ABC | Volume 112, Nº2, Fevereiro 2019

Correlação Anatomoclínica Favaratto & Aiello Insuficiência cardíaca no pós-operatório de correção cirúrgica de dissecção aórtica Arq Bras Cardiol. 2019; 112(2):204-210 Um tubo corrugado substituía a parte da aorta ascendente e estava suturado logo acima da junção sinutubular aórtica (Figura 6). Ao redor da área de junção entre aorta ascendente e a massa ventricular, notamos cavitação de limites irregulares preenchida parcialmente por material liquefeito, de coloração castanho‑amarelada (Figura 5). Havia ainda lesão deprimida circular da íntima aórtica, com 1,5cm de diâmetro, logo abaixo da emergência das artérias renais. Os pulmões mostravam áreas vinhosas de condensação do parênquima, de formato triangular aos cortes. Havia sinais de congestão visceral generalizada, além de ascite (700 ml) e derrame pleural bilateral (200 ml em cada hemitórax). O exame histológico demonstrou acúmulo de material mucóide na túnica média em toda a aorta, além de ruptura focal de fibras elásticas na lesão deprimida descrita na aorta abdominal (Figura 7). O estudo anatomopatológico da lesão cavitada peri-aórtica revelou inflamação mista, com restos celulares necróticos e polimorfonuclares neutrófilos, emmeio a fios de sutura e outros materiais sintéticos (Figura 8). A pesquisa de bactérias e de fungos foi negativa neste local. A valva aórtica mostrava espessamento fibroso de sua borda. Havia congestão passiva crônica visceral, com necrose centrolobular hepática; as lesões vinhosas pulmonares correspondiam a infartos recentes. (Dra. Vera Demarchi Aiello) Diagnósticos anatomopatológicos – Estado pós-correção cirúrgica de dissecção aguda da aorta ascendente – Lesão cavitada peri-aórtica com reação inflamatória mista, sem identificação de agentes infecciosos – Dissecção intramural localizada em aorta abdominal – Insuficiência valvar aórtica – Infartos pulmonares recentes Figura 5 – Valva aórtica vista por sua face arterial. Nota-se espessamento da borda livre dos folhetos semilunares (setas) e falta de coaptação central. Ao redor da aorta há lesão cavitada multiloculada (asteriscos), de onde saiu material pastoso. Causa mortis : Insuficiência cárdica congestiva com choque terminal (Dra. Vera Demarchi Aiello) Comentários A dissecção aórtica é uma doença grave, que costuma estar associada à hipertensão arterial sistêmica e tem como achado morfológico a delaminação da parede do vaso, com orifício intimal dito “de entrada” localizado em geral na aorta ascendente, e criação de uma falsa luz. Esta pode estender-se até a túnica adventícia e chegar à ruptura, com sangramento maciço para uma cavidade (pericárdica, pleural ou abdominal). Quando a dissecção não se rompe, em geral existe um orifício chamado de “re-entrada”, localizado mais distalmente na luz aórtica, em geral na aorta descendente. Histologicamente nota-se a presença de acúmulos de glicosaminoglicanos na túnica média, por vezes sob forma dos chamados “lagos mucóides”, 10 além da rarefação e fragmentação de fibras elásticas e diminuição de colágeno no terço externo da parede aórtica, levando à fraqueza desta parte da parede. Além da ruptura, são complicações a isquemia de múltiplos órgãos pelo roubo de fluxo na falsa luz e a insuficiência da valva aórtica, por desabamento de sua inserção quando o orifício de dissecção está nas proximidades. No caso em questão, a dissecção se limitava à aorta ascendente, que foi substituída por tubo sintético. Apesar de existir referência a valvoplastia aórtica na cirurgia, o paciente evoluiu com insuficiência cardíaca congestiva, provavelmente em conseqüência da insuficiência valvar remanescente, esta não detectada ao ecocardiograma possivelmente por alterações hemodinâmicas (paciente em choque). Este quadro foi o responsável pela má evolução pós-operatória tardia. 208

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=