ABC | Volume 112, Nº5, Maio 2019

Atualização Atualização das Diretrizes em Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia - 2019 Arq Bras Cardiol. 2019; 112(5):649-705 1.12.3. Estudo CREST Original e 10 Anos Depois O estudo Carotid Revascularization Endarterectomy vs. Stenting Trial (CREST) original (n = 2.502) visou observar de forma comparativa a redução do risco de AVE isquêmico em médio e longo prazos, proporcionada pela endarterectomia carotídea (EAC) e a angioplastia com stent em carótida (ASC) em pacientes com doença aterosclerótica carotídea significativa. A proporção de assintomáticos cerebrovasculares e dos que haviam sofrido AVE/AIT foi muito similar. O objetivo principal foi avaliar o risco de morte, IAM ou AVE até 30 dias após o procedimento, e de AVE ipsolateral nos quatro anos seguintes. Faltou, no entanto, um braço de tratamento clínico otimizado. O risco de AVE menor foi maior no grupo ASC aos 30 dias, ao passo que o de IAM foi mais elevado no braço EAC. Ao final de quatro anos, o risco de AVE foi baixo e similar em ambos os braços em análise (2,0% e 2,4%; p = 0,85). A principal conclusão foi que tanto a EAC como a ASC podem ser alternativamente indicadas para o tratamento intervencionista carotídeo. Achados adicionais sugeriram que a EAC parece beneficiar mais os idosos, ao passo que a ASC seria mais útil em subpopulações < 65 anos. 117 A maior lição do CREST 10 anos foi que, uma vez ultrapassada a fase crítica inicial, o paciente submetido a tratamento intervencionista tende a evoluir muito bem em longo prazo. O risco de AVE em 10 anos foi de 6,9% no braço ASC e de 5,6% no grupo EAC, sem diferença estatística significante (p = 0,96). O objetivo primário composto (morte, IAM e AVE) ocorreu em 11,8% dos participantes do grupo ASC e em 9,9% dos randomizados para EAC, sem diferença estatística (p = 0,51). Contudo, o objetivo composto morte/ AVE em 10 anos foi pior no grupo ASC (11,0% vs. 7,9%; razão de chances [RC]: 1,37%; p = 0,04). 118 O estudo ACT 1 (n = 1.453) incluiu pacientes com doença carotídea significativa assintomática randomizados para tratamento intervencionista por EAC (n = 364; 25%) ou ASC (n = 1.089; 75%). Foram excluídos os idosos >80 anos e os que haviam sofrido AVE/AIT nos últimos 180 dias. O padrão anatômico carotídeo teria que ser viável para ambos os procedimentos, e o grau mínimo de 70% de estenose seria diagnosticado por ultrassonografia ou angiografia. 119,120 O objetivo principal foi demonstrar a não inferioridade da ASC sobre a EAC em relação a um desfecho composto, representado por morte IAM e AVE nos primeiros 30 dias, e de AVC ipsolateral em um ano. Os resultados de 30 dias mostraram que a incidência desse desfecho foi de apenas 2,95%. Ocorreram mais casos de AVE e de morte ou AVE no braço ASC, e de IAM no subgrupo EAC. O risco de AVE maior foi baixo (0,4%) e a mortalidade foi de 0,2%. A sobrevida de médio e longo prazos livre de AVE foi excelente em ambos os braços, sendo de 97,5% em um ano e de 93,9% em cinco anos. Em cinco anos, 97,5% dos participantes não necessitaram de reintervenção em carótida, e a mortalidade total foi de 11,8%. 119 1.12.4. Cuidados e Recomendações O grande problema do tratamento intervencionista carotídeo está no risco de morte, IAM ou AVE inerente aos procedimentos per se, que se estende por 30 dias após a intervenção. Superada essa fase, o risco anual de AVE ou de necessidade de reintervenção é considerado baixo. A intervenção por EAC ou ASC em pacientes com doença carotídea assintomática não apresenta base sólida de indicação, em comparação com o tratamento clínico otimizado, e deve preferencialmente ser evitada neste momento, até que estudos em andamento possam ajudar a resolver de forma definitiva essa importante questão (CREST 2 e ACST2). 121-123 Mais de 90% das intervenções carotídeas nos EUA atualmente envolvem pacientes assintomáticos cerebrovasculares. Na Alemanha e Itália esses índices são de 60%, na Austrália e Canadá de 15%, e na Dinamarca de 0%. O risco anual de AVE em assintomáticos com doença carotídea significativa tratados apenas clinicamente tem alcançado um valor tão baixo quanto 0,5%, ou seja, os mesmos índices documentados nos estudos ACT1 e CREST em 5 e 10 anos, respectivamente. 122,123 Ao contrário do que têm admitido algumas diretrizes, sugere-se que o tratamento intervencionista carotídeo seja reservado para pacientes sintomáticos (AVE/AIT há < 6 meses) e, em assintomáticos, somente seja indicado quando o grau de estenose for de 70% a 99%, a despeito do tratamento clínico otimizado, e houver comprovação da existência de grande área cerebral sob risco, ou de microembolia relacionada à placa, por meio de exames de imagem e de avaliação de fluxo sanguíneo cerebral. 121-123 1.13. Avaliação de Risco Cirúrgico em Pacientes Idosos A população de idosos é a que mais cresce na atualidade e, por esta razão, tem sido observado um significativo aumento no número de procedimentos cirúrgicos neste grupo etário. Estima-se que o número de procedimentos cirúrgicos em pessoas acima de 65 anos seja 4 vezes maior do que na população mais jovem. 124 A prevalência de DCV, sintomática ou assintomática, cresce progressivamente com a idade, como é evidenciado nos resultados de muitos estudos a sugerir que idade ≥ 80 anos seja um preditor independente de complicações peroperatórias e morte em pacientes submetidos a cirurgia não cardíaca ou cardíaca. 125 No entanto, são poucos os estudos que incluem idosos acima de 70 anos e os resultados são, de modo geral, extrapolados de populações mais jovens para as mais velhas, ignorando as particularidades destas. 126 A avaliação clínica do idoso deve considerar os processos biológicos subjacentes ao envelhecimento dito normativo, como a redução fisiológica das múltiplas funções orgânicas que podem causar respostas inadequadas aos anestésicos, analgésicos e outras substâncias administradas, bem como propiciar o aparecimento de complicações cardiovasculares, acidentes hemorrágicos, neuropsiquiátricos, entre outros. A avaliação de comorbidades associadas e suas repercussões sobre a nutrição, funcionalidade geral, independência e expectativa de vida útil se faz obrigatória, bem como de todos os medicamentos em uso, tanto para a prevenção de possíveis complicações como para a escolha do procedimento mais adequado ao caso. 127 664

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