ABC | Volume 112, Nº3, Março 2019

Artigo de Revisão Jorge et al Imagem na disfunção ventricular por quimioterapia Arq Bras Cardiol. 2019; 112(3):309-316 intersticial. Desta forma, a RMC consegue estabelecer o diagnóstico diferencial entre a fibrose reacional, infiltrativa e a cicatricial. 52 É possível avaliar a CTX em nível tecidual com as técnicas de realce precoce e tardio. 52 O grande problema é que, na grande maioria dos casos de doença subclínica, não existe fibrose visualmente detectável para ser quantificada e esta técnica é negativa. O mapa T1 foi validado para detecção de fibrose intersticial não detectada pelas técnicas do realce tardio e os resultados são informados mediante a quantificação do tempo de relaxamento miocárdico em milissegundos. 53 No pós-contraste, quanto mais baixo o T1 do miocárdio, maior o grau de fibrose intersticial. Já no pré-contraste, quanto maior o T1 do miocárdio, maior o grau de fibrose intersticial. O mapa T1 se mostrou um preditor independente de CTX em pacientes que realizaram tratamento com ANT e foram acompanhados por um período de três anos. 54 A fração do volume extracelular que demarca a expansão do espaço intersticial corrigido pelo hematócrito também foi um forte biomarcardor pela imagem. 54 O mapa T2 fica responsável pela quantificação do edema do cardiomiócito e auxilia na caracterização de um dano agudo, subagudo ou crônico. 55 Os resultados do mapa T2 também são representados pelo tempo em milissegundos. Estudo com nove pacientes que receberam ANT mostrou que valores médios de T2 > 59 ms foram associados à CTX. 56 A caracterização do tecido miocárdico pela RMC pode detectar injúria miocárdica precoce durante a QT e identificar alterações miocárdicas subclínicas nos sobreviventes de CA, porémestudos prospectivos são necessários para a confirmação desta hipótese. A relação de custo-efetividade em usar RMC frente a outras técnicas de acompanhamento sequencial de pacientes sob QT ainda necessita ser quantificada. A tomografia computadorizada cardíaca (angio-TC de coronárias) A angio-TC de coronárias é um método de aplicabilidade clínica crescente que utiliza baixas doses de radiação (1–2 mSv) e de contraste iodado (50 mL). 57 Além de suas indicações clássicas, é possível a quantificação dos volumes e da fração de ejeção dos ventrículos. 58 Após o estudo de Nacif et al., 59 o uso da angio-TC para a quantificação de fibrose intersticial miocárdica pela técnica de quantificação do VEC pode ser de grande utilidade clínica. Valores do VEC maiores do que 35% estão associados com fibrose intersticial. Estratégia de abordagem racional para a detecção precoce da cardiotoxicidade NaFigura1,propomosumfluxogramadeabordagemracional aos pacientes submetidos à QT. Tal algoritmo é baseado na revisão da literatura e expertise dos autores. Carece, portanto, de validação em ensaios clínicos randomizados e controlados. A abordagem deve ser adaptada à realidade das condições de oferta e demanda de cada serviço. 8 Frente a um paciente com CA sugere-se adotar os seguintes passos: (a) Ações integradas, partilhadas por cardiologistas e oncologistas, dentro de equipe multidisciplinar; (b) Avaliação clínica com estimativa do risco cardiovascular global, doenças prévias, tratamento quimio- ou radioterápicos prévios e intervenção específica quando indicada previamente à QT; (c) Dentro das limitações institucionais, considerar o ecocardiograma bidimensional com medida do strain; (d) Caso não seja exequível uma avaliação cardíaca basal em todos, priorizar aqueles com alto risco para CTX, tais como aqueles com doença prévia ou fatores de risco cardiovascular; disfunção sistólica do VE; idade maior que 65 anos; programação de altas doses de ANT (DOXO), maior que 350 mg/m²; ou combinação de QT (figura 1). Nos pacientes sob acompanhamento, quando detectado uma FEVE < 53%, GLS VE abaixo do limite inferior da normalidade, e/ou troponinas elevadas, na ausência de sintomas, o cardiologista deve ser consultado, discutindo com o oncologista a relação risco-benéfico da QT, entretanto sua continuação ou não é uma decisão do oncologista. Os fluxogramas de atendimento dependem do potencial cardiotóxico do esquema quimioterápico. Segundo documento das sociedades norte-americana e europeia de ecocardiografia, pacientes com doses cumulativas menores que 240mg/m² deDOXOdeveriamrepetir a avaliação cardíaca após o término do esquema terapêutico e seis meses depois. 8 Os pacientes com doses maiores que 240 mg/m² deveriam passar por nova avaliação antes de cada ciclo adicional de 50 mg/m². Os pacientes sob uso de TZU, idealmente, deveriam ter um ecocardiograma a cada três meses. 8 Por indisponibilidade de dados, em pacientes com terapia por inibidores do fator de crescimento do endotélio vascular, sugere-se uma avaliação ecocardiográfica um mês depois da dose inicial e depois a cada três meses. 8 Detecção subclínica da disfunção ventricular esquerda Até o presente momento, não há evidências para o tratamento de pacientes assintomáticos com FEVE preservada e alteração exclusiva no strain . No entanto, o racional de se aferir o strain se fundamenta na possibilidade de monitorar amiúde os pacientes sob risco e, tão logo detectada a queda da FEVE, iniciar-se a terapêutica e obter-se o remodelamento reverso. Para fins de detecção de disfunção subclínica, o GLS VE basal é o marcador para comparação com as medidas após QT. Uma redução relativa maior que 15% pode confirmar a disfunção. Este valor alterado deveria ser confirmado em um novo exame em duas a três semanas. A elevação da TnI com ou sem alteração do GLS VE também é considerada um marcador de lesão miocárdica, porém há múltiplas causas de elevação da TnI, assim como dúvidas quanto ao seu valor prognóstico de disfunção ventricular. Sempre que se cogite a necessidade de suspensão da QT em assintomáticos, faz-se necessário a medida da FEVE por outro método mais acurado como a VRN ou a RMC. 8 Nãohá estudos comnível de evidência segura demonstrando o benefício do tratamento farmacológico “cardioprotetor” nos pacientes sob QT. Na hipótese de continuação da QT a despeito de alterações na função do VE, é necessária reavaliação ecocardiográfica antes de novo ciclo, ciente de antemão que o risco de CTX irá aumentar progressivamente. 313

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