ABC | Volume 111, Nº6, Dezembro 2018

Artigo Original Silva et al Características cardíacas e vasculares em atletas Arq Bras Cardiol. 2018; 111(6):772-781 Introdução O treinamento físico induz adaptações cardiovasculares secundárias a alterações na pressão arterial, assim como outras alterações hemodinâmicas emetabólicas em resposta ao esforço físico. Tais mudanças adaptivas podem induzir o ventrículo esquerdo (VE) a hipertrofia a longo prazo. 1 Alguns autores defendem que mudanças fisiológicas e anatômicas limítrofes ocorrem como parte de um processo adaptivo de treinamento de alto-desempenho e tem motivado o debate quando a suas implicações. 2 Eles defendem que a sobrecarga de volume geralmente aumenta a capacidade de bombeamento do VE, produzindo hipertrofia excêntrica enquanto, em contraste, a sobrecarga de pressão reduz o tamanho da cavidade ventricular, produzindo hipertrofia concêntrica. Sobretudo, a resistência vascular periférica (RVP) é um fator importante da sobrecarga cardíaca, ao modular especificamente a pós-carga do VE. Além disso, o endotélio é fundamental para a vasodilatação por produzir óxido nítrico (NO), que é vasodilatador e tem um efeito direto sobre a RVP. Assim, é importante destacar que após o exercício há um estímulo na produção de NO e fosforilação de eNOS, que contribui diretamente para a redução de RVP. 3,4 Exercícios aeróbicos aumentam o estresse de cisalhamento, o que conduz a uma liberação aumentada e síntese de NO e vasodilatação aumentada. 5 A sobrecarga de pressão do VE é reduzida ao longo do tempo. 6 Entretanto, treinamentos de resistência de alta intensidade como levantamento de peso e powerlifting envolvemumnúmero de contrações de velocidade muito baixa que produzem compressão mecânica transitória de vasos de resistência, aumentando a RVP e a sobrecarga de pressão do VE durante o exercício. 7 Foi postulado que aumento crônico na pós-carga induz a adição paralela de novos sarcômeros no miocárdio, conduzindo à hipertrofia ventricular concêntrica. 8 Ainda assim, este modo de hipertrofia ventricular não foi demonstrado em atletas de treinamento de força, 9 sendo, assim, uma descoberta inconsistente. Dado o corpo de prova limitado que oferece suporte a essas adaptações cardiovasculares, bem como àquelas relativas à função endotelial e à RVP em atletas de força, o objetivo deste estudo foi o de comparar as mudanças cardíacas estruturais e funcionais em powerlifters e corredores de longa distância. Em segundo lugar, comparamos a vasodilatação dependente do endotélio e a RVP nesses atletas. Nossa hipótese é a de que atletas empenhados em treinamento de força de alta-intensidade por longos períodos de tempo apresentam mudanças na estrutura cardíaca associada a uma redução na função cardíaca, quando comparados a corredores de longa distância. Além disso, exposição de longo prazo a treinamento de força de alta-intensidade pode levar a redução da função endotelial causada por sobrecarga de pressão. Métodos Seleção de participantes e grupos no estudo A amostra conveniente para o estudo compreendeu 40 indivíduos, do sexo masculino, com idades entre 18 e 40 anos de idade. Selecionamos atletas de powerlifting (grupo dos powerlifters [PG], n = 16) e de corrida de longa-distância (acima de 10 km) (grupo dos corredores [RG], n = 24). Os atletas eram elegíveis se estivessem competindo por, pelo menos, 3 anos. Indivíduos com qualquer problema médico nos 6 meses precedentes; os que não competiram nos 6 meses precedentes; os que utilizaram substâncias ilícitas (doping) nos 12 meses anteriores; ou os que se recusaram a assinar um termo de consentimento foram excluídos. A amostra do estudo foi recrutada através de um convite aberto feito em locais de treino (academias e centros esportivos) e selecionada após a aplicação do critério de inclusão. Os participantes foram avaliados conforme a seguir: na primeira visita, foram submetidos a avaliação de pressão arterial, avaliação de ecocardiograma, dilatação mediada por fluxo da artéria braquial, avaliações de resistência vascular periférica. Além disso, responderam a um questionário abrangente com perguntas sobre o treinamento, incluindo tempo de experiência com treinamento; linha do tempo de desempenho; quaisquer prêmios; rotina atual de treinamento (volume, intensidade e duração das sessões de treino semanais, frequência de participação em competições, tempos de repouso, etc.) entre outras. No dia seguinte, foram submetidos a um teste de carga máxima; e, na última visita (48 horas depois), foram submetidos a um teste de consumo máximo de oxigênio. Todas as avaliações foram realizadas dentro do mesmo período de tempo (entre 8 e 11 da manhã). Avaliação de pressão arterial As medições de pressão arterial foram feitas utilizando um monitor semi-automático de pressão cardíaca (OMROM 705CP), com o participante sentado com ambos os pés no chão, após um repouso de 10 minutos o manguito foi colocado e ajustado à circunferência do braço. Em uma sala absolutamente sossegada, as medições de pressão arterial foram realizadas em duplicata, e o valor mais alto dentre essas leituras foi utilizado no estudo. Exame ecocardiográfico Os exames ecocardiográficos transtorácicos foram realizados por um especialista em ecocardiografia (G.B.G.). Foi utilizado um aparelho de ultrassom (EnVisor CHD, Philips, Bothell, WA, USA) equipado com uma sonda transdutora de setor (2–4 MHz) para obter imagens longitudinais, transversais, bi-dimensionais de 2 e 4 câmaras e de módulo M. Técnicas de onda contínua, onda pulsada e Doppler em cores foram usadas para examinar tecidos e paredes ventriculares. Todas as imagens foram armazenadas e enviadas a um segundo especialista em ecocardiografia (D.P.K.) para uma avaliação cega das imagens. A área da superfície corporal (BSA) foi calculada usando o método Du Bois. 10 Dilatação mediada por fluxo da artéria braquial e resistência vascular periférica Utilizamos um aparelho de ultrassom Doppler bi‑dimensional de alta-resolução (EnVisor CHD, Philips, Bothell, WA, USA) equipado com sonda transdutora vascular linear de alta frequência (7-12 MHz) e software de monitoramento e imagem ecocardiográfica. Foram feitas medições mediadas por fluxo (DFM) com os participantes em posição supina, e um manguito de pressão de ajuste 773

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