ABC | Volume 112, Nº2, Fevereiro 2019

Artigo Original Vizentin et al Prevalência de dislipidemia em adolescentes Arq Bras Cardiol. 2019; 112(2):147-151 Introdução A adolescência é um período de intensas modificações que ocorre entre a infância e a vida adulta, destacado por um expresso desenvolvimento, crescimento e mudanças corporais. Durante a adolescência há o aumento fisiológico dos tecidos, incluindo o tecido adiposo, especialmente em meninas, sendo um período crítico para dar início ou exacerbar a obesidade. 1-3 No cenário atual, observamos baixo consumo de frutas e hortaliças acompanhado por alto consumo de alimentos industrializados 3,4 e associado ao uso excessivo de aparelhos eletrônicos e baixa frequência de prática regular de atividade física entre os adolescentes. Observa-se também que a omissão de refeições e o consumo de fast-foods também são hábitos comuns nessa faixa etária. Tais condições favorecem o ganho de peso e fatores de risco para doenças crônicas. 2-6 Dados do IBGE mostram um evidente crescimento da prevalência de excesso de peso e obesidade em adolescentes nos últimos 34 anos no Brasil, decorridos de 1974-1975 a 2008-2009, de 3,7% para 21,7% em meninos e de 7,6% para 19,4% em meninas. 7 Esta situação é preocupante, uma vez que a obesidade é um fator de risco considerável para doenças crônicas não transmissíveis, destacando dentre as dislipidemias, acentuando-se ainda mais quando associado ao sedentarismo. 8 A exposição precoce à obesidade favorece maior risco cardiovascular não apenas na infância e adolescência, mas também de elevada incidência de mortalidade prematura em adultos que apresentaram obesidade nestas fases. 9,10 Considera-se que excesso de peso na infância e adolescência seja um preditor mais poderoso desses riscos do que o excesso de peso na idade adulta. 9-11 A dislipidemia é entendida como alterações no perfil lipídico, que podem ocorrer por elevação de colesterol total (CT), LDL-colesterol (LDL-c), triglicerídeos (TG) ou diminuição do HDL-colesterol (HDL-c) sendo essas decorrentes de causas primárias (fatores genéticos) ou secundárias (fatores ambientais). 8,12-14 Essas alterações por si só e principalmente acompanhadas de outros fatores de risco podem levar ao desenvolvimento da aterosclerose. 13 O presente estudo teve como objetivo estabelecer a prevalência de dislipidemia e avaliar sua associação com o estado nutricional dos adolescentes atendidos no ambulatório de atenção secundária do Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente (NESA) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE). Métodos Trata-se de um estudo transversal observacional cuja amostra foi de conveniência, compreendendo adolescentes com idade entre 12 e 18 anos, de ambos os sexos, encaminhados internamente ou via SISREG para o serviço de Nutrição com diagnóstico de excesso de peso, dislipidemia, alterações no metabolismo glicídico ou outra comorbidade, sendo atendidos no ambulatório do NESA. Foram excluídos os adolescentes com diagnóstico de magreza segundo índice de massa corporal (IMC)/Idade, em uso de medicamentos que possam interferir nos exames laboratoriais (estatinas, corticoides, sequestrantes de ácido biliar), ou que fazem acompanhamento por síndromes genéticas, síndrome nefrótica, hipercolesterolemia familiar, doenças reumatológicas, Diabetes Melittus tipo 1, hipotireoidismo, transtorno alimentar, doenças disabsortivas. Foram coletados dados demográficos como idade, sexo, cor da pele e antropométricos como peso, estatura e circunferência da cintura (CC). O peso (Kg) foi aferido através de uma balança digital eletrônica da marca Micheliti®, com precisão de 0,1 Kg e máximo de 200 Kg, com o adolescente descalço, com roupas leves e em posição ortostática. 15 Para estatura (cm) foi utilizado um estadiômetro fixado à parede da marca Sanny®, com precisão de 0,1 cm, com adolescente descalço e com o corpo em posição anatômica e cabeça paralela ao solo de acordo com o plano de Frankfurt. 15 Tais medidas foram utilizadas para a avaliação do estado nutricional do adolescente por meio do IMC para idade em escores-z, sendo adotada como referência a proposta da Organização Mundial da Saúde para crianças e adolescentes de 5 a 19 anos. 16 As medidas de CC foram realizadas com o uso de fita inelástica antropométrica com escala de 0,1 centímetros, no ponto médio entre o último arco costal e a crista ilíaca ao final de uma expiração normal. Foram classificados conforme a proposta de Fernández et al., 17 sendo a CC elevada ≥ ao percentil 75. A avaliação do perfil lipídico constou com os seguintes exames laboratoriais: CT, TG, HDL-c e LDL-c. Para obtenção dos dados de perfil glicídico e lipídico, o exame de sangue foi sempre realizado com jejum prévio de 12 horas. A dosagem de TG, CT e HDL-c foram realizadas pelo método colorimétrico enzimático e o LDL-c calculado pela fórmula de Friedewald. 18 Os valores de referência utilizados foram os recomendados pela I Diretriz de prevenção da aterosclerose na infância e na adolescência. 8 Análise estatística As análises foram realizadas utilizando-se o software STATA 14. As variáveis contínuas foram apresentadas como média e desvio padrão e as categóricas como frequência absoluta. A distribuição das variáveis foi avaliada através do teste Kolgomorov-Sminorv . As comparações entre as variáveis contínuas com distribuição normal foram realizadas com o teste t de Student não pareado e para mais de dois grupos independentes, utilizou-se a análise de variância (ANOVA) One Way e teste Post Hoc . Para as comparações de variáveis categóricas foi utilizado o teste qui-quadrado ou o exato de Fisher . Para o estudo da associação foram realizadas análises de correlação ( Pearson ou Spearman ) e regressão linear simples e múltipla. Em todas as análises foi considerado um nível de significância de 5%. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HUPE/UERJ, registro CEP/HUPE: 3051/2011; CAAE: 0193.0.228.000-11. Resultados Foram avaliados 239 adolescentes com média de idade 14,4 ± 1,8 anos, sendo 104 meninos (43,5%) e 135 meninas (56,5%). A Tabela 1 descreve as características antropométricas e a média do perfil lipídico da população avaliada de acordo com o gênero. As meninas apresentaram valores médios estatisticamente maiores de IMC e HDL-c, já a média da altura foi maior nos meninos. 148

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