ABC | Volume 112, Nº6, Junho 2019

Artigo Original Fernandes et al Estilo de vida e custos do uso de medicamentos Arq Bras Cardiol. 2019; 112(6):749-755 Introdução Nas últimas décadas, a ocorrência de obesidade e doenças crônicas aumentou dramaticamente nos adultos em todo o mundo. 1 Por outro lado, os avanços nas ciências médicas, o desenvolvimento de novas gerações de medicamentos/terapias, melhoraram significativamente a qualidade de vida e a longevidade. 2,3 Nos países em desenvolvimento, o uso de qualquer medicamento é relatado por 60% da população adulta, enquanto o uso de três ou mais medicamentos nas duas semanas anteriores é relatado por cerca de 18% da população. 4 Um padrão similar é observado na Europa Centro-Oriental, onde mais de 20% dos adultos (18 anos ou mais) relatam o uso de três ou mais medicamentos. 5 Narayan et al., 3 descobriram que em um período de nove anos (de 2005 a 2013), o uso de medicamentos para fins de prevenção (aspirina, clopidogrel, estatinas e bisfosfonatos) aumentaram significativamente entre os adultos da Nova Zelândia com 65 anos ou mais (cerca de 19,5%, 2,9%, 7% e 2,3%, respectivamente). O aumento dramático na prevalência da obesidade e suas associações com o desenvolvimento de doenças metabólicas e cardiovasculares explicariam, pelo menos em parte, essa tendência de aumento. 1,6 Na realidade, o amplo acesso a medicamentos pela população significa uma melhoria na prevenção/tratamento de doenças. 2 Entretanto, as potenciais reações adversas a medicamentos geradas pelo uso de medicamentos não prescritos constituem uma preocupação global de saúde pública, relacionada aos altos custos da saúde. 7,8 A carga econômica relacionado ao uso de medicamentos envolve não apenas os custos dos tratamentos de saúde resultantes do uso inadequado de medicamentos, mas também a compra de medicamentos prescritos e não prescritos (despesas públicas e pessoais). 7,9 Por exemplo, em um período de cinco anos, de 2000 a 2004, o Ministério da Saúde do Brasil gastou o equivalente a US$ 916 milhões em programas para fornecer medicamentos de alto custo à população. 10 Apesar do crescente gasto relacionado ao uso de medicamentos, pouco se sabe sobre seus determinantes subjacentes. Precisamos conhecer esses determinantes para identificar áreas-alvo para a formulação de políticas de gerenciamento dos orçamentos da saúde, particularmente em sistemas de saúde de locais em desenvolvimento. Comportamentos de estilo de vida não saudáveis (consumo de álcool, tabagismo, maus hábitos de sono e comportamentos sedentários [CS]) demonstraram ter um papel importante no desenvolvimento de muitas doenças, 11 mas a sua relação direta com os custos relacionados ao uso de medicamentos não está clara. Por exemplo, a ocorrência de distúrbios do sono é altamente prevalente em adultos, 12 mas sua carga econômica é desconhecida. 13 Um estudo longitudinal realizado com 11.698 empregados americanos identificou que, quanto pior o distúrbio do sono, os custos da assistência médica aumentavam em média US$ 725.15. 13 De maneira similar, em um estudo de 12 meses realizado em Taiwan, adultos com o diagnóstico positivo de apneia obstrutiva do sono apresentaram um custo 66% maior (em termos de diagnósticos, medicamentos, tratamentos, cirurgias, exames laboratoriais e diagnóstico por imagem) do que os adultos sem o mesmo diagnóstico (US$ 1,734.10 versus US$ 1,041.30, respectivamente). 14 Em contrapartida, uma melhora nos níveis de atividade física (AF) poderia reduzir os custos relacionados ao uso de medicamentos em adultos, 15,16 embora o seu papel na potencial relação entre comportamentos de vida pouco saudáveis e custos do uso de medicamentos ainda não foi tenha sido estudado até o momento. Neste estudo, examinamos a interrelação entre os custos do uso de medicamentos e os comportamentos de estilo de vida (saudáveis e não-saudáveis). Métodos Amostra Os dados são provenientes de um estudo de coorte realizado na cidade de Presidente Prudente, com índice de desenvolvimento humano 0,806, 17 situada no oeste de São Paulo (que é o estado da federação brasileira mais industrializado), no período de fevereiro/junho de 2014 (linha de base) a maio/dezembro de 2015 (seguimento). A estimativa do tamanho da amostra foi baseada em uma equação para o coeficiente de correlação. Devido à ausência de dados específicos sobre a relação entre comportamentos de estilo de vida e custos com a saúde no Brasil, 16,18 adotamos um coeficiente de correlação de 0,30 entre AF e custos com a saúde, 16,18 z = 1,96 e poder de 80% (adotando os parâmetros acima mencionados, o tamanho mínimo da amostra necessário para este estudo foi de 86 participantes). Os critérios de inclusão para os participantes foram: ter entre 40 e 65 anos de idade, sem diagnóstico de complicações cardiovasculares anteriores (por exemplo, acidente vascular cerebral, ataque cardíaco), sem complicações decorrentes da diabetes (amputação ou problemas visuais), sem uso regular de medicamentos e sem incapacidade física. O convite para participar do estudo foi feito através de anúncios (cartazes) na Universidade Estadual de São Paulo, em Presidente Prudente, e ginásios/academias em toda a cidade. Os participantes interessados entraram em contato com a equipe de pesquisa, que verificou o perfil dos participantes em relação aos critérios de inclusão (os participantes que preencheram todos os critérios de inclusão assinaram um termo de consentimento por escrito). Cento e noventa e oito adultos entraram em contato com a equipe de pesquisa e foram considerados elegíveis, sendo então submetidos a uma avaliação inicial. A análise deste estudo abrangeu 118 indivíduos (44 homens e 74 mulheres) avaliados tanto no linha de base como no seguimento (12 meses depois). Participantes foram excluídos devido a: (a) desistências (n = 62) e (b) disponibilidade de menos de sete dias para o uso de pedômetro no início do estudo (n = 18). Todos os procedimentos (questionários, pedômetros e avaliação da composição corporal) foram realizados por equipe treinada de pesquisadores (docentes, mestrandos e doutorandos) segundo os protocolos do Laboratório de Investigação em Exercício (LIVE), Brasil. 19 O comitê de ética da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP), campus de Presidente Prudente, aprovou o estudo. 750

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