ABC | Volume 112, Nº2, Fevereiro 2019

Relato de Caso Grande Fístula Bilateral da Artéria Coronária: 10 anos de Seguimento em Tratamento Clínico Large Bilateral Coronary Artery Fistula: 10-year follow-up in Clinical Treatment Rodrigo Melo Kulchetscki, 1 Luka David Lechinewski, 2 Luciana Oliveira Cascaes Dourado, 1 Whady Armindo Hueb, 1 Luiz Antonio Machado César 1 Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), 1 São Paulo, SP – Brasil Hospital da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, 2 Curitiba, PR – Brasil Correspondência: Rodrigo M. Kulchetscki • Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 44 andar AB, Unidade Clínica de Coronariopatia Crônica. CEP 05403-000, São Paulo, SP – Brasil E-mail: r.kulchetscki@hc.fm.usp.br , r.kulchetscki@gmail.com Artigo recebido em 19/03/2018, revisado em 02/07/2018, aceito em 02/07/2018 Palavras-chave Fístula Arterio-Arterial/diagnóstico; Angiografia Coronária; Diagnóstico por Imagem; Cintilografia; Anomalias dos Vasos Coronários; Insuficiência da Valva Mitral; Isquemia Miocárdica. DOI: 10.5935/abc.20180267 Relatamos a evolução de 10 anos de uma paciente assintomática, com grande fístula bilateral da artéria coronária- artéria pulmonar em que foi optado por tratamento clínico. Publicado anteriormente, 1 o relato reforça a necessidade de individualização do tratamento em pacientes portadores de fístulas coronárias moderadas. Relato de Caso Paciente do sexo feminino, 59 anos, com diagnóstico de grande fístula bilateral coronário-pulmonar em 2007, assintomática, sendo investigada após achado de sopro cardíaco em exame de rotina. Na ocasião, foi optado por tratamento conservador. À ausculta cardíaca apresentava sopro sistodiastólico mais audível em borda esternal esquerda alta, com componente mais audível na sístole. Não havia outros achados no exame físico cardiológico ou mesmo no exame segmentar geral. A paciente não apresentava comorbidades na ocasião, exceto história de tabagismo prévio (10 anos-maço). Na evolução, em acompanhamento ambulatorial anual, apresentou diagnósticos de dislipidemia, intolerância à glicose e depressão. Na última consulta, em 2017, a paciente se mostrava assintomática. Fazia uso de atenolol 25 mg/dia, metformina 850 mg/dia, atorvastatina 20 mg/dia e sertralina 50 mg/dia. Os exames realizados após 10 anos de seguimento foram comparados com os do momento do diagnóstico. O ecocardiograma atual revelou coronária direita (CD) com 4 mm de diâmetro na origem e 7 mm no terço médio; o tronco da coronária esquerda (TCE) com 8 mm. Notou-se trajeto fistuloso com fluxo tortuoso comunicando ambas as coronárias com o tronco pulmonar, e sem a presença de hiperfluxo pulmonar. Além disso, observou-se a evolução da insuficiência mitral, agora, de grau importante. A Tabela 1 demonstra os parâmetros ecocardiográficos durante o acompanhamento. A cintilografia miocárdica com dipiridamol e 99mTecnécio sestamibi não mostrou alterações de perfusão, assim como exames prévios realizados em 2007 e 2011. O teste ergoespirométrico em esteira rolante (Balke modificado 3,4 mph), com duração de 7 minutos e 38 segundos, foi máximo (109% da FC máxima), com VO 2 pico atingido de 22,4 mL/kg/min (87% VO 2 predito). A angiotomografia das artérias coronárias foi realizada em 2017 e a comparação com o exame de 2007 pode ser visualizada na Figura 1. Persiste o achado de fístula sistemicopulmonar, da CD+ DA com o tronco da artéria pulmonar, descrito como presença de ramo calibroso emergindo da origem da coronária direita, de trajeto tortuoso, contornando anteriormente o tronco pulmonar e comunicando com o terço proximal da descendente anterior. Apresenta ponto de comunicação com o tronco pulmonar, associado a dois aneurismas no seu trajeto, medindo 19 x 16 mm e 14 x 13 mm. Não há dilatação pulmonar ou outros sinais sugerindo repercussão hemodinâmica. Escore total de cálcio coronariano de 246 (Agatston), percentil 99 para a faixa etária e sexo, e ausência de redução luminal coronariana significativa. Discussão As fístulas coronárias (FC), comunicações anormais entre uma ou mais artérias coronárias com alguma estrutura cardíaca ou torácica, geralmente congênitas, 2 apresentam prevalência de 0,05%a0,88%, dependendodométododediagnósticoutilizado. 3 Originam-se de um ou mais ramos das artérias coronárias, e o troncopulmonar é a terminaçãomais frequentedas FCbilaterais. 2,4 Podem se associar a regurgitação mitral/doença da valva mitral – achado presente neste caso – defeitos de septo atrial e/ou septo ventricular, estenose e atresia pulmonares. 5 Na população adulta, 75% são sintomáticos, sendo dor torácica e dispneia as queixas mais frequentes. Sopro cardíaco é observado em 37% dos pacientes ao exame clínico. 5 A evolução parece ser bastante variável, e depende do tamanho e repercussão hemodinâmica da FC, além de malformações associadas. Seguimentos de longo prazo 2,4 demonstram que os pacientes podem evoluir desde assintomáticos até a apresentação de sintomas de insuficiência cardíaca por queda da fração de ejeção, aumento do átrio esquerdo e hipertensão pulmonar, e poucos, com aneurisma coronário, que está associado principalmente às fístulas unilaterais. Os aneurismas coronários podem favorecer a rotura coronária, além de poderem gerar isquemia pelo mecanismo de roubo de fluxo. 5,6 211

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