ABC | Volume 112, Nº5, Maio 2019

Atualização Atualização das Diretrizes em Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia - 2019 Arq Bras Cardiol. 2019; 112(5):649-705 Nos portadores de doença cardiovascular (DCV), a fragilidade confere um risco duas vezes maior de morte e este efeito persiste após ajuste para comorbidades e para a idade. Inúmeros estudos demonstraram também o aumento na prevalência de fragilidade entre os portadores de DCV, como doença arterial coronariana (DAC), insuficiência cardíaca (IC), doença valvar etc. Também foi identificado maior risco de complicações e mortalidade entre os idosos frágeis submetidos a intervenções cardiovasculares como cirurgias e angioplastias. 7 A fragilidade pode ser potencialmente prevenida ou tratada e diversos estudos demonstraram que intervenções como exercícios, suplementação proteico-calórica, suplementação de vitamina D e redução e otimização da polifarmácia podem diminuir o nível de fragilidade, minimizando-se, assim, os desfechos adversos e os riscos das intervenções. 5,8 A identificação de idosos frágeis é advogada para que se possa implementar as intervenções multidimensionais, principalmente a reabilitação física e nutricional, reduzindo ou adiando os desfechos adversos bem como para prognosticar riscos. Convém ressaltar que a identificação da fragilidade não deve ser vista como uma razão para se negar ou suspender tratamentos, mas como um meio para se programarem intervenções individualizadas e centradas no paciente. 5,7 Fried et al. (2001), em uma coorte de estudo longitudinal cardiovascular, identificaram as seguintes manifestações da síndrome: perda de peso não intencional, fraqueza muscular, exaustão (fadiga), redução da velocidade da marcha e diminuição do grau de atividade física. A partir delas, propuseram critérios diagnósticos conhecidos como o “Fenótipo da Fragilidade de Fried et al.”, 3 ou “Escala de Rastreio de Fragilidade do Cardiovascular Health Study”. 3,5 A crítica a esses critérios são que os referentes à exaustão e à redução da atividade física não são objetivos e são difíceis de serem avaliados na prática diária com idosos. Outros índices e escalas para diagnóstico foram propostos como o Índice de Fragilidade de Rockwood et al., 9 a Gerontopole Frailty Screening Tool, 10 a escala FRAIL proposta por Van Kan e Morley, 11 a Groningen Frailty Indicator, 12 a Tilburg Frailty Indicator, 13 o instrumento PRISMA-7, 14 a escala VES- 13 15 e a Escala de Fragilidade de Edmonton. 16 Os cinco últimos instrumentos tiveram adaptação transcultural e/ou validação no Brasil. Estudos têm demonstrado que o teste de velocidade de marcha de 5 metros é uma ferramenta útil na avaliação da fragilidade em idosos encaminhados para implante valvar aórtico percutâneo. 17,18 A incorporação desta ferramenta ao escore STS (Society of Thoracic Surgeons) melhorou a capacidade preditora de eventos adversos. Para um dado escore STS o risco de mortalidade ou morbidade foi 2 a 3 vezes maior em pacientes com velocidade de marcha lenta. 17,18 Independentemente do instrumento para rastreio e identificação utilizado, a síndrome de fragilidade deve ser pesquisada em todos idosos acima de 70 anos de idade e naqueles com DCV, mesmo que abaixo dessa faixa etária, e medidas para a sua prevenção e tratamento devem ser operacionalizadas. 5,7,8 1.3. Particularidades na Avaliação do Idoso O envelhecimento é FR para a maioria das DCV, assim como de inúmeras comorbidades, tornando os idosos o grupo etário de maior mais heterogeneidade e complexidade. 19 De forma geral, o sistema de saúde é mal preparado para assistir pacientes portadores de multimorbidades, visto que necessitam de uma individualização ainda maior e assistência por equipe multiprofissional trabalhando de forma integrada. 20,21 As intervenções claramente benéficas nos indivíduos adultos, de forma geral, também o são nos gerontes. Entretanto, as particularidades da avaliação do idoso são fundamentais para o tratamento desses indivíduos. A avaliação dos pacientes idosos deve ser realizada por intermédio da Avaliação Geriátrica Ampla (AGA). 22 Esse é um processo diagnóstico multidimensional, geralmente interdisciplinar, para determinar as deficiências, incapacidades e desvantagens do idoso e, então, planejar o seu cuidado e assistência a médio e longo prazos. A AGA prioriza o estado funcional e a qualidade de vida, utilizando instrumentos de avaliação, facilitando a comunicação entre os membros da equipe interdisciplinar. Deve ser aplicada aos idosos frágeis e portadores de multimorbidades. A AGA é também é um importante preditor de desfechos desfavoráveis, ou seja, tem valor prognóstico, para pacientes cirúrgicos, oncológicos e ortopédicos. 22 A AGA é fundamental no contexto da avaliação do idoso e contempla no mínimo quatro principais dimensões, que são a capacidade funcional, as condições médicas, o funcionamento social e a saúde mental. 22 Idosos independentes, com expectativa de vida ativa longa, devem ser tratados de forma abrangente, combinando prevenção e intervenção. Por outro lado, os pré-frágeis e frágeis necessitam de maior atenção às necessidades e prioridades individuais, assim como ao risco/benefício para decisão terapêutica individualizada. 19,20 As metas a serem alcançadas igualmente dependem do status funcional, não se podendo contraindicar um tratamento, qualquer que seja ele, exclusivamente por causa da idade. Considerando a alta prevalência de multimorbidades e a grande evolução nas opções terapêuticas, a polifarmácia torna- se muito frequente em idosos, trazendo desafios adicionais ao gerenciamento do caso. 19,20 Entender as vantagens e desvantagens de cada tratamento é fundamental para o tratamento adequado do idoso e só pode ser dimensionado por meio da AGA. Assim sendo, o conhecimento da AGA é fundamental para avaliação e introdução de um determinado tratamento no idoso. 21,22 1.4. Particularidades do Tratamento do Idoso No tratamento do idoso ganham prioridade o doente em relação à doença e o controle da doença em relação à cura. É essencial conhecer a doença, o doente e o tratamento. A doença cardiovascular é frequente e, mesmo quando tem poucas manifestações, eleva riscos; o doente idoso apresenta comorbidades e alta vulnerabilidade biopsicossocial; os tratamentos são mais suscetíveis a efeitos indesejados. Assim, a avaliação em múltiplos domínios, clínicos e psicossociais, é fundamental. Devido à frequente falta de evidências, as condutas devem ser individualizadas. As decisões devem ser compartilhadas e é necessário considerar a relação risco/ benefício e a expectativa de vida. No idoso, a indicação de tratamentos exige mais cautela, as metas terapêuticas são 656

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