associações entre o ambiente escolar nos GEOs versus ERs e importantes fatores de risco para doença cardiovascular (DCV) em adolescentes. Nossa hipótese foi a de que os adolescentes que frequentam as ERs estariammais propensos a apresentarem fatores de risco que aqueles frequentando escolas do projeto GEO. Métodos Este artigo foi escrito de acordo com os padrões estabelecidos no Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) para estudos transversais. 11 Delineamento do estudo Foi realizado um estudo transversal que incluiu um grupo de comparação em seis escolas públicas do Rio de Janeiro – três GEOs e três ERs. A coleta de dados foi realizada nas escolas entre 2013 e 2015. Os dados foram sempre coletados pelas manhãs, nomesmo dia da semana, por ummesmo pesquisador treinado. Para inferências de associação, consideramos o tipo da escola (ER ou GEO) como exposição, e importantes fatores de risco cardiovasculares como desfecho, tratados como variáveis categóricas. Um total de 1113 alunos foram incluídos em uma razão de alocação 2:1 para exposição (719 alunos frequentando GOEs) e não exposição (394 alunos frequentando ERs). Critérios de elegibilidade e seleção dos participantes Foram considerados elegíveis estudantes regularmente matriculados do sexto ao nono ano, que frequentaram a mesma escola por pelo menos um ano. Os alunos dos GEOs deveriam estar ativamente envolvidos em AFs com gasto energético > 5 equivalentes metabólicos (METs) cinco vezes por semana, seguindo a política do GEO. A participação nas atividades físicas era relatada pelos próprios estudantes ou seus pais. Na seleção dos pacientes para o grupo de comparação, tentou-se parear os estudantes o mais próximo possível para evitar potenciais fatores de confusão. Portanto, foi realizado um pareamento quanto à idade cronológica, sexo e ano escolar. Nas ERs, os estudantes praticavam AF por cerca de uma hora por semana. No momento da coleta de dados, havia quatro GEOs em funcionamento no Rio de Janeiro, mas somente três deles em funcionamento por um ano ou mais. Assim, todos os GEOs foram incluídos sem que houvesse um planejamento prévio do tamanho amostral. As ERs, selecionadas por conveniência, estavam localizadas na mesma região geográfica que os GEOs, para evitar discrepâncias, especialmente socioeconômicas. Tanto GEOs como ERs eram escolas públicas, frequentadas por estudantes de todas as regiões da cidade. Coleta de dados Foi obtido consentimento informado de todos os estudantes participantes bem como de seus pais ou responsáveis. A primeira visita na escola foi agendada, e os seguintes procedimentos foram realizados: coleta de amostra de sangue periférico, entrevista médica, exame físico, e medida da pressão arterial (PA). Uma equipe médica entrevistou todos os estudantes e seus pais ou responsáveis, utilizando um questionário estruturado desenvolvido especificamente para o estudo. No questionário, informações quanto ao sexo, idade, história clínica e dados atuais de saúde relevantes foram coletados. A equipe médica também avaliou adolescentes, incluindo avaliação antropométrica, medida da PA, e coleta de amostra sanguínea. As amostras de sangue capilar foram coletadas após jejumde doze horas para medidas dos níveis de glicose, colesterol total, e triglicerídeos (Roche AccuTrend Plus Kits®). Níveis alterados de glicose, colesterol total e triglicerídeos foram considerados como resultados acima de 99 mg/dL, 170 mg/dL e 130 mg/dL, respectivamente. A altura e o peso corporal foram medidos 776

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