ABC | Volume 112, Nº3, Março 2019

Atualização Atualização da Diretriz em Cardiologia do Esporte e do Exercício da Sociedade Brasileira de Cardiologia e da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e Esporte – 2019 Arq Bras Cardiol. 2019; 112(3):326-368 Na avaliação do indivíduo genótipo positivo/fenótipo negativo também deve-se ter em mente o papel da atividade esportiva intensa no desenvolvimento precoce de miocardiopatias, até mesmo piorando o prognóstico em indivíduos carreadores de mutação, como pode ocorrer na DAVD e na MCH. 87,88 As recomendações atuais são controversas, baseadas em consensos de especialistas, sendo que poucos estudos longitudinais estão disponíveis. A Tabela 7 mostra, de maneira geral, as diferenças entre o que é recomendado nos Estados Unidos versus o que os europeus recomendam. Por exemplo, a AHA em conjunto com o ACC colocam que pacientes com genótipo positivo para MCH podem participar de esportes competitivos, desde que assintomáticos, sem evidência de HVE por ecocardiografia bidimensional e com ausência de um histórico familiar de MS relacionada à MCH ( Classe de recomendação IIa; nível de evidência C) . Já aqueles atletas que apresentam expressão clínica confirmada e diagnóstico de MCH não devem participar da maioria dos esportes competitivos. 89 É nossa opinião que estudos futuros devam ser realizados para avaliar o potencial patogênico e os efeitos negativos do exercício intenso no indivíduo com genótipo positivo. Por fim, acreditamos que a desqualificação deva ser a última intervenção desejada e que a informação adequada e o compartilhamento de decisões (família, atleta, treinador, empresário, entre outros) devem ser almejados. 4. Portadores de Miocardiopatias e Miocardite 4.1. Miocardiopatia Hipertrófica A MCH figura dentre as principais causas de MS relacionada com o exercício e o esporte em indivíduos com menos de 35 anos de idade. 90,91 O Registro Nacional de Morte Súbita em Atletas, realizado nos Estados Unidos, avaliou as causas de MS em atletas competitivos, entre os anos de 1980 e 2011. Em um total de 2.406 mortes identificadas em jovens com idade média de 19 anos, 842 atletas tiveram algum diagnóstico cardiovascular. A MCH foi a causa mais comum de MS, ocorrendo em 36% desses atletas. 92 Contudo, de alguma maneira, sua contribuição para causas de MS em atletas vem sendo sistematicamente superestimada. Evidências recentes de metanálise 92 apontam a MCH como causa de 10,3% dos óbitos em atletas, enquanto 27,5% possuíam coração estruturalmente normal. Trata-se de uma doença de base genética, autossômica dominante, que se caracteriza por um desarranjo miofibrilar dos miócitos, acompanhado de hipercontratilidade, hipertrofia assimétrica com ou sem obstrução da via de saída, alterações estas não explicadas por sobrecarga de pressão ou de volume ou por outra condição sistêmica subjacente. Hipertrofia do ventrículo maior que 15 mm em algum segmento verificado por método de imagem sem outra causa aparente é muito sugestiva de MCH. 93 Na zona entre 13 e 14 mm, outros fatores como história familiar, alterações eletrocardiográficas específicas, sintomas, combinação de outro método de imagem e até mesmo avaliação genética devem ser considerados no diagnóstico diferencial. 94 Em parentes de primeiro grau de um paciente com MCH, a presença de hipertrofia maior que 13 mm também é altamente indicativa do diagnóstico desta enfermidade. 91 A hipertrofia relacionada à sobrecarga pressórica, ao treinamento físico e a hipertrofia basal do septo em idosos devem ser consideradas no diagnóstico diferencial. Os portadores deMCHpodemser totalmente assintomáticos ou apresentar sintomas como lipotimia, síncope, dispneia, palpitações e angina, especialmente relacionados com o aumento da demanda miocárdica ou obstrução da via de saída, como ocorre no exercício. A MS nesses pacientes ocorre principalmente por arritmias ventriculares, mas outras complicações, como arritmias supraventriculares (com ou sem pré-excitação), bloqueios atrioventriculares avançados, assistolia e infarto do miocárdio também podem ser causa deste evento indesejado. 4.1.1. Genética e Miocardiopatia Hipertrófica Até o momento são conhecidos ao menos 20 genes implicados na gênese dessa doença, 95 com mais de 1.700 mutações genéticas relacionadas com as proteínas contráteis do miocárdio. Mutações em pelo menos 11 genes diferentes que codificam proteínas sarcoméricas foram identificadas Tabela 7 – Recomendações das diferentes entidades Cardiopatia American Heart Association/American College of Cardiology European Society of Cardiology Miocardiopatias (MCH, MCD, DAVD) Sem restrição (p. ex., assintomáticos e sem hipertrofia do ventrículo esquerdo) Proibido esporte competitivo. Permitidos apenas esportes não competitivos e de lazer QT longo Sem restrição (exceto QTL1 e natação) Proibido esporte competitivo. Permitidos apenas esportes não competitivos e de lazer Taquicardia catecolaminérgica Proibido esporte competitivo Proibido esporte competitivo Síndrome de Brugada Sem restrição Sem restrição Síndrome de Marfan Somente exercício leve a moderado (sem história familiar de dissecção aórtica ou morte súbita) Proibido esporte competitivo DAVD: displasia arritmogênica do ventrículo direito; MCD: miocardiopatia dilatada; MCH: miocardiopatia hipertrófica. 339

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