ABC | Volume 112, Nº6, Junho 2019

Artigo Original Fonseca et al Desequilíbrio autonômico, sarcopenia e insuficiência cardíaca Arq Bras Cardiol. 2019; 112(6):739-746 Introdução Mudanças na composição corporal têm um papel importante na patogênese e na progressão da insuficiência cardíaca (IC) crônica. 1 A sarcopenia, caracterizada por uma redução na massa e na força muscular esquelética, afeta 19,5% dos pacientes ambulatoriais com IC, 2 e está associada com várias alterações tais como disfunção endotelial, redução na distância percorrida no teste de seis minutos de caminhada, e atenuação no pico de VO 2 . 2,3 Apesar de a sarcopenia ter sido frequentemente descrita em pacientes idosos, como consequência do processo de envelhecimento, ela também pode estar presente em pacientes mais jovens com IC. 4 A simpatoexcitação de repouso é ummarco da IC crônica. 5 Além disso, evidências mostram que essa desregulação autonômica está altamente associada commaior morbidade e mortalidade. 5 Em condições normais, o sistema nervoso exerce ação anabólica sobre o músculo esquelético via receptores adrenérgicos beta 2, 6 mas em modelo experimental da IC, a atividade exacerbada do sistema nervoso simpático contribui para a diminuição dessa ação, favorecendo a atrofia do músculo esquelético e a perda de peso. 7 A atividade parassimpática reduzida também tem sido relatada em pacientes com IC. 8,9 Binkley et al., 10 mostraram atividade parassimpática reduzida, avaliada pela variação da frequência cardíaca, em pacientes com IC. Além disso, a recuperação da frequência cardíaca (RFC), um importante mecanismo de desaceleração após um esforço máximo, também pode ser usada para avaliar a atividade parassimpática imediatamente após um teste de exercício máximo. 11 Ainda, a RFC consiste em um método fácil, de baixo custo para a avaliação clínica da reativação vagal, além de fornecer informação prognóstica adicional. 12-14 A atividade nervosa simpática muscular (ANSM) e a RFC, como medidas da atividade simpática e parassimpática, respectivamente, não foram estudadas em pacientes com IC sarcopênicos. Portanto, o objetivo do presente estudo foi avaliar o impacto da modulação autonômica avaliado pela ANSM (pela técnica de microneurografia) e RFC imediatamente após o teste máximo de exercício em pacientes com IC e sarcopenia. Métodos População do estudo Entre 01 de maio de 2016 e 31 de dezembro de 2017, 116 pacientes ambulatoriais com IC crônica estável foram recrutados prospectivamente. Os critérios de inclusão foram: (1) idade entre 18 e 65 anos; (2) diagnóstico de IC há pelo menos um ano; (3) fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) menor que 40%medida por ecocardiografia; (4) etiologia não isquêmica e isquêmica; (5) IC compensada recebendo tratamento otimizado há pelo menos três meses antes do estudo; e (6) New York Heart Association (NYHA) classe I a IV. Não foram incluídos pacientes com neuropatia diabética autonômica, insuficiência renal com hemodiálise, transplante cardíaco, marcapasso, distrofia muscular (i.e., distrofia muscular de Duchenne), paciente em qualquer tipo de tratamento hormonal, pacientes com história de câncer, infecção, e pacientes submetidos à intervenção coronária percutânea por infarto do miocárdio no período de até seis meses antes de entrarem no estudo. Atividade nervosa simpática muscular A ANSM foi diretamente registrada a partir do nervo peroneal pela técnica de microneurografia. 15,16 Registros da atividade nervosa simpática pós-ganglionar de músculo multiunitário foram realizados utilizando um microeletrodo de tungstênio posicionado no nervo peroneal próximo à extremidade fibular. Sinais nervosos foram amplificados por um fator de 50000 a 10000 e filtrado por um filtro passa-faixa (700 a 2000 Hz). Para registro e análise, a atividade nervosa foi retificada e integrada (constante de tempo = 0,1 segundo) para obter uma média de voltagem da atividade nervosa simpática. A ANSM foi expressa em frequência de chegada de impulsos ( bursts ) por minuto. Teste cardiopulmonar de exercício Todos os pacientes foram submetidos ao teste cardiopulmonar de exercício limitado por sintoma (Vmax Encore 29 System; VIASYS Healthcare Inc., Palm Springs, Califórnia, EUA) realizado utilizando um cicloergômetro (Ergometer 800S; SensorMedics, Yorba Linda, California, USA), protocolo de rampa e aumentos de carga de 5 a 10 Watts por minuto. O consumo de oxigênio (VO 2 ) e a produção de dióxido de carbono (VCO 2 ) forammedidos por troca gasosa a cada respiração e expressos emmédias (a cada 30 segundos). Incialmente, os pacientes foram monitorados por 2 minutos em repouso, sentados no cicloergômetro. Em seguida, foram orientados a pedalarem a 60-70 rpm, e o teste era concluído quando atingissem o estado de fadiga, mesmo recebendo incentivo verbal para continuarem. Todos os pacientes alcançaram uma razão de troca respiratória (RER, do inglês respiratory exchange ratio ) maior que 1,10. A frequência cardíaca (FC) foi monitorada continuamente durante a fase de recuperação, utilizando-se um eletrocardiograma digital de 12 derivações (CardioSoft 6,51 ECG/CAM-14, GE Medical Systems Information Technologies, Wisconsin, USA). 17 Após atingir a carga máxima, os pacientes continuaram a pedalar a 10 watts por 2 minutos, e em seguida permaneceram sentados por 4 minutos no cicloergômetro. Esse período de 6 minutos foi considerado como a fase de recuperação. O delta da RFC (∆RFC) foi calculado subtraindo-se os valores da FC no primeiro (∆RFC1) e no segundo (∆RFC2) minuto da fase de recuperação do pico de FC. 12 Composição corporal e força muscular As medidas de composição corporal – massa magra e massa gorda – foram avaliadas por Absorciometria Radiológica de Dupla Energia (DXA) (Lunar iDXA; GE Medical Systems Lunar, Madison, EUA). Em seguida, o índice de massa muscular esquelética (IMME) foi calculado como a soma da massa muscular apendicular de ambos os braços e ambas as pernas, dividido pela altura em metros quadrados. 18 A força muscular foi avaliada pela força da mão, usando um dinamômetro (Model J00105; Jamar Hydraulic Hand Dynamometer), após o ajuste da sua posição. A avaliação 740

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