ABC | Volume 112, Nº3, Março 2019

Atualização Atualização da Diretriz em Cardiologia do Esporte e do Exercício da Sociedade Brasileira de Cardiologia e da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e Esporte – 2019 Arq Bras Cardiol. 2019; 112(3):326-368 de mutações já descritas, sendo essa a canalopatia cardíaca mais prevalente. 173 A mutação mais comum ocorre no gene KCNQ1 , responsável por mais de 30% das variantes genéticas e mutações patológicas identificadas na SQTL, causando a SQTL1. 173 Esse tipo de mutação causa uma perda da função da corrente de potássio IKs,166 que tem papel importante na repolarização celular e na adaptação do intervalo QT à FC. A SQTL5, mutação causada pelo gene KCNE1, é muito menos frequente (considerada rara) e também é responsável por perda de função de IKs. 166 Os genes KCNH2 ( HERG ), que codifica a subunidade alfa dos canais rápidos de potássio, e KCNE2 , que codifica a subunidade beta, são responsáveis pela entrada rápida de potássio durante a fase 3 do potencial de ação. 174 A perda da função da subunidade alfa representa 40% das SQTL genotipadas e é responsável pela SQTL2. 175 A SQTL3 representa aproximadamente 10% de todas as mutações diagnosticadas na SQTL, ocorre por alterações no gene SCN5A, cujo ganho de função produz uma entrada contínua de sódio durante a fase de platô, facilitando despolarizações precoces da célula cardíaca. Centenas de outras mutações têm sido descritas. Entretanto, as aplicações clínicas de se identificarem essas mutações para tratamento e acompanhamento dos pacientes e familiares de SQTL são restritas às formas mais conhecidas. 176 5.2.2. Estratificação de Risco na Síndrome do QT Longo A análise genética tem sido muito utilizada na estratificação do risco e em intervenções terapêuticas específicas em pacientes com intervalo QT prolongado, assim como em seus familiares. A recomendação de estratégias de estratificação de risco e tratamento, por serem condições clínicas pouco frequentes e os dados sobre a doença obtidos mediante estudos de coorte, limita o nível de evidência para B. O marcador de risco mais robusto identificado é um episódio prévio de MS abortada, sendo sua causa mais comum episódios de taquicardia ventricular polimórfica, degenerando ou não para fibrilação ventricular. Pacientes que experimentaram tal condição têm risco 13 vezes maior de novos episódios de MS. Síncope prévia também é um marcador de risco extremamente desfavorável, podendo duplicar o risco. 177 Aliás, é sabido que o risco de se ter um evento arrítmico não é igual para todos os pacientes. Evidências mostram que aqueles com SQTL2 e SQTL3 têm risco aumentado de eventos em relação aos portadores de mutações que causam a SQTL1. Além disso, indivíduos que apresentam QTc com duração > 500 ms apresentam maior risco do que os com QTc de menor duração. 172 Mutações que envolvem um segmento do gene que codifica o poro do canal também estão relacionadas com pior prognóstico. Portanto, mais uma vez, fica claro o valor da genotipagem em pacientes com essa síndrome. A presença de MS na família não se mostrou marcador de maior risco de eventos. 178 5.2.3. Recomendações em Atletas com Síndrome do QT Longo Há alguns anos, pacientes com SQTL eram aconselhados a não participar de esportes competitivos, por se entender que eles estavam expostos a maior risco de MS cardíaca. Em 2015, Aziz et al. 179 estudaram mais de 100 pacientes portadores da SQTL com genótipo positivo, todos engajados em algum programa esportivo. Desses, 25% praticavam esportes competitivos. Curiosamente, os autores não encontraram sintomas relacionados à doença durante a prática esportiva, confirmando que nenhum evento ou morte cardíaca havia sido descrito naqueles em tratamento adequado. 179 Essas e outras evidências serviram como base para revisão das recomendações que restringiam universalmente a prática de esporte competitivo entre pacientes com SQTL, sugerindo que poderia haver um caráter muito conservador das diretrizes até então. Dessa forma, forampublicadas as novas recomendações de AHA/ACC para elegibilidade e desqualificação de atletas com canalopatias. 180 Naqueles esportistas portadores de SQTL, a participação em esportes competitivos passou a ser considerada, por não haver evidências de que atletas assintomáticos com SQTL genótipo positivo/fenótipo negativo possam ter risco aumentado de arritmias malignas durante a prática esportiva. No entanto, o atleta deve estar assintomático e em tratamento por 3 meses. Mais ainda, que sejam adotadas medidas de precaução como a presença de desfibrilador externo automático (DEA) (Tabela 10). Por fim, é importante frisar que esportes aquáticos estão contraindicados para atletas portadores de SQTL1. Grau de recomendação: IIb. Nível de evidência: C. Nesse particular, Ackerman et al. 180 publicaram uma carta descrevendo que atletas de natação com diagnóstico de SQTL1 e em tratamento com betabloqueador, os quais optaram por continuar a prática de exercício competitivo, foram seguidos por um período de tempo, muitos deles com cardioversor- desfibrilador  implantável (CDI). A incidência de eventos foi baixa, tendo ocorrido somente dois eventos no mesmo indivíduo, dentre 74 pacientes com diagnóstico de SQTL1. Salienta-se que esse indivíduo já possuía história de MS abortada e não vinha em uso de betabloqueador. Os betabloqueadores são a base no manejo da SQTL, sendo indicados para todos os indivíduos sintomáticos ou naqueles assintomáticos com intervalo QTc maior ou igual a 470 ms. Sendo assim, todos os pacientes com intervalo QT prolongado devem receber betabloqueadores, embora a proteção seja incompleta para portadores de SQTL2 e 3 (Classe de recomendação I). Para pacientes portadores de Tabela 10 – Medidas de precaução nos pacientes com canalopatias Evitar substâncias que prolonguem o intervalo QT (www.crediblemeds.org ) Evitar substâncias que exacerbem a síndrome de Brugada (www.brugadadrugs.org ) Hidratação e reposição de eletrólitos, evitar desidratação (trigger) Evitar hipertermia, seja por febre ou calor excessivo em atletas com QT longo e síndrome de Brugada Aquisição de desfibrilador externo automático (DEA) pessoal como parte do equipamento do atleta Estabelecimento de plano de ação de emergência 347

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