ABC | Volume 112, Nº2, Fevereiro 2019

Comunicação Breve Análise do Metabolismo do Ferro na Cardiomiopatia Chagásica Crônica Analysis of Iron Metabolism in Chronic Chagasic Cardiomyopathy Carla Paixão Miranda, 1 Fernando Antônio Botoni, 1 Maria do Carmo Pereira Nunes, 2 Manoel Otávio da Costa Rocha 1 Universidade Federal de Minas Gerais, 1 Belo Horizonte, MG – Brasil Hospital das Clínicas - Universidade Federal de Minas Gerais, 2 Belo Horizonte, MG – Brasil Palavras-chave Distúrbio do Metabolismo do Ferro; Insuficiência Cardíaca; Doença de Chagas; Cardiomiopatia Chagásica; Inflamação, Anemia. Correspondência: Carla Paixão Miranda • Avenida Alfredo Balena, 190, 4° Andar Sala 4070. CEP 30130-100, Santa Efigênia, Belo Horizonte, MG – Brasil E-mail: carlanutribio@gmail.com Artigo recebido em 20/03/2018, revisado em 13/08/2018, aceito em 05/09/2018 DOI: 10.5935/abc.20190006 Resumo A alteração do metabolismo do ferro na insuficiência cardíaca (IC) tem sido descrita como um importante marcador prognóstico. Verificar se osmarcadores da cinética do ferro guardamrelação com a morbidade e a etiologia da cardiomiopatia chagásica. Pacientes com cardiomiopatia chagásica crônica (CCC, n = 40), com a forma indeterminada (IND, n = 40), além de cardiomiopatia não chagásica (NCh, n = 40). A idade média foi de 50,98 ± 5,88 no CCC, 50% eram do sexo masculino, 49,68 ± 5,28 no IND, 52,2% eram do sexo masculino e 49,20 ±10,09 no NCh, 12,5% eram do sexo masculino. Observaram-se níveis de ferro (FeSe) menores no grupos CCC (93,15 ± 36,53), quando comparados ao IND (125,30 ± 22,79) e NCh (114,77 ± 18,90) (p = 0,0004), índice de saturação de transferrina (IST) menor no CCC (29,48 ± 6,59), quando comparado ao IND (30,95 ± 7,06) e no grupo NCh (39,70±7,54) (p=0,0001), capacidade total de ligação do ferro CTLF menor no grupo CCC (297,30 ± 36,46), quando comparado ao grupo IND (196,52 ± 56,95) e ao grupo NCh (275,18 ± 33,48) (p = 0,0001), ferritina menor no grupo CCC (134,55, 1,56-42,36), quando comparada ao grupo IND (156,25, 1,72 – 42,20) e ao grupo NCh (112,95, 2,88-42,66) (p = 0.0004). Verificou-se também que o FeSe (IC% 95% 1,00‑1,04; p = 0,0014), o IST (IC 95% 1,02-1,22) (p = 0,0012) e o sexo (IC 95% 1,07-14,43 p = 0,0038) associaram-se independentemente ao grau de disfunção ventricular na cardiomiopatia chagásica. Os pacientes com CCC demonstraram maior alteração no metabolismo do ferro em relação a forma indeterminada e outras formas de miocardiopatias. Introdução A deficiência funcional do ferro (Fe) pode ser definida como o desbalanço entre a quantidade necessária de Fe para a síntese de hemoglobina e o seu suprimento. 1 Ela ocorre na ausência de estoque de Fe, característica da anemia ferropênica (AF), e na presença de bloqueio da homeostasia do Fe, como na anemia da inflamação. Na AI, citocinas e células do sistema retículo‑endotelial induzem alterações que interferem em diferentes vias da eritropoese levando à anemia. 2 Acredita-se que citocinas pró- e anti-inflamatórias, derivadas de macrófagos ou de células T, além de proteínas de fase aguda, estão envolvidas nos distúrbios da homeostase do Fe da AI. A demonstração da importância da IL-1 e do TNF- α na homeostase do Fe ocorreu a partir de experimentos com ratos, onde a administração destas citocinas era associada a hipoferremia e indução da síntese de ferritina pelo SRW. Hoje se sabe que a IL-1 e a IL-6 são capazes de modular a tradução de ferritina atuando na porção 5 ´ não traduzida do RNA mensageiro da ferritina. 3,4 A IL-6 parece ter papel fundamental no estímulo da transcrição do HAMP, embora a IL-1 α e IL-1 β também tenham ação na transcrição deste gene. A IL-6 tem a capacidade de se ligar à membrana celular através de receptores específicos e ativar o transdutor de sinal e ativador da transcrição 3 ( Stat3 ), da via de sinalização JAK/STAT, que atua na região promotora do gene estimulando a transcrição de hepcidina. Produção excessiva de hepcidina ocorre em indivíduos com doenças inflamatórias e infecciosas, em particular a doença de chagas, e é esse excesso que explica o sequestro de Fe nos macrófagos e a inibição da absorção intestinal de Fe, duas marcas características da AI. 5 A expressão de ferroportina está diminuída nas células do SRE devido a inflamação; não se deve somente à internalização e degradação da ferroportina pela ação da hepcidina, mas também por uma regulação negativa da sua expressão. Alterações na diferenciação e proliferação dos precursores eritroides (BFU-E e CFU-E): observa-se um bloqueio devido ao efeito inibitório de diversas citocinas, em especial: interferon- α , β e γ , fator de necrose tumoral- α TNF- α e interleucina 1 (IL-1). O mecanismo relacionado parece ser a indução de apoptose; entretanto, as citocinas também exercem um efeito tóxico direto nas células progenitoras por induzirem a formação de radicais livres. 6 A cardiomiopatia chagásica crônica (CCC) é a manifestação mais grave da doença de chagas (dCh), na qual se observa intensa e extensa ação inflamatória e fibrótica sobre omiocárdio, 1 provocando alterações estruturais e autonômicas que afetam cerca de 20% a 30% dos infectados. 7,8,9 Além disso, a CCC apresenta, como substrato morfológico fundamental, uma miocardite crônica progressiva e fibrosante e, consequentemente, clínica, variando desde formas silenciosas até formas mais graves, como a insuficiência cardíaca (IC) refratária, arritmias complexas, aneurismas ventriculares e morte súbita. 10 189

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