ABC | Volume 112, Nº3, Março 2019

Atualização Atualização da Diretriz em Cardiologia do Esporte e do Exercício da Sociedade Brasileira de Cardiologia e da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e Esporte – 2019 Arq Bras Cardiol. 2019; 112(3):326-368 8.3. Aspectos Especiais da Prevenção de Morte Súbita Relacionada com o Exercício e o Esporte 8.3.1. Doping: Substâncias Ilícitas no Esporte Algumas substâncias utilizadas como doping são capazes de provocar repercussões deletérias, especialmente no aparelho cardiovascular, inclusive a MS. Dentre as substâncias mais usadas, destacam-se os esteroides anabolizantes, a efedrina e as anfetaminas. Dentre as drogas sociais, abordaremos o uso da cocaína, e da 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA), conhecida como ecstasy . 8.3.1.1. Esteroides Anabolizantes Estas substâncias provocam diversos efeitos colaterais, incluindo efeitos cardiovasculares indesejáveis. Os esteroides anabolizantes podem induzir hipertensão arterial secundária e nefrosclerose. A testosterona pode provocar aumento da resposta vascular à norepinefrina e, como consequência, promover retenção hídrica e elevação da resistência vascular periférica, levando ao aumento na PA. Outro efeito importante foi descrito por Tagarakis et al., 302 que demonstraram, pela primeira vez em nível microscópico, a adaptação de capilares cardíacos e miócitos com a utilização concomitante de esteroides anabolizantes e treinamento físico. Isso provocaria o aumento desproporcional da massa miocárdica em relação aos capilares cardíacos. Os resultados desse trabalho sugeriram que o uso de esteroides anabolizantes poderia desenvolver um desequilíbrio entre a oferta e o consumo de oxigênio, especialmente durante o exercício. Recentemente, foi mostrado que ratos tratados em longo prazo com decanoato de nandrolona (DECA) tiveram prejuízo na fisiologia cardíaca autonômica, com maior predisposição a risco cardiovascular e MS. Além disso, ao se interromper a administração da substância não houve retorno à normalidade imediatamente. 303 Em humanos, o uso de esteroides anabolizantes pode estar associado a um encurtamento do intervalo QT, impactando negativamente, portanto, na atividade elétrica cardíaca. 304 Ademais, o uso indiscriminado dos esteroides anabolizantes parece ser um fator de risco independente para morbidade e morte prematura. 305 8.3.1.2. Efedrina Em geral, estimulantes acarretam taquicardia e aumento do consumo miocárdico de oxigênio, podendo gerar arritmias e infarto agudo do miocárdio em indivíduos suscetíveis. A efedrina pode provocar taquicardias ventriculares sintomáticas, extrassístoles ventriculares frequentes, fibrilação atrial e MS. É importante salientar que muitos produtos ditos naturais e “derivados da flora” possuem substâncias como efedrina em sua fórmula, sem fazerem parte da bula. 8.3.1.3. Anfetaminas São o protótipo dos estimulantes do sistema nervoso central. Apresentam grande variedade de sais e misturas, sob diversas formas de apresentação, sendo a mais usada o sulfato de dextroanfetamina. Esta substância possui uma ação direta, por estimulação dos receptores adrenérgicos em níveis cortical e do sistema reticular ativador ascendente, e uma ação indireta, deslocando as catecolaminas endógenas de seus sítios nas terminações nervosas. Seus efeitos colaterais gerais mais pronunciados são insônia, tonturas, sudorese profusa, tremores e euforia; os efeitos cardiovasculares são palpitações, taquicardia e desconforto precordial; já a hemorragia cerebral constitui o efeito neurológico. 8.3.1.4. Cocaína O uso de cocaína acarreta vasoconstrição generalizada, tendo como principal consequência a hipertensão arterial. Apesar de o uso de cocaína causar vasoconstricção mais intensa no sistema nervoso central, esta pode repercutir também em outros órgãos, como os rins, com alterações glomerulares, tubulares, vasculares e intersticiais, provocando lesão renal. 306,307 O uso de cocaína pode provocar, ainda, infarto agudo do miocárdio, arritmias cardíacas, cardiomiopatia congestiva, miocardite, hemorragia subaracnóidea, ruptura de aorta, rabdomiólise, hipertensão arterial, isquemia miocárdica espontânea ou induzida pelo exercício e MS cardíaca. 8.3.1.5. Ecstasy É um alucinógeno similar à anfetamina. Em função de seu baixo custo e sua grande disponibilidade em comprimidos, sua popularidade e consumo têm aumentado de forma importante. A ingestão de MDMA aumenta a liberação de serotonina, dopamina e norepinefrina pelos neurônios pré-sinápticos. Além disso, previne o metabolismo desses neurotransmissores, por meio da inibição da monoaminoxidase. Seus principais efeitos cardiovasculares são hipertensão arterial, taquicardia e arritmias, podendo levar à MS. 308-310 8.4. Avaliação do Atleta, Organização e Planejamento do Atendimento A MS, relacionada com o exercício e o esporte, é um evento dramático, e algumas medidas podem − e devem − ser tomadas pelos médicos no sentido de tentar prevenir esta rara, mas temível complicação da prática de esportes/exercício. 8.4.1. Aspectos Relacionados ao Atleta 8.4.1.1. Avaliação Pré-Participação Considerando-se que, na maioria dos casos, a MS relacionada com o esporte é provocada por cardiopatias conhecidas ou não diagnosticadas, todo candidato à prática de atividade física deve se submeter ao exame clínico prévio, independentemente da faixa etária. Esse exame clínico deve ser precedido de uma boa anamnese, com particular atenção para a história familiar de doença cardiovascular e MS. A APP, na tentativa de se detectarem essas patologias, é a forma mais eficiente para se prevenir um evento cardiovascular fatal. 311 Em 2009, o Comitê Olímpico Internacional (COI) publicou um documento sobre a importância da avaliação médica periódica em atletas de elite. 312,313 359

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=