ABC | Volume 111, Nº5, Novembro 2018

Artigo Original Lima et al Treinamento intervalado de alta intensidade e insuficiência cardíaca Arq Bras Cardiol. 2018; 111(5):699-707 Introdução A insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP) é uma síndrome clínica complexa e prevalente. Caracteriza-se por limitação acentuada ao exercício, sendo que e o tratamento farmacológico ainda não demonstrou melhora na taxa de mortalidade nesse cenário. 1,2 As abordagens terapêuticas são limitadas e se baseiam principalmente no controle dos sintomas e no manejo dos fatores de risco cardiovascular, como pressão arterial (PA) elevada. 3-5 A hipertensão está associada ao aumento do estresse oxidativo e da inflamação vascular, intimamente relacionados à disfunção endotelial. 6,7 Por outro lado, a função endotelial atenuada em indivíduos com ICFEP contribui para a intolerância ao exercício 8-10 e é um preditor independente de eventos cardiovasculares adversos. 11,12 Como uma intervenção não farmacológica, o treinamento físico aparece como uma estratégia potencial a ser incluída no arsenal terapêutico da ICFEP. 13,14 O treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) surgiu como uma modalidade de exercício com impacto positivo em alguns resultados cardiovasculares, sendo pelo menos tão eficaz quanto o treinamento contínuo de intensidade moderada em pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida. 15-17 Meta-análises recentes demonstraram que o HIIT, em longo prazo, é superior na promoção da melhora da função endotelial e na redução da PA em indivíduos com fatores de risco cardiovascular. 18,19 Em estudos anteriores, após uma única sessão de HIIT, os pacientes com doença arterial coronariana e hipertensão apresentaram aumento do diâmetro da artéria braquial, 20,21 melhoraram a função endotelial 20 e reduziram a PA. 21-23 Sabe-se que pacientes com ICFEP têm a reserva vasodilatadora atenuada durante o exercício, assim como comprometida resposta no acoplamento ventrículo‑arterial. 9,10,24 Entretanto, o efeito de uma única sessão do HIIT sobre a função endotelial e sobre a PA nesses pacientes ainda é desconhecido. Considerando esta lacuna na literatura, o objetivo do presente estudo foi avaliar o diâmetro da artéria braquial, a função endotelial e a PA 30 minutos após uma única sessão do HIIT em pacientes com ICFEP. Métodos Pacientes e desenho do estudo Este estudo do tipo antes e depois (quase experimental) foi realizado entre junho de 2014 e novembro de 2015. Dezenove pacientes com ICFEP, de acordo com os critérios da Sociedade Europeia de Cardiologia, 25 foram recrutados sequencialmente em um ambulatório de cardiologia de um hospital terciário no sul Brasil. Os critérios de elegibilidade foram a presença de sinais e sintomas de insuficiência cardíaca, fração de ejeção preservada (> 50%), disfunção diastólica (índice de volume diastólico final do ventrículo esquerdo < 97 mL/m 2 ) com aumento da pressão de enchimento (E/e' > 8) e, no caso de E/e' < 15, pelo menos outro critério de diagnóstico para ICFEP, de acordo com o documento acima mencionado. Idade entre 40 e 75 anos, classe funcional I a III da New York Heart Association (NYHA), e estabilidade clínica sob terapia medicamentosa ótima nos últimos 3 meses também foram considerados critérios de elegibilidade. Pacientes com doença pulmonar grave, doença valvar e arterial periférica de moderada a grave foram excluídos. Da mesma forma, neuropatia autonômica, angina instável, história de arritmias complexas induzidas por estresse, pacientes com dispositivos eletrônicos cardíacos implantáveis, e aqueles com condições musculoesqueléticas e/ou cognitivas limitantes foram excluídos. Primeiramente, os pacientes foram submetidos à ecocardiografia Doppler commapeamento de fluxo em cores para confirmação dos critérios de diagnóstico de ICFEP. Em seguida, um teste cardiopulmonar do exercício foi realizado para avaliar os limiares ventilatórios e consumo de oxigênio de pico, bem como a resposta da frequência cardíaca ao exercício. Até 14 dias após o teste cardiopulmonar do exercício o diâmetro da artéria braquial, a dilatação fluxo‑mediada (DFM) e a dilatação independente do endotélio foram avaliados imediatamente antes e 30 minutos após uma sessão de HIIT. Na mesma sessão experimental, a PA e a frequência cardíaca foram medidas em dois momentos diferentes, antes e após o exercício, conforme descrito abaixo. Medições e instrumentos Características dos pacientes Os dados demográficos e clínicos foram coletados no primeiro dia através de um questionário, e verificados nos prontuários de cada paciente. Dados antropométricos foram coletados no momento da conclusão do questionário. Ecocardiograma transtorácico Todos os exames ecocardiográficos foram realizados utilizando equipamento Envisor CHD ou HD 11 (Philips, EUA) com um transdutor setorial multifrequêncial padrão, por um cardiologista treinado. As imagens foram adquiridas segundo um protocolo padronizado, seguindo as recomendações correntes nas diretrizes atuais. 25,26 As imagens em formato cine-loop e as imagens estáticas de 3 batimentos consecutivos foram registradas em vistas padrão 2D, M-mode, vistas ecocardiográficas com Doppler e com Doppler tecidual. A fração de ejeção do ventrículo esquerdo foi calculada pela fórmula de Teichholz, a partir da vista paraesternal do eixo longo. Para pacientes com anormalidades regionais de movimento da parede, a regra de Simpson foi utilizada para calcular a fração de ejeção. O volume do átrio esquerdo foi medido na sístole ventricular, imediatamente antes da abertura da válvula mitral, e calculado a partir das incidências apicais de 4 e 2 câmaras usando o método biplano dos discos. A função diastólica do ventrículo esquerdo foi avaliada com Doppler pulsátil transmitral (pico de velocidade E, pico de velocidade A relação E/A e tempo de desaceleração) e velocidade do Doppler tecidual do anel mitral (velocidade diastólica precoce - e', velocidade diastólica final - a'). 700

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