ABC | Volume 111, Nº6, Dezembro 2018

Artigo Original Odozynski et al Anatomia das VP e ablação de FA Arq Bras Cardiol. 2018; 111(6):824-830 Introdução O gatilho da atividade elétrica responsável por desencadear a fibrilação atrial paroxística (FAP) está frequentemente localizado nas veias pulmonares (VP), de modo que o isolamento elétrico das VPs é o pilar terapêutico no tratamento invasivo desta arritmia. 1-3 Na maioria dos pacientes, quatro VP chegam ao átrio esquerdo. No entanto, estudos prévios sugerem que variações anatômicas das VPs estão relacionadas a maior incidência de FA. 4,5 O tronco comum esquerdo (fusão das 2 VPs esquerdas em um tronco comum [TrCE]) é a mais comum das variações anatômicas das VPs, ocorrendo entre 4 e 18% dos pacientes submetidos a ablação por cateter. 6 Entretanto, não está claro se a presença dessas variações anatômicas altera o desfecho e taxas de recorrência no tratamento invasivo da FAP. Como o TrCE pode ser facilmente identificado pela tomografia computadorizada (TC), conhecer o desfecho clínico da ablação nessa população pode ser relevante na tomada de decisão clínica na indicação do procedimento ablativo. O objetivo deste estudo foi, portanto, comparar as características clínicas e desfechos de pacientes submetidos à ablação de FAP com e sem tronco comum esquerdo das VPs . Métodos Desenho do estudo e participantes Estudo caso-controle, unicêntrico, realizado entre janeiro de 2011 e dezembro de 2015, sendo incluídos pacientes (≥ 18 anos) submetidos ao primeiro procedimento de ablação por cateter para tratamento de FAP refratária a drogas antiarrítmicas com tempo de seguimento mínimo de 12 meses. As informações foram coletadas e indexadas em banco de dados digital voltado para ablação de FA (SysCardio® software). Juntamente com a TC, a presença do TrCE foi confirmada por meio de modelo atrial 3D construído durante o procedimento com sistema de mapeamento eletroanatômico por (NavX®). Foram excluídos da amostra pacientes com FA persistente ou persistente de longa duração, pacientes com ablações prévias e com FA de etiologia reversível, cardiomiopatia hipertrófica, doença cardíaca reumática, doença cardíaca congênita e ablação por cateter prévia (Figura 1). Procedimentos e protocolo de ablação Todos os procedimentos foram realizados sob anestesia geral, intubação orotraqueal e monitoramento invasivo da pressão arterial por punção radial ou femoral esquerda aos cuidados de anestesiologista. As punções transeptais foram realizadas com auxílio de eco intracardíaco, o qual foi mantido durante todo o procedimento. Todos os pacientes foram submetidos ao isolamento circunferencial das VPs por meio de ablação por cateter irrigado componta de 3 . 5mmsemaferiçãoda força de contato, utilizando energia de radiofrequência comaplicações de até 35watts e 43°C por 30-45 segundos e demonstração de bloqueio elétrico de entrada e saída das VPs em relação ao átrio esquerdo ao final do isolamento. Após a demonstração de bloqueio de entrada e saída, os pacientes receberam 18 mg de adenosina IV em bolus. Nos casos emque houve reconexão elétrica, novas aplicações de radiofrequência foram realizadas guiadas por mapa de ativação até que a reconexão mediada pela infusão de adenosina não mais ocorresse. As aplicações na parede posterior do átrio esquerdo foram realizadas com 20 watts por até 15 segundos e interrompidas no caso de elevação da temperatura esofágica >38°C. Aplicações na parede posterior do átrio esquerdo foram monitoradas por meio de termômetro esofágico com sensores múltiplos recobertos (Circa ® ) e interrompidas sempre que houvesse alteração na temperatura esofágica acima de 38°C. Durante todos os procedimentos, realizados com sistema de mapeamento eletro-anatômico baseado em impedância torácica (EnSite Navx – Abbott ® ), foi realizado bolus de heparina IV de 100mg/kg seguido de infusão contínua para manter um tempo de coagulação ativado entre 350 e 450s . Definições das variantes anatômicas das veias pulmonares A anatomia venosa foi definida como normal quando visualizadas duas VP direitas e duas VP esquerdas distintas enquanto a presença de tronco comum esquerdo foi definida quando as duas VP esquerdas coalesciam por um trajeto > 10 mm desde antes da inserção no átrio esquerdo em um óstio comum (Figura 2). Seguimento clínico Após o procedimento , os pacientes permaneceram em uso de drogas antiarrítmicas (propafenona, sotalol ou amiodarona dependendo da preferência do médico assistente) por 1 mês e de anticoagulante por um período mínimo de 3 meses independentemente do CHA 2 DS 2 - VASc. Realizado acompanhamento clínico 1, 3, 6 e 12 meses após o procedimento com realização de ECG e no mínimo duas monitorizações eletrocardiográficas contínuas (Holter) de 5 dias ao longo de todo o seguimento clínico. Na 10 a semana após a ablação, os pacientes foram encorajados a realizar um Holter de 5 dias. Qualquer arritmia atrial maior que 30 segundos de duração documentada após 1 mês de blanking period indicou recorrência da arritmia . 2 A severidade dos sintomas antes da ablação e durante as eventuais recorrências foi caracterizada pelo escore CCS-SAF ( Canadian Cardiovascular Society Severity of Atrial Fibrillation ) e pelo EHRA ( European Heart Rhythm Association score of atrial fibrillation related symptoms ) . 7 Análise estatística As características dos pacientes e os procedimentos , as taxas de recorrência após um único procedimento e as taxas de complicações foram comparadas de acordo com os grupos: TrCE (caso) ou não-TrCE (controle). O tamanho amostral foi determinado por proporção 1:4 para casos e controles com poder de estudo igual a 80%. Variáveis contínuas foram descritas como média e desvio padrão e comparadas utilizando-se teste-T de Student não pareado (bicaudal) , respeitando-se os critérios de normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk. Variáveis categóricas foram descritas por número absoluto e porcentagens em relação à amostra total, sendo comparadas utilizando-se o teste de χ 2 ou Exato de Fischer. O nível de significância estatística 825

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